A colagenose perfurante reacional é uma dermatose perfurante rara caracterizada clinicamente por pápulas hiperpigmentadas intensamente pruriginosas, placas e nódulos com um tampão ceratótico central. A histopatologia revela eliminação transepidérmica de fibras de colágeno. Sua fisiopatologia ainda está sob investigação, mas a forma adquirida tem sido associada a condições sistêmicas como diabetes melito e doença renal crônica. No entanto, a colagenose perfurante reacional também foi descrita como uma síndrome paraneoplásica. Os autores apresentam o caso de uma paciente diabética, de 65 anos, com suspeita de neoplasia mieloproliferativa.
Os autores relatam o caso de uma paciente do sexo feminino, 65 anos, diabética, com controle metabólico deficiente (HbA1c 14,9%) e histórico de lesões pruriginosas em tronco e extremidades havia dois meses.
Ao exame físico, observavam‐se múltiplas pápulas umbilicadas, hiperpigmentadas e com tampão ceratótico central (figs. 1 e 2), além de linfadenopatias inguinais e cervicais de até 2cm de diâmetro. As membranas mucosas não foram afetadas.
Os exames laboratoriais revelaram anemia leve com eosinofilia leve (hemoglobina 10,9g/dL, 940 eosinófilos/mL), velocidade de hemossedimentação elevada (93mm/h) e desidrogenase lática elevada (1,000 unidades/L).
Qual o seu diagnóstico?- a)
Prurigo nodular
- b)
Erupção liquenoide medicamentosa
- c)
Papulose linfomatoide
- d)
Dermatose perfurante
A biópsia da pele evidenciou uma depressão cupuliforme da epiderme, com um tampão de queratina sobreposto que continha fibras de colágeno, detritos de queratina e células inflamatórias nos cortes histológicos corados com hematoxilina‐eosina (HE). A coloração de Van Gieson demonstrou fibras de colágeno orientadas verticalmente, extrudindo através da epiderme (figs. 3 e 4).
A paciente foi tratada com anti‐histamínicos e triancinolona. Um estudo secundário para investigar uma neoplasia mieloproliferativa foi negativo; a paciente foi encaminhada a um endocrinologista para melhorar o controle metabólico.
DiscussãoA colagenose perfurante reacional (CPR), uma doença rara no espectro das dermatoses perfurantes, apresenta perfuração epidérmica e eliminação transepidérmica de colágeno e/ou fibras elásticas como características histológicas.1
A CPR pode ser classificada em formas hereditárias e adquiridas. O tipo hereditário aparece na primeira infância e é determinado geneticamente por herança autossômica, enquanto a forma adquirida (CPRA) acompanha doenças sistêmicas, mais comumente diabetes melito (DM) e doença renal crônica (DRC).2 No entanto, a CPRA também foi associada a neoplasias mieloproliferativas e sólidas.3
Clinicamente, a doença se apresenta com pápulas, placas e nódulos eritematosos e/ou hiperpigmentados. As lesões apresentam um tampão hiperceratótico central umbilicado ou crateriforme, são intensamente pruriginosas e o fenômeno de Koebner é observado. Após a cicatrização, cicatrizes atróficas hipo ou hiperpigmentadas são comumente observadas.3,4 Essas lesões aparecem em áreas de trauma superficial e são provavelmente causadas pelo prurido. Em pacientes diabéticos, a vasculopatia da derme foi proposta como um fator sinérgico.5 Região palmoplantar, áreas intertriginosas e membranas mucosas geralmente não são afetadas.3,6
A CPR é um diagnóstico clínico que requer confirmação histopatológica; suas características dependem do estágio da doença. Inicialmente, fibras colágenas degeneradas e necrose estendem‐se pele derme reticular; também pode ser observada hiperplasia epidérmica. Em lesões mais avançadas, a epiderme desenvolve uma depressão cupuliforme com um tampão de queratina basofílico sobreposto que consiste em células inflamatórias e detritos de queratina. As fibras colágenas verticais, que se coram em vermelho com a coloração elástica de Van Gieson e em azul com a coloração do tricrômico de Masson, podem ser observadas na base da ulceração e sendo eliminadas através da epiderme.7
Os objetivos do tratamento são a melhoria do prurido e das lesões cutâneas e, principalmente, o controle das doenças internas associadas. A terapia primária baseada em corticosteroides tópicos, anti‐histamínicos ou antibióticos tem sido recomendada. Em caso de falha, deve‐se considerar o tratamento de segunda linha com alopurinol.8,9
Este caso reforça a necessidade de se considerar o diagnóstico de CPRA em casos de lesões pruriginosas crônicas, principalmente no contexto de DM e DRC. Porém, mesmo nesse cenário, quando a suspeita clínica de uma neoplasia associada é alta, uma investigação básica de neoplasias malignas internas deve ser realizada.
Suporte financeiroNenhum.
Contribuição dos autoresCatalina Hasbún: Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.
Mauricio Sandoval: Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica do manuscrito.
Sergio González-Bombardiere: Aprovação da versão final do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados.
Conflitos de interesseNenhum.
Como citar este artigo: Hasbún C, Sandoval M, González‐Bombardiere S. Case for diagnosis. Hyperpigmented and excoriated papules and nodules in a diabetic patient. An Bras Dermatol. 2020;95:757–9.
Trabalho realizado no Departamento de Dermatologia, Faculdade de Medicina, Pontificia Universidad Católica de Chile, Santiago, Chile.