Slime é o nome coloquial de um produto visco‐elástico usado como brinquedo, que ganhou popularidade nos últimos anos entre crianças e adolescentes do mundo todo. Pode ser de fabricação caseira ou industrializada. O primeiro é obtido pela mistura de artigos de uso cosmético e doméstico, inclusive espumas de barbear, soluções de lentes de contato com ácido bórico, colas, detergentes líquidos e sabão em pó, entre outros.1
Relatamos o caso de uma menina de 9 anos, com antecedente pessoal de atopia, que apresentava dermatite eczematosa nas mãos havia 5 anos, com períodos de exacerbação relacionados à manipulação do slime. A mãe referia que a paciente teve contato com o produto comercial e, em algumas ocasiões, criou o próprio brinquedo com hidratante corporal, água boricada, cola, bicarbonato de sódio, corante de alimento azul e espuma de barbear.
Ao exame dermatológico apresentava intenso eritema nas regiões palmares, sobre o qual se notavam múltiplas vesículas de conteúdo claro associadas à descamação, fissuras e algumas áreas exulceradas (fig. 1). O tratamento foi feito com corticoterapia sistêmica 0,5 mg/kg/dia e, após 2 meses, realizou‐se teste de contato com a bateria‐padrão brasileira, somada à solução aquosa de metilisotiazolinona (0,02%) e uma parte do produto industrializado (mesmo sabendo‐se da existência de potenciais irritantes em sua composição, que poderiam levar a possíveis reações falso‐positivas) (fig. 2). A leitura após 96 horas demonstrou positividade 2+ para Kathon CG, que é uma mistura de metilisotiazolinona (MI) e metilclorotiazolinona (MCI), e também para a metilisotiazolinona (MI) isolada 2+ (fig. 3), componente presente no hidratante, na cola e na espuma de barbear usados na confecção do produto caseiro. A empresa produtora do slime industrializado informou que os conservantes usados na sua composição foram os parabenos, negativos no teste de contato.
O slime pode causar tanto dermatite de contato irritativa (DCIP) quanto alérgica (DAC), principalmente quando é confeccionado em casa, com a adição de diferentes produtos comerciais. Quando irritativa, componentes do tipo ácido bórico, álcoois e glicóis são os responsáveis pela agressão da barreira cutânea.2 Por outro lado, alérgenos como a metilisotiazolinona e a metilclorotiazolinona são bem reconhecidos como causadores de DAC e são usados como conservantes em produtos industrializados e cosméticos, como lenços umedecidos, hidratantes, maquiagem, laquês, produtos de limpeza, colas, entre outros.3 No caso exposto, revelou‐se a importância da detecção das substâncias nos inúmeros produtos que podem ser usados.
Pacientes atópicos são propensos ao desenvolvimento de DAC pela deficiência da barreira cutânea e pelo contato constante com possíveis alérgenos. No caso relatado, a paciente tinha eczema das mãos relacionado à atopia, cuja exacerbação ocorreu após iniciar manipulação do gel e resultou na DAC.
Neste último ano foram publicados vários relatos de DCI e DAC provocadas pelo slime, o que deve alertar pais e profissionais de saúde sobre os riscos dessa brincadeira, principalmente quando fabricado em casa.2
Anderson et al. reuniu os ingredientes de 48 receitas de géis disponíveis na internet e evidenciou os principais alérgenos. Os mais comuns foram as fragrâncias mix I e II e conservantes, como propilenoglicol e MI, esse último o alérgeno positivo no caso da nossa paciente.4
Clinicamente, as causas dos eczemas das mãos são indistinguíveis. Como o slime pode causar ambas as formas de dermatite de contato, o teste de contato é essencial, não só para diagnóstico diferencial como para detectar o alérgeno causador. Identificá‐lo é importante, uma vez que as substâncias presentes no slime fazem parte da composição dos produtos de uso cotidiano dos pacientes, como shampoos, sabonetes e cremes. Desse modo, caso não haja um diagnóstico preciso, a dermatite pode evoluir com recidivas pela manutenção do contato com o alérgeno, aumentar a morbidade e dificultar o controle da doença.
Suporte financeiroNenhum.
Contribuição dos autoresNabila Scabine Pessotti: Elaboração e redação do manuscrito; revisão crítica da literatura.
Mariana de Figueiredo Silva Hafner: Aprovação da versão final do manuscrito; elaboração e redação do manuscrito; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados.
Mellanie Starck Possa: Aprovação da versão final do manuscrito; elaboração e redação do manuscrito; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados.
Rosana Lazzarini: Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados.
Conflitos de interesseNenhum.