Este é o caso de uma criança hispânica de 12 anos de idade, sexo masculino, com história de “nódulos” que apresentavam ulceração na face e nos membros inferiores e superiores, e que deixavam múltiplas cicatrizes, havia seis anos. O paciente foi atendido em decorrência de edema facial há 20 dias, associado à diminuição da acuidade visual. O oftalmologista relatou necrose do olho esquerdo. Ao exame físico, o menino apresentava edema periorbital, erupções papulovesiculares na região frontal esquerda, que deixavam cicatrizes varioliformes (fig. 1). Foi realizada biópsia de pele, que evidenciou necrose epidérmica, infiltrados linfoides perivasculares e perianexiais atípicos com angiocentricidade.
A análise imuno‐histoquímica evidenciou linfócitos T citotóxicos (CD3+, CD8+, perforina+, CD56−) com ki67 de 20% e hibridização in situ positiva para o vírus Epstein‐Barr (EBER, do inglês Epstein‐Barr Encoded Early RNAs) (figs. 2 e 3). Foi realizada biópsia da conjuntiva, com evidência de tecido necrótico, e o teste de reação em cadeia da polimerase (PCR) foi positivo para vírus Epstein‐Barr (EBV). A carga viral de EBV no sangue foi positiva (197.929 cópias/mL). Considerando todos esses dados, foi realizado um diagnóstico de DLP‐HV. As tomografias computadorizadas mostraram adenopatia cervical e hepatoesplenomegalia. A biópsia do nódulo cervical e da medula óssea foi negativa para malignidade. O tratamento adequado com talidomida oral 100mg/dia foi iniciado, alcançando resposta clínica.
Casos de DLP‐HV nas Américas foram descritos em crianças do México, Peru e Bolívia.1,2 De acordo com alguns estudos, o DNA viral está elevado na maioria dos pacientes, sugerindo uma infecção crônica por EBV e uma suscetibilidade genética para defeitos específicos em relação à imunidade para o EBV.3,4 Clinicamente, eles se manifestam como erupções papulovesiculares, com centros necróticos, em áreas expostas e não expostas ao sol.1 Lie et al. relatam que 12% dos pacientes apresentam sintomas oculares, incluindo córnea nebulosa, edema conjuntival, fotofobia e lacrimejamento.5 Infelizmente, nosso paciente apresentava comprometimento ocular grave e, que seja de nosso conhecimento, não há relatos anteriores dessa associação, por isso propomos essa nova característica, em razão do quadro clínico e da positividade para DNA do EBV.
Histopatologicamente, a epiderme exibe necrose extensa com ulceração e angiocentricidade como achados comuns nos vasos.1 Os achados frequentes incluem um infiltrado denso de células linfoides atípicas de tamanho pequeno a médio e núcleos pleomórficos localizados principalmente ao redor dos anexos e dos vasos sanguíneos.1,4
A análise imuno‐histoquímica demonstrou uma população linfoide (CD3+, CD5+ e CD7+)1 com fenótipo citotóxico ou natural killer (CD8+ e CD56+, respectivamente).1 O fenótipo mais frequente é um infiltrado linfoide citotóxico, como em nosso paciente, com marcadores citotóxicos positivos.1–3 O desempenho do EBER é codificado para a detecção de RNA do EBV, e a positividade desse teste foi relatada em até 100%.1,3,5
O principal diagnóstico diferencial é hidroa vaciniforme clássica. Como a DLP‐HV, a hidroa vaciniforme clássica aparece em crianças, apresenta erupções papulovesiculares com centro crostoso e cicatrizes varioliformes posteriores. Entretanto, sua localização é limitada a áreas expostas ao sol, sem edema facial ou comprometimento sistêmico. O diagnóstico diferencial histopatológico inclui outros linfomas associados ao EBV – por exemplo, linfoma NK nasal, que se caracteriza por um curso clínico rapidamente progressivo, CD56+ e CD8− na análise imuno‐histoquímica.
Não há diretrizes para o tratamento em razão da raridade da doença. Beltran et al. consideram a talidomida um tratamento útil, por suas propriedades anti‐inflamatórias e antiproliferativas.2 Quatro pacientes peruanos receberam 100mg de talidomida por via oral diariamente com resultados diferentes.2 Nosso paciente apresentou remissão clínica de 12 meses após tratamento com talidomida, apoiando seu uso como agente imunomodulador de primeira linha.
Suporte financeiroNenhum.
Contribuição dos autoresJuliana Ordoñez‐Parra: Avaliação do paciente; revisão da literatura; elaboração do manuscrito.
Maddy Mejía Cortes: Avaliação do paciente, revisão da literatura, elaboração do manuscrito.
Maria Margarita Tamayo‐Buendía: Avaliação do paciente, revisão da literatura, elaboração do manuscrito.
Ana María Infante Gómez: Avaliação do paciente e revisão da literatura.
Conflito de interessesNenhum.
Como citar este artigo: Ordoñez‐Parra J, Mejía Cortes M, Tamayo‐Buendía MM, Infante Gómez AM. Hydroa vacciniforme‐like lymphoproliferative disorder (HV‐LPD) is an Epstein‐Barr virus (EBV) associated disease. An Bras Dermatol. 2021;96:388–90.
Trabalho realizado no Hospital Universitario San Ignacio, Bogotá, Colômbia.