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Vol. 95. Núm. 1.
Páginas 57-62 (1 janeiro 2020)
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Sarcoidose cutânea: perfil clínico‐epidemiológico de 72 casos de um hospital terciário em São Paulo, Brasil
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Mariana Fernandes Torquato
Autor para correspondência
marytorquato@hotmail.com

Autor para correspondência.
, Marcella Karen Souza da Costa, Marcello Menta Simonsen Nico
Departamento de Dermatologia, Hospital das Clínicas, Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil
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Estatísticas
Figuras (1)
Tabelas (3)
Tabela 1. Características clínicas de 72 pacientes com sarcoidose cutânea
Tabela 2. Características do envolvimento extracutâneo
Tabela 3. Tratamento dos pacientes com sarcoidose cutânea
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Resumo
Fundamentos

A sarcoidose é uma doença multissistêmica de causa desconhecida, caracterizada pela presença de inflamação granulomatosa não infecciosa em diversos órgãos. O envolvimento cutâneo é comum, com incidência relatada entre 9% e 37% dos pacientes. Estudos sobre sarcoidose cutânea no Brasil são escassos.

Objetivos

Descrever aspectos clínico‐epidemiológicos dos pacientes com sarcoidose cutânea diagnosticada no Departamento de Dermatologia da Universidade de São Paulo, de maio de 1994 a março de 2018.

Métodos

Os aspectos clínicos de pacientes com sarcoidose cutânea confirmada foram revisados retrospectivamente e classificados de acordo com gênero, etnia, idade ao diagnóstico, tipo de manifestação cutânea, envolvimento sistêmico e tratamento efetuado.

Resultados

A sarcoidose cutânea foi diagnosticada em 72 pacientes, predominou no sexo feminino (74%), idade média ao diagnóstico de 49,6 anos, com maioria de etnia branca (61%). Pápulas e placas foram as lesões mais comuns. Doença sistêmica foi detectada em 81% dos pacientes, afetando principalmente pulmões e linfonodos torácicos (97%). Tipicamente, as lesões cutâneas foram a primeira manifestação (74%). Terapia sistêmica foi necessária em 72%, com seguimento clínico feito por dermatologistas em grande parte dos casos. Os glicocorticoides orais foram os medicamentos sistêmicos mais usados (92%), com média de 1,98 medicamento sistêmico por paciente.

Limitações do estudo

Dados insuficientes nos prontuários médicos.

Conclusão

Esta série destaca o papel do dermatologista no reconhecimento e diagnóstico da sarcoidose cutânea, na avaliação do acometimento sistêmico e seu tratamento. A sarcoidose cutânea já foi considerada extremamente infrequente no Brasil em comparação com doenças granulomatosas infecciosas; no entanto, a presente casuística parece sugerir que a enfermidade não é tão rara em nosso meio.

Palavras‐chave:
Brasil
Doença granulomatosa crônica
Epidemiologia
Manifestações cutâneas
Sarcoidose
Texto Completo
Introdução

A sarcoidose é uma doença multissistêmica de causa desconhecida, caracterizada pela presença de inflamação granulomatosa não infecciosa em vários órgãos. Estudos mostram que suscetibilidade genética e fatores ambientais contribuem para o desenvolvimento de uma resposta imune exacerbada.1 O curso clínico varia e, na metade dos casos, a doença se resolve espontaneamente dentro de dois a cinco anos. Após cinco anos, a remissão é muito menos provável.2 Os pulmões e os linfonodos torácicos são os órgãos mais comumente afetados (90% dos casos), mas a doença pode acometer quase todos os órgãos.3

O envolvimento cutâneo é comum, com incidência relatada entre 9% a 37%.2,4–7 As manifestações cutâneas podem ser classificadas em duas categorias: lesões específicas, em que há evidência histopatológica de granulomas sarcoídeos típicos, e lesões não específicas, que se desenvolvem como resultado de um padrão global de reação inflamatória.2,4–9 O eritema nodoso é a lesão cutânea não específica mais comum, ocorre em formas agudas de sarcoidose, indicando, em geral, boa prognose.10 As lesões específicas são crônicas, assintomáticas e requerem tratamento.2,4–9

Máculas, pápulas e placas, lúpus pérnio, nódulos superficiais e nódulos subcutâneos (conhecidos como nódulos de Darier‐Roussy) constituem as lesões específicas mais comuns. Manifestações menos comuns incluem lesões hipopigmentadas, o angiolupoide e formas psoriasiformes, eritrodérmicas, ulcerativas, ictiosiformes, verrucosas ou liquenoides.2,4–9 Aparecimento de lesões sobre cicatrizes antigas, que se tornam inflamadas, ou em tatuagens, é observado.

Quando há suspeita clínica, é importante uma biópsia de pele para estabelecer evidências histopatológicas de sarcoidose e excluir outras causas de doença granulomatosa, por meio da demonstração de microrganismos no tecido em culturas.11 A histopatologia revela granulomas não necrotizantes compostos de histiócitos mononucleares, caracteristicamente com pequeno número de linfócitos circundantes, além de células gigantes de Langhans.4 Caracteristicamente, a intradermorreação à tuberculina é negativa. Uma vez confirmada sarcoidose cutânea, a avaliação de possível comprometimento sistêmico é obrigatória.2,11

A terapia geralmente é direcionada ao órgão mais gravemente afetado, o que frequentemente leva à melhora das lesões cutâneas. Para pacientes com sarcoidose cutânea isolada ou com doença cutânea grave, recomenda‐se uma abordagem gradual com terapias locais, imunomoduladores e imunossupressores sistêmicos.12

A sarcoidose é considerada infrequente no Brasil; suas características não são analisadas em detalhe desde 1976, quando foi feita uma revisão de 40 casos.13 O objetivo deste estudo foi caracterizar os aspectos clínicos e epidemiológicos da sarcoidose cutânea em um hospital terciário de São Paulo, Brasil.

Métodos

Após aprovação do comitê de ética institucional, foi feito um estudo retrospectivo que analisou os prontuários médicos de 72 casos diagnosticados como sarcoidose cutânea no Departamento de Dermatologia da Universidade de São Paulo, Brasil, de maio de 1994 a março de 2018.

O diagnóstico de sarcoidose cutânea foi baseado em quadro clínico compatível, evidência histopatológica de granulomas sarcoídeos na biópsia de pele e exclusão de outras doenças granulomatosas por meio de colorações especiais para microrganismos e culturas. Todos os pacientes foram submetidos à avaliação dos órgãos internos, inclusive história com revisão completa dos sistemas, exame físico, radiografia de tórax (estadiamento radiográfico para sarcoidose pulmonar ? RSPS),2,11 testes de função pulmonar, avaliação oftalmológica, perfil hematológico e bioquímico, eletrocardiograma e teste tuberculínico. Outras investigações haviam sido feitas conforme necessário, de acordo com o quadro clínico individual. Foram excluídos do estudo os casos cujos prontuários médicos não estavam disponíveis.

Os dados clínicos foram revisados retrospectivamente para obtenção das variáveis gênero, idade ao diagnóstico, etnia, morfologia e distribuição de lesões cutâneas, envolvimento extracutâneo, manifestação inicial e tratamento estabelecido. Depois disso, dados estatísticos descritivos foram usados para sintetizar as informações.

Resultados

Dos 74 pacientes selecionados inicialmente com diagnóstico confirmado de sarcoidose cutânea, dois, dos quais não havia informação clínica suficiente, foram excluídos. As características clínicas dos 72 casos restantes estão resumidas na tabela 1. A razão entre homens e mulheres foi de aproximadamente 1:2,8 – 19 homens (26%) e 53 mulheres (74%). A mediana de idade no momento do diagnóstico foi de 49,6 anos (de 28 a 69). A maioria dos pacientes era de etnia branca (61%).

Tabela 1.

Características clínicas de 72 pacientes com sarcoidose cutânea

Características  N° de pacientes  Porcentagem (%) 
Sexo
Masculino  19  26 
Feminino  53  74 
Etnia
Branca  44  61 
Negra  28  39 
Idade, anos
Média  49,6   
Faixa etária  28‐69   
Lesões específicas
Placas  32  44 
Pápulas  30  42 
Subcutânea  11  15 
Lúpus pérnio  11 
Angiolupoide 
Hipopigmentada 
Associada à tatuagem 
Cicatrizes 
Psoriasiforme 
Liquenoide 
≥ 2 tipos  20  28 
Localizações especiais
Unha 
Cavidade oral 
Alopecia cicatricial 
Genital 
Distribuição
Cabeça e pescoço  50  69 
Face  44  61 
Somente Face  16  22 
Nariz  21  29 
Membros superiores  38  53 
Membros inferiores  26  36 
Tronco  25  35 
≥ 2 localizações  40  56 

As lesões cutâneas específicas observadas incluíram placas em 32 casos (44%), seguidas por pápulas em 30 (42%), nódulos subcutâneos em 11 (15%), lúpus pérnio em oito (11%), angiolupoide em quatro (6%), lesões hipopigmentadas em dois (3%), lesões psoriasiformes em um (1%) e lesões liquenoides em um (1%). Cicatriz e sarcoidose associada à tatuagem foram observadas em um (1%) e dois (3%) pacientes, respectivamente (fig. 1). Vinte pacientes (28%) apresentavam mais de um tipo de lesão dermatológica. Oito pacientes tiveram lesões em outras localizações, como unhas (três), cavidade bucal (dois), couro cabeludo (alopecia cicatricial específica) (dois) e genitália (um). Cabeça e pescoço foram os locais mais acometidos, com lesões em 50 pacientes (69%). Quarenta e quatro pacientes (61%) apresentaram comprometimento facial. As lesões afetaram apenas a face em 16 pacientes (22%) e 21 (29%) tiveram lesões no nariz. Lesões estavam presentes nas extremidades superiores em 38 pacientes (53%), extremidades inferiores em 26 (36%) e tronco em 25 (35%). Cinquenta e seis pacientes (40%) demonstraram lesões em dois ou mais locais.

Figura 1.

Exemplos clínicos de sarcoidose cutânea: A, Forma papulosa; B, Forma subcutânea; C, Lúpus pérnio; D, Angiolupoide, E, Forma hipocromiante; F, Lesões liquenoides; G, Lesões em cicatriz antiga; H, Infiltração periungueal com osteíte e onicodistrofia; I, Granulomas compostos predominantemente por histiócitos epitelioides (Hematoxilina & eosina, 40×).

(0.64MB).

Comprometimento sistêmico específico foi detectado em 58 pacientes (81%) e as lesões cutâneas foram a primeira manifestação em 43 (74%) desses (tabela 2). O diagnóstico de sarcoidose extracutânea ocorreu antes da doença cutânea em 15 casos (26%). Sarcoidose pulmonar foi a manifestação sistêmica mais frequente, acometeu 56 pacientes (97% dos pacientes com comprometimento sistêmico). De acordo com o RSPS,1 25 pacientes apresentavam sarcoidose pulmonar estágio I (linfadenopatia isolada), 21 estágio II (infiltração pulmonar com linfadenopatia), dois estágio III (infiltração pulmonar sem linfadenopatia) e oito estágio IV (fibrose pulmonar). Outros órgãos comumente envolvidos foram os rins em oito pacientes (14%), linfonodos extratorácicos em oito (14%) e olhos em sete (12%). Dos pacientes com doença renal, cinco apresentavam apenas hipercalciúria assintomática e três apresentavam nefrolitíase. As manifestações oculares mais comuns foram uveíte e hipertrofia da glândula lacrimal em cinco e dois pacientes, respectivamente. Dois pacientes (3%) apresentaram sarcoidose cardíaca. A doença afetou o fígado, o baço, o pâncreas, o trato gastrintestinal, o trato respiratório superior, os músculos, os ossos e as articulações, separadamente, em casos isolados. A sarcoidose permaneceu confinada à pele, durante o seguimento, em 14 pacientes (19%).

Tabela 2.

Características do envolvimento extracutâneo

Características  N° de pacientes  Porcentagem, % 
Envolvimento extracutâneo  58  81 
Pulmonar  56  97 
Estágio 1  25  43 
Estágio 2  21  36 
Estágio 3 
Estágio 4  14 
Renal  14 
Linfadenopatia extratorácica  14 
Ocular  12 
Cardíaco 
Hepático 
Esplênico 
Pancreático 
Trato gastrintestinal 
Muscular 
Trato respiratório superior 
Articular 
Ósseo 
Manifestação inicial     
Cutânea  43  74 
Extracutânea  15  26 

Cinquenta e dois pacientes (72%) necessitaram de terapia sistêmica e 12 (17%) receberam apenas terapia local (tabela 3). Três pacientes perderam o acompanhamento clínico após o diagnóstico, um teve remissão espontânea e quatro ainda não haviam iniciado o tratamento quando do levantamento. Dos pacientes que foram tratados apenas com terapia local, uso tópico de corticosteroides foi feito em 10, corticosteroide intralesional em cinco e inibidor tópico de calcineurina (tacrolimo) em três. Em metade desses casos, uma associação de terapias locais foi necessária. Os corticosteroides por via oral constituíram a medicação sistêmica mais usada em 48 pacientes (92%), seguido por antimaláricos em 28 (54%), metotrexato em 18 (35%), azatioprina em quatro (8%) e leflunomida em dois (4%), antibióticos da classe das tetraciclinas em dois (4%), talidomida em um (2%) e infliximabe em um (2%). Dezessete pacientes (33%) receberam corticosteroides orais como monoterapia. O número médio de medicamentos sistêmicos usados em cada paciente durante o período de acompanhamento foi de 1,98. A terapia sistêmica foi direcionada para lesões cutâneas e, portanto, gerenciada exclusivamente pelo dermatologista em 24 pacientes (46%).

Tabela 3.

Tratamento dos pacientes com sarcoidose cutânea

Característica  N° de pacientes  Porcentagem, % 
Terapia local isolada  12  17 
Corticoide tópico  10  83 
Corticoide intralesional  42 
Inibidor de calcineurina tópico  25 
Terapia sistêmica  52  72 
Corticoide oral  48  92 
Antimalárico  28  54 
Metotrexato  18  35 
Azatioprina 
Leflunomida 
Antibióticos ‐ classe das tetraciclinas 
Talidomida 
Infliximabe 
Discussão

Embora a prevalência de sarcoidose no Brasil ainda não tenha sido estabelecida, estima‐se que seja menor do que 10 casos/100.000 habitantes.14 Dermatologistas brasileiros mais antigos alegavam que a sarcoidose cutânea era extremamente rara no Brasil. Em geral, considerava‐se que “um caso de sarcoidose cutânea é possivelmente um caso mal diagnosticado de hanseníase ou tuberculose”. Parece que a incidência da doença tem aumentado gradualmente nas últimas décadas.2 Os números em relação ao sexo e à média de idade ao diagnóstico na presente série coincidem com as estatísticas de outros países. No entanto, a maioria de nossos pacientes era branca (61%), ao contrário da maior prevalência clássica em negros.2,4,15

Lesões cutâneas levaram à detecção de sarcoidose extracutânea em 74% dos pacientes, valor corroborado por outros estudos.16,17

De acordo com várias séries anteriormente publicadas, as lesões específicas mais comuns da sarcoidose são as pápulas.18–20 No entanto, a sarcoidose do tipo placa foi a apresentação mais frequente em nosso estudo (44%), seguida pelas pápulas (42%). Essa proporção também foi encontrada em séries recentes do Líbano e em Taiwan.21,22 Placas podem surgir de novo ou a partir de uma confluência de pápulas. Quando comparadas às pápulas, as placas tendem a ter uma infiltração mais profunda e são mais propensas a deixar cicatrizes permanents ao se resolver. A presença de placas tem sido associada a um curso crônico da doença.18–20

Nódulos subcutâneos específicos (não eritema nodoso) foram observados em 15% dos pacientes, frequência maior do que a encontrada em outros estudos.8,18,20

O lúpus pérnio, lesão muito característica da sarcoidose cutânea, geralmente segue um curso crônico e frequentemente coexiste com sarcoidose do trato respiratório superior.7 Em nossa casuística, oito pacientes apresentaram lúpus pérnio, todos com doença sistêmica associada, muitas vezes grave e com envolvimento de muitos órgãos. Apenas um paciente apresentou comprometimento do trato respiratório superior. Cicatrizes e sarcoidose associada à tatuagem foram diagnosticadas em um e em dois pacientes, respectivamente. Essas lesões podem ser diagnosticadas erroneamente como cicatrizes hipertróficas ou queloides.7 Em alguns pacientes foram detectadas lesões específicas menos frequentes, como sarcoidose angiolupoide, hipopigmentada, psoriasiforme e liquenoide.

Acometimento facial esteve presente em 61% dos pacientes; uma proporção semelhante tem sido relatada por outros estudos.22,23 Em 40% dos casos, as lesões acometiam duas ou mais localizações.

Nosso procedimento inicial de rotina para o diagnóstico de sarcoidose incluiu histopatologia e cultura da pele (com feitura de colorações específicas para microrganismos), radiografia de tórax ou tomografia e um teste cutâneo negativo para tuberculina. Esse protocolo foi suficiente para diagnosticar sarcoidose sistêmica na maioria dos pacientes. Após o diagnóstico, a avaliação básica incluiu avaliação oftalmológica, perfil hematológico e bioquímico (nível sérico e urinário de cálcio, função hepática e renal), eletrocardiograma e testes de função pulmonar. Testes adicionais foram solicitados conforme a necessidade. Os níveis séricos de enzima conversora de angiotensina não são medidos em nosso serviço. Apenas 60% dos pacientes com sarcoidose apresentam níveis aumentados dessa enzima, os quais não são específicos para a doença.7

Caso a sarcoidose sistêmica não seja diagnosticada em um paciente com granulomas sarcoídicos cutâneos, deve ser feito acompanhamento em longo prazo. Em nossa série, a sarcoidose sistêmica foi detectada em 81% dos pacientes; em quase todos, pôde ser demonstrada logo após e como consequência do diagnóstico de doença cutânea. A sarcoidose pulmonar foi a manifestação sistêmica mais comum, afetou 97% dos nossos casos. A linfadenopatia foi o achado radiológico mais frequente (82%), seguido de infiltração pulmonar (41%) e fibrose (14%). Outros órgãos comumente envolvidos foram os rins (14%), linfonodos extratorácicos (14%) e olhos (12%). Com exceção do envolvimento renal, que esteve presente em maior proporção em nosso estudo, outros acometimentos de órgãos foram encontrados em taxas semelhantes às descritas anteriormente.1 Uma frequência maior de manifestações renais pode ser relacionada a um possível subdiagnóstico de hipercalciúria assintomática em pacientes estudados em outras publicações. Isso enfatiza a necessidade de dosar não apenas o nível sérico de cálcio, mas também o cálcio urinário.11,12

Quatorze pacientes apresentaram apenas manifestações cutâneas. É controverso na literatura se esses pacientes apresentarão envolvimento sistêmico adicional ou se sua doença ficará restrita à pele.12

Corticosteroides tópicos e intralesionais foram as terapias locais mais usadas em nossos pacientes. Essas drogas são consideradas terapia de primeira linha para sarcoidose cutânea com doença limitada ou leve, ou então como adjuvante para ajudar a controlar o distúrbio cutâneo quando a doença extracutânea está sob controle adequado. Inibidores tópicos de calcineurina, que têm baixo perfil geral de efeitos colaterais e são indicados para doenças de pele limitadas, também podem ser usados.12,24 Dos 12 pacientes (17%) tratados apenas com terapia local, cinco apresentaram lesões cutâneas isoladas e sete doença pulmonar leve, não necessitaram de tratamento sistêmico.

Para pacientes com doença grave ou que não respondem à terapia tópica, os corticosteroides orais são terapia sistêmica de primeira linha. Em caso de recaída ou se os sinais persistirem, agentes poupadores de esteroides devem ser instituídos isoladamente, ou com baixas doses de corticosteroide associado.12,25 Em nossa série, os corticosteroides foram os medicamentos mais usados (92%), em alguns casos como monoterapia (33%). Antimaláricos (54%) e metotrexato (35%) também foram usados. Outras medicações poupadoras de corticoides incluíram azatioprina (quatro pacientes), leflunomida (três), antibióticos da classe das tetraciclinas (três) e talidomida (um). O infliximabe tem sido usado recentemente para a sarcoidose recalcitrante.25 Esse medicamento foi prescrito para um paciente que apresentava lúpus pérnio, com doença sistêmica e cutânea grave, após falha terapêutica com outros esquemas combinados.

O número médio de medicamentos sistêmicos usados em cada paciente durante o período de acompanhamento foi de 1,98, confirmou que a maioria dos pacientes precisou receber de uma a duas medicações diferentes para alcançar o controle da doença. A terapia sistêmica foi direcionada para lesões cutâneas em 24 pacientes (46%) e, portanto, gerenciada exclusivamente pelo dermatologista nesses casos. Esses pacientes apresentavam apenas comprometimento cutâneo (sete) ou tinham comprometimento pulmonar leve, não considerado merecedor de tratamento pelos internistas (17).

Conclusão

Os achados clínicos e epidemiológicos do presente estudo foram, em sua maioria, semelhantes aos publicados na literatura. Suas limitações incluem o desenho retrospectivo e, em alguns casos, a falta de dados detalhados nos prontuários dos pacientes. Comparando‐se com dados da literatura, observou‐se uma incidência aumentada de comprometimento renal (hipercalciúria). Apesar do pequeno tamanho da amostra, representa a maior série brasileira sobre o assunto, sugerindo que a sarcoidose possa não ser tão infrequente no Brasil. Embora existam muitas doenças infecciosas granulomatosas endêmicas em nosso país, a sarcoidose certamente se destaca como um diagnóstico importante a ser considerado.

Suporte financeiro

Nenhum.

Contribuição dos autores

Mariana Fernandes Torquato: Análise estatística; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; revisão crítica da literatura.

Marcella Karen Souza da Costa: Análise estatística; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; revisão crítica da literatura.

Marcello Menta Simonsen Nico: Aprovação da versão final do manuscrito; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica do manuscrito.

Conflitos de interesse

Nenhum.

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Como citar este artigo: Torquato MF, Costa MKS, Nico MMS. Cutaneous sarcoidosis: clinico‐epidemiological profile of 72 patients at a tertiary hospital in São Paulo, Brazil. An Bras Dermatol. 2020;95:57–62.

Trabalho realizado no Departamento de Dermatologia, Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil.

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