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Vol. 97. Núm. 4.
Páginas 538-541 (1 julho 2022)
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Carta ‐ Caso clínico
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Dermatite infecciosa associada ao HTLV‐I: caso incomum no sul do Brasil simulando dermatite atópica refratária
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Michele Caroline dos Santos Garciaa,
Autor para correspondência
michelecsgarcia@yahoo.com.br

Autor para correspondência.
, Renata Hecka, Renan Rangel Bonamigoa,b, Cristiane Almeida Soares Cattania
a Ambulatório de Dermatologia Sanitária do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS, Brasil
b Faculdade de Medicina, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS, Brasil
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Prezado Editor,

O HTLV‐I (Human T Lymphotropic Virus type‐I), retrovírus humano descoberto na década de 1980,1 infecta preferencialmente os linfócitos T CD4. A prevalência mundial é incerta, estimada entre 5‐10 milhões de infectados,2 principalmente no Japão, Irã, América Latina e África.3,4

A dermatite infecciosa associada ao HTLV‐I (DIH) foi descrita na Jamaica em 1966, e associada ao HTLV‐I em 1990. É uma forma rara de dermatite exsudativa resistente aos tratamentos.1,3–5

Relatamos o caso de uma menina de 7 anos atendida no Sul do Brasil, nascida por parto vaginal, apresentando eczema recorrente grave desde os 18 meses, quando cessou a amamentação.

Ao exame, apresentava lesões eczematosas maceradas, exsudativas e fétidas no couro cabeludo e regiões retroauriculares, cervical, antecubitais e interglútea; alopecia temporal; crostas nas regiões umbilical, perioral e nasal (figs. 1 e 2). Exames laboratoriais normais, exceto sorologia para HTLV‐I/II que foi reagente, confirmando o diagnóstico de DIH conforme critérios descritos na tabela 1.5 Demais sorologias virais negativas. O exame neurológico foi normal. A mãe também apresentou sorologia positiva para HTLV‐I/II. Iniciado sulfametoxazol + trimetoprima via oral, com melhora clínica acentuada.

Figura 1.

(A‐D), Lesões eczematosas e exsudativas no couro cabeludo, com áreas de alopecia, e escoriações no conduto auditivo externo. Detalhe ampliado do conduto auditivo externo acometido (A). Áreas eritematoedematosas infrapalpebral e lesões eczematosas perilabial (C). Lesões eczematosas na região cervical e retroauriculares; alopecia occipital (D).

(0.6MB).
Figura 2.

(A‐C), Lesões eczematosas no tronco, fossas antecubitais e região interglútea, associadas à xerose difusa.

(0.32MB).
Tabela 1.

Critérios maiores para os diagnósticos de dermatite infecciosa associada com HTLV‐I

1. Presença de lesões eritêmato‐escamosas, exsudativas e crostosas em couro cabeludo, áreas retroauriculares, regiões cervicais e inguinais, axilas, pele perioral e paranasal, orelhas, tórax, abdômen e outros locais 
2. Crostas nas narinas 
3. Dermatite crônica recidivante com resposta imediata à terapia apropriada, mas recorrência logo após suspensão de antibióticos 
4. Diagnóstico de infecção pelo HTLV‐I por testes sorológicos ou de biologia molecular 

Adaptado de La Grenade5 et al., apud De Oliveira et al.1

Dos quatro critérios principais, três são necessários para o diagnóstico; 1, 3 e 4 são obrigatórios. No critério 1, é necessário acometimento de três ou mais regiões, incluindo couro cabeludo e áreas retroauriculares.

A DIH costuma iniciar na infância, e é considerada marcador clínico precoce de infecção pelo HTLV‐I.3,4 A principal via de transmissão é a amamentação.3,5 Sua patogênese envolve suscetibilidade individual, desregulação imunológica, superinfecção bacteriana, estimulação antigênica ambiental e inflamação persistente.4 O estado pró‐inflamatório pode estar relacionado com a proliferação de linfócitos T e os altos níveis de IL‐1, IL‐6, TNFα e IFNα; níveis elevados de IgE aumentam a suscetibilidade ao S. aureus e S. ß hemoliticus.4

HTLV‐I deve ser pesquisado nos quadros eczematosos graves, resistentes, recidivantes e com infecção secundária.4 Dermatite atópica (DA) e dermatite seborreica são os principais diagnósticos diferenciais.4 A histopatologia é inespecífica, e na imuno‐histoquímica predominam os linfócitos T CD8.4 Cerca de 10% dos infectados desenvolvem doenças como leucemia/linfoma de células T do adulto e mielopatia associada ao HTLV‐I/paraparesia espástica tropical do adulto.2–4 Os sintomas tendem à remissão na puberdade, mas perduram quando iniciados na idade adulta.1,4

A DIH não tem tratamento específico ou vacina; entretanto, costuma responder a antibióticos como sulfametoxazol + trimetoprim e cefalexina por longos períodos. Recidivas são comuns.3,4 Indivíduos infectados devem ser monitorados, pela possibilidade de complicações neurológicas e linfoproliferativas graves.

A interrupção da transmissão envolve triagem de doadores de sangue, uso de preservativos, aconselhamento familiar e evitar amamentação em mães infectadas e compartilhamento de agulhas.4

A DIH é relevante para o cotidiano de dermatologistas, infectologistas, hematologistas e neurologistas e, apesar da ausência nas listas de doenças negligenciadas, a percepção é que se aproxima muito dessa situação.4 Não é notificada compulsoriamente; sequer existem políticas para prevenção ou cuidados para os portadores do vírus.

Destacamos a importância deste caso por ter ocorrido fora das áreas endêmicas no Brasil ‐ regiões Norte e Nordeste ‐ e por ter sido manejado como DA recalcitrante por longo período.

Suporte financeiro

Nenhum.

Contribuição dos autores

Michele Caroline dos Santos Garcia: Concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito; aprovação da versão final do manuscrito.

Renata Heck: Revisão crítica do manuscrito; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; participação efetiva na orientação da pesquisa; aprovação da versão final do manuscrito.

Renan Rangel Bonamigo: Revisão crítica do manuscrito; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; participação efetiva na orientação da pesquisa; aprovação da versão final do manuscrito.

Cristiane Almeida Soares Cattani: Concepção e planejamento do estudo; revisão crítica do manuscrito; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; participação efetiva na orientação da pesquisa; aprovação da versão final do manuscrito.

Conflito de interesses

Nenhum.

Referências
[1]
M.F.S.P. Oliveira, P.L. Fatal, J.R. Leite Primo, J.L.S. Silva, E.S. Batista, L. Farré, et al.
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Brazil. Clin Infect Dis., 54 (2012), pp. 1714-1719
[2]
E.L. Murphy.
Infection with human T‐lymphotropic virus types‐1 and ‐2 (HTLV‐1 and ‐2): Implications for blood transfusion safety.
Transfus Clin Biol., 23 (2016), pp. 13-19
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F.T. Romero, B. Pinilla-Martín, S.I.P. Pérez.
Infective dermatitis associated with HTLV‐1: Dermatosis to be considered in patients from endemic areas.
Aten Primaria., 52 (2020), pp. 785-786
[4]
F.G. Bravo.
Infective dermatitis: A purely cutaneous manifestation of HTLV‐1 infection.
Semin Diagn Pathol., 37 (2020), pp. 92-97
[5]
L.L. Grenade, A. Manns, V. Fletcher, D. Derm, C. Carberry, B. Hanchard, et al.
Clinical, Pathologic, and Immunologic Features of Human T‐Lymphotropic Virus Type I‐Associated Infective Dermatitis in Children.
Arch Dermatol., 134 (1998), pp. 439-444

Como citar este artigo: Garcia MCS, Heck R, Bonamigo RR, Cattani CAS. Infectious dermatitis associated with HTLV‐I: uncommon case in southern Brazil simulating refractory atopic dermatitis. An Bras Dermatol. 2022;97:538–41.

Trabalho realizado no Ambulatório de Dermatologia Sanitária do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS, Brasil.

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Anais Brasileiros de Dermatologia (Portuguese)
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