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Vol. 99. Núm. 5.
Páginas 758-762 (1 setembro 2024)
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Cartas ‐ Caso clínico
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Agravamento e possível desencadeamento de pênfigo vulgar após vacinação contra COVID‐19: relato de dois casos
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Kinuko Irie
Autor para correspondência
kinuko07@fmu.ac.jp

Autor para correspondência.
, Toshiyuki Yamamoto
Departamento de Dermatologia, Fukushima Medical University, Fukushima, Japão
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Tabela 1. Casos relatados de pênfigo vulgar desencadeados ou exacerbados após vacinação contra COVID‐19
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Prezado Editor,

O pênfigo vulgar (PV) é dermatose bolhosa autoimune grave. Foram relatados fatores desencadeantes de PV de natureza genética, relacionados a neoplasias malignas e uso de medicamentos. Relatamos dois pacientes que apresentaram agravamento ou exacerbação do PV após a vacinação contra COVID‐19.

Caso 1: Paciente do sexo masculino, de 60 anos, com erosão dolorosa na mucosa oral há dois meses, atendido por otorrinolaringologista e internista. O paciente recebeu a segunda dose da vacina contra COVID‐19 (Comirnaty®) e, uma semana depois, apresentou eritema e erosões no local da vacinação no braço esquerdo. Posteriormente, desenvolveu eritema e erosões no tronco; foi encaminhado ao serviço de dermatologia um mês após a vacinação. O exame clínico mostrou erosões secundárias ao rompimento de lesões bolhosas, principalmente no tronco, couro cabeludo e braço esquerdo (fig. 1A). O paciente também apresentava múltiplas erosões na mucosa oral (fig. 1B). A histopatologia de fragmento de pele mostrou acantólise na camada epidérmicas inferiores e presença de densos infiltrados dérmicos com linfocíticos e eosinófílos (fig. 2A). A imunofluorescência direta (IFD) revelou deposição intercelular de IgG e C3 na epiderme (fig. 2B). Os níveis séricos de anticorpos anti‐desmogleína (Dsg)‐1 (120 U/mL, normal <3 U/mL) e anticorpos anti‐Dsg‐3 (262 U/mL, normal <3 U/mL) estavam elevados. Foi iniciada prednisolona oral (50mg/dia; 1mg/kg/dia); entretanto, a resposta foi fraca e, portanto, pulso de metilprednisolona (1.000mg/dia por três dias consecutivos), plasmaférese e metotrexato (6mg/semana) foram adicionados. Após obter remissão, o paciente recebeu a terceira e quarta doses da vacinação contra COVID‐19, sem recidiva.

Figura 1.

(A) Placa crostosa e eritema no local da vacinação no braço esquerdo. (B) Erosões na mucosa oral.

(0.29MB).
Figura 2.

(A) Achados histopatológicos mostrando acantólise nas camadas inferiores da epiderme e presença de denso infiltrado dérmico de linfócitos e eosinófilos (40×). (B) Imunofluorescência direta revelou deposição intercelular de IgG na epiderme (40×).

(0.99MB).

Caso 2: Paciente do sexo feminino, de 69 anos, recebeu a terceira dose da vacina contra COVID‐19 (Spikevax®) e, quase ao mesmo tempo, sofreu uma queimadura no braço direito. Posteriormente, a paciente desenvolveu erosões nas extremidades e no tronco, que aumentaram gradativamente em número; ela foi encaminhada ao serviço de dermatologia três meses após a vacinação. O exame clínico revelou extenso eritema, bolhas flácidas e erosões secundárias ao rompimento de lesões bolhosas no tronco (fig. 3). A paciente também apresentava múltiplas erosões na mucosa oral.

Figura 3.

Eritema intenso bolhas flácidas e erosões secundárias ao rompimento de lesões bolhosas no tronco.

(0.36MB).

A histopatologia de fragmento de pele do abdome revelou acantólise nas camadas epidérmicas inferiores e presença de densos infiltrados dérmicos com linfócitos e eosinófilos (fig. 4A). A IFD revelou deposição intercelular de IgG (fig. 4B) e C3 na porção inferior da epiderme. Os níveis séricos de anticorpos anti‐Dsg‐3 estavam elevados (8360 U/mL, normal <3 U/mL), enquanto os níveis de anticorpos anti‐Dsg‐1 estavam normais. O tratamento com prednisolona oral (45mg/dia [1mg/kg/dia]), pulsoterapia com metilprednisolona (1.000mg/dia por três dias consecutivos) e azatioprina (100mg/dia) resultou na epitelização completa das erosões após cinco semanas de tratamento.

Figura 4.

(A) Achados histopatológicos mostrando acantólise nas camadas epidérmicas inferiores e presença de denso infiltrado dérmico de linfócitos e eosinófilos (40×). (B) Imunofluorescência direta revelou deposição intercelular de IgG na porção inferior da epiderme (40×).

(0.92MB).

Foram relatados aparecimento ou exacerbações de PV desencadeados por vacinações ou infecções virais.1‐9 Também foram relatados casos de indução ou exacerbação de PV após vacinação contra influenza, raiva, hepatite B, tétano e difteria.1 Além disso, recentemente foram relatados casos de indução ou exacerbação de doenças bolhosas autoimunes, psoríase, líquen plano, dermatomiosite e lúpus eritematoso sistêmico após a vacinação contra COVID‐19.10 Acredita‐se que a ativação da imunidade inata em virtude da vacina seja a causa da exacerbação ou desenvolvimento de sintomas cutâneos. A injeção de BNT162b2 induz a ativação de células T e células B e, após a injeção, as células T CD4+ e CD8+ aumentam com a produção de IFN‐γ e IL‐2.2 Foi sugerido que a vacinação contra a COVID‐19 contribui para a produção de citocinas como IL‐4, IL‐17 e IL‐21, que desempenham papéis importantes em doenças bolhosas autoimunes, como o PV.3 As vacinas também ativam as células B, levando ao aumento da produção de anticorpos.4 Os casos relatados1‐9 de PV que apresentaram desenvolvimento de novo ou pioraram após a vacinação contra COVID‐19 estão resumidos na tabela 1. O PV surgiu após uma mediana de sete (intervalo de 1‐30) dias cada após a primeira, segunda e terceira doses das vacinas. Em contraste, o tempo médio para casos de exacerbações foi de três dias (intervalo de 3‐14 dias), período significantemente mais curto do que nos casos de primeira apresentação. Entretanto, há dois casos que puderam receber vacinas adicionais após terem sido submetidos a tratamento intenso para PV sem agravamento da doença. Em um dos presentes casos também foi possível aplicar doses adicionais da vacina contra a COVID‐19 sem agravamento da doença. A vacina contra a COVID‐19 certamente pode exacerbar o PV em casos muito raros; ainda assim, a vacina pode ser administrada com segurança em pacientes com PV cuja doença esteja bem controlada. Como a vacinação é um procedimento necessário para prevenir o agravamento da COVID‐19 em pacientes imunossuprimidos, os raros casos de progressão do PV não devem desencorajar a vacinação de pacientes com PV.

Tabela 1.

Casos relatados de pênfigo vulgar desencadeados ou exacerbados após vacinação contra COVID‐19

N°  Autor  Idade (anos)  Gênero  Vacina  Localização da lesão bolhosa  Dose  Primeira apresentação/exacerbação  Tempo até o início (dias)  Dsg1/ Dsg3  Tratamento  Vacinação de reforço 
Singh et al.1  44  ChAdOx1 nCov‐19  Mucosa oral, tronco, face, região cervical, extremidades  2a  Primeira apresentação  ND/+  CO/CIV/  Não 
                    IVIg/AZP   
Thongprasom et al.1  38  AZD1222  Mucosa oral  1a  Primeira apresentação  ND  CT  Não 
Koutlas et al.1  60  mRNA‐1273  Mucosa oral  2a  Primeira apresentação  −/−  CO/RTX  Não 
Knechtl et al.1  89  BNT162b2  Mucosa oral, tronco, região dorsal, braço esquerdo  2a  Primeira apresentação  30  +/+  CO/RTX  Não 
Damiani et al.1  40  mRNA‐1273  Dorso, membros superiores  1a  Exacerbação  ND  CO aumentado/MMF  Recebida após tratamento para PV/sem alteração no quadro clínico de PV 
Damiani et al.1  80  BNT162b2  Dorso  1a  Exacerbação  ND  CO  Recebida após tratamento para PV/sem alteração no quadro clínico de PV 
Solimani et al.2  40  BNT162b2  Mucosa oral, tronco, dorso  1a/2a  Primeira apresentação/ Exacerbação  5/3  +/+  CO/AZP  Recebida antes do tratamento para PV; as lesões de PV pioraram 
Shakoei et al.3  28  BBIBP‐CorV  ND  1a  Exacerbação  14  ND  CO/RTX  No 
Shakoei et al.3  30  BBIBP‐CorV  Mucosa oral  1a  Primeira apresentação  16  ND  CO/RTX  No 
10  Corrá et al.4  61  BNT162b2  Face, tronco  3a  Primeira apresentação  +/+  CO  Não 
11  Corrá et al.4  73  BNT162b2  Mucosa oral  3a  Primeira apresentação  30  ND/+  CO/RTX  Não 
12  Corrá et al.4  63  ChAdOx1 nCov‐19  Mucosa oral, face, tronco  1a/2a  Primeira apresentação/Exacerbação  28/4  +/+  CO/RTX  Recebida antes do tratamento para PV; as lesões de PV pioraram 
13  Calabria et al.5  60  BNT162b2  Mucosa oral, mucosa da orofaringe  2a  Primeira apresentação  −/+  CO/RTX   
14  Akoglu5  69  ChAdOx1 nCov‐19  Mucosa oral, região cefálica, membros  1a  Primeira apresentação  +/+  MTX  Não 
15  Agharbi et al.6  72  BNT162b2  Mucosa oral, tronco, cabeça, pescoço, extremidades  2a  Primeira apresentação  +/+  CO/AZP  Não 
16  Hali et al.7  58  BNT162b2  Mucosa oral e genital, tronco, face, região cervical, extremidades  1a  Primeira apresentação  30  ND  CO  Recebimento programado 
17  Norimatsu et al.8  86  BNT162b2  Braço esquerdo, face, região lombar  2a  Primeira apresentação  +/+  CO/CIV  Não 
18  Saffarian et al.9  76  BBIBP‐CorV  Mucosa oral e genital, tronco, região cefálica  2a  Primeira apresentação  30  −/−  CO/RTX  Não 
19  Our case 1  60  BNT162b2 (1st, 2ndMucosa oral, couro cabeludo, tronco, braço esquerdo  2a  Exacerbação  +/+  CO/CIV/PF/MTX  Recebida após tratamento para PV/sem alteração no quadro clínico de PV 
20  Our case 2  69  BNT162b2 (1a, 2a), mRNA‐1273 (3aMucosa oral, tronco, região dorsal  3a  Primeira apresentação ou exacerbação  ND  −/+  CO/CIV/AZP  Não 

ND, não disponível; DSG1, anticorpo anti‐desmogleína‐1; DSG3, anticorpo anti‐desmogleína‐3; CT, corticosteroides tópicos; CO, corticosteroides orais; CIV, corticosteroides intravenosos; RTX, rituximabe; MTX, metotrexato; AZP, azatioprina; MMF, micofenolato mofetil; IVIg, terapia intravenosa com imunoglobulina em altas doses; PF, plasmaférese; PV, pênfigo vulgar.

Suporte financeiro

Nenhum.

Contribuição dos autores

Kinuko Irie: Revisão crítica da literatura; Obtenção, análise e interpretação dos dados; elaboração e redação do manuscrito; análise estatística; concepção e planejamento do estudo; aprovação da versão final do manuscrito

Toshiyuki Yamamoto: Concepção e planejamento do estudo; revisão crítica do manuscrito; aprovação da versão final do manuscrito

Conflito de interesses

Nenhum.

Referências
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A. Singh, S.J. Bharadwaj, A.G. Chirayath, S. Ganguly.
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Como citar este artigo: Irie K, Yamamoto T. Severe aggravation and possible triggering of pemphigus vulgaris following COVID‐19 vaccination: report of two cases. An Bras Dermatol. 2024;99:758–62.

Trabalho realizado na Fukushima Medical University, Fukushima, Japão.

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