A pandemia de COVID‐19 promoveu um aumento do uso de meios digitais na área médica com a regulamentação do uso da telemedicina no Brasil. Diante da explosão de contágio em nosso país desde fevereiro de 2020, o Conselho Federal de Medicina, em março deste ano, reconheceu a possibilidade de uso da telemedicina com propósito de teleorientação, telemonitoramento e teleinterconsulta (CFM 1756/2020). A realização de consultas remotas em caráter temporário foi regulamentada logo após (portaria n° 467, do Ministério da Saúde), seguida pela lei 13.989, sancionada pelo presidente da República em abril.1,2
Apesar da tendência mundial, a teledermatologia ainda era vista com ressalvas no Brasil. As primeiras experiências nesse campo estavam voltadas para a teletriagem e tele‐educação, e datam do início dos anos 2000. Ações no âmbito da dermatologia compreenderam o Telemedhansen, Telederma e o Anapec, entre outros. Mais recentemente, estudo realizado no Núcleo de Telemedicina e Telessaúde do estado de Santa Catarina possibilitou a teletriagem diagnóstica do câncer de pele por meio do compartilhamento remoto de imagens clínicas e dermatoscópicas das lesões cutâneas.3–6
A adoção dessa modalidade de atendimento por dermatologistas em seus consultórios era pouco considerada até o momento. Com o objetivo de avaliar a adoção da teleconsulta dermatológica no meio privado, realizamos um levantamento junto aos associados do 5° distrito dermatológico da SBD – Regional São Paulo, por meio do envio de formulário on‐line, distribuído no mês de junho de 2020, dois meses após a instalação do lockdown. Do total de 300 dermatologistas que receberam o questionário por e‐mail, englobando 35 cidades do interior do estado de São Paulo, houve retorno de 84 formulários (30% dos associados).
Dos que responderam à pesquisa, 60% tinham entre 41 e 60 anos de idade. Desses, apenas 7% realizavam teleatendimento antes da pandemia e da regulamentação.
Diversos motivos foram citados por aqueles que não estavam realizando teleconsulta no momento do estudo (n = 42), dentre os quais a resposta “não sinto que sanará as expectativas do meu paciente” foi referida por 17% dos entrevistados. Experiências prévias frustrantes (12%) e resistência na utilização da tecnologia no dia a dia (12%) foram outras justificativas. Questões financeiras também foram apontadas em menor escala (repasses menores dos convênios, aviltamento da profissão, falta de procura).
Por outro lado, a realização de telemedicina “a pedido do paciente” foi o motivo da adoção dessa tecnologia por 33% dos dermatologistas, seguido por ser essa “mais uma possibilidade de renda” (18%) e “diminuição de fluxo de pacientes no consultório” (12%). Os entusiastas dessa tecnologia (conhecidos pela denominação de early adopters) corresponderam a 9% dos entrevistados.7
Quando questionados sobre o grau de resolutividade da teledermatologia em uma escala de 1 (sem resolutividade) a 5 (completamente resolutiva), 53% dos dermatologistas atribuíram nota 3 e 33% nota 4, configurando 86% que consideraram a tecnologia capaz de atender a suas demandas. Por fim, 63% dos entrevistados pretendem continuar o uso da telemedicina, mesmo após o término da pandemia de COVID‐19 (fig. 1).
Apesar de ter sido precipitada por uma situação excepcional, o cenário descrito em nosso estudo reflete uma tendência de mudança de paradigma no exercício da especialidade no Brasil, que pode passar a considerar a teledermatologia uma opção viável no atendimento aos pacientes. Uma vez que a maioria dos dermatologistas que testaram a nova tecnologia a vê como uma ferramenta satisfatória, fazer a replicação desse método aos que ainda não a praticam pode ser um dos principais obstáculos na implementação dessa modalidade a posteriori. A adequação monetária e a instituição de regras bem definidas de uso também parecem ser fatores importantes para sua implementação definitiva.
Diversos estudos na literatura apontam a eficácia da teledermatologia tanto na detecção precoce de neoplasias malignas quanto na teletriagem de queixas tegumentares. Certamente, esse modelo de saúde conectado poderá fazer diferença num país continental e tão heterogêneo como o Brasil.2,7,8
Esse levantamento aponta outros usos da teledermatologia também no campo privado e no âmbito dos consultórios, para além das ações voltadas à capacitação/matriciamento.
Suporte financeiroNenhum.
Contribuição dos autoresDimitri Luz Felipe da Silva: Conceito e desenho do estudo; coleta e análise/interpretação dos dados; concepção, escrita e/ou revisão crítica do artigo com conteúdo intelectual relevante; aprovação da versão a ser submetida.
Luiz Gameiro: Conceito e desenho do estudo; coleta e análise/interpretação dos dados; concepção, escrita e/ou revisão crítica do artigo com conteúdo intelectual relevante; aprovação da versão a ser submetida.
Juliana Yumi Massuda: Conceito e desenho do estudo; coleta e análise/interpretação dos dados.
Renata Ferreira Magalhães: Conceito e desenho do estudo; coleta e análise/interpretação dos dados; aprovação da versão a ser submetida.
Andrea Eloy Fernandes da Costa França: Conceito e desenho do estudo; coleta e análise/interpretação dos dados; concepção, escrita e/ou revisão crítica do artigo com conteúdo intelectual relevante; aprovação da versão a ser submetida.
Conflito de interessesNenhum.