Investigou‐se a cútis romboidal da nuca de um paciente de 65 anos. A microscopia óptica evidenciou aglomerações basofílicas na derme reticular com diminuição das fibras elásticas. A microscopia eletrônica de transmissão demonstrou estruturas alongadas, curvas e fragmentadas, no seu interior a presença de grumos elétron‐densos é diminuída e irregular, lembrando fibras elásticas modificadas, as fibras colágenas apresentaram aspecto normal. A microscopia eletrônica de varredura observou depósitos entre os feixes de colágeno, lembrando seixos ou pedras. Esses achados demonstram que em uma fase da doença, o colágeno se mantém normal e as alterações ocorrem no tecido elástico.
Cútis romboidal da nuca (CRN) é forma de apresentação da elastose solar identificada especialmente em pacientes com histórico de trabalho com exposição solar crônica. A pele da região posterolateral do pescoço adquire aspecto de “couro” típico, com superfície amarelada e sulcada.1
As alterações cutâneas relacionadas com o envelhecimento envolvem processos biológicos complexos que são constituídos de, basicamente, dois mecanismos: cronologia e exposição solar. O resultado são modificações estruturais na derme.2 Além disso, a elastose solar, incluindo a CRN, como marcador de exposição crônica à luz, é fator de risco para lesões cutâneas pré‐malignas e malignas.3
Foi obtido pequeno fragmento de pele CRN de um paciente de 65 anos de idade com histórico de exposição crônica à luz solar (fig. 1). Uma parte foi processada para a microscopia óptica; um fragmento foi preparado para microscopia eletrônica de transmissão (MET); os cortes ultrafinos foram direcionados para a derme reticular alta, e um terceiro fragmento foi desidratado e metalizado, para examinar a superfície da derme com microscopia eletrônica de varredura (MEV).
ResultadosA microscopia óptica com coloração de hematoxilina e eosina evidenciou um achatamento da epiderme, com aglomerações basofílicas na derme reticular (fig. 2A), com grandes aumentos observou-se que as estruturas basofílicas apresentavam contorno irregular e eram fragmentadas (fig. 2B). A coloração Verhoeff para fibras elásticas mostrou diminuição das mesmas nas áreas basofílicas (fig. 2C e D).
Microscopia óptica. (A) alterações basofílicas na derme superficial (Hematoxilina & eosina, 150×); (B) detalhe das alterações basofílicas com material irregular e fragmentado (Hematoxilina & eosina, 400×); (C e D) fibras elásticas diminuídas nas áreas basofílicas (Verhoeff, 150×).
A MET de cortes da derme reticular demonstrou achados semelhantes aos grandes aumentos com a microscopia óptica, com presença de estruturas alongadas, curvas e fragmentadas (fig. 3A). Observando o interior das estruturas alongadas e fragmentadas, a presença de grumos de material elétron denso em seu interior estava diminuída e irregular (fig. 3B‐D), lembrado fibras elásticas modificadas, cuja matriz em condições normais apresenta distribuição uniforme desses grumos (fig. 3B). As fibras colágenas não apresentaram modificações, mantendo a periodicidade típica das fibras à ultraestrutura (fig. 3C e D); em algumas áreas, observou‐se deposição de material amorfo (fig. 3D).
Microscopia eletrônica de transmissão. (A) fibras elásticas fragmentadas e irregulares (18.000×); (B) detalhe de uma fibra elástica irregular com modificação da distribuição de pontos escuros em seu interior, inserção com fibra normal para comparação (20.000×); (C) fibras colágenas normais (col) (12.000×); (D) detalhe de uma fibra elástica alterada com interior irregular, com deposição de material amorfo (seta) e colágeno normal (col) em cortes transversais e longitudinais, esses com periodicidade normal no quadrante inferior direito (25.000×).
A MEV da superfície da derme mostrou em pequeno aumento depósitos entre os feixes de colágeno (fig. 4A e B), e em maior aumento foi possível observar o aspecto arredondado de depósitos lembrando seixos ou pedras e estruturas de contorno irregular (fig. 4C e D). Em algumas áreas, observou‐se depósito de material granular (fig. 4C).
Microscopia eletrônica de varredura. (A e B) tecido fragmentado petriforme (setas) entre as fibras colágenas (col). (2.700× e 4.300×); (C) detalhe de quatro estruturas petriformes (a superior é curvada, similar à Figura 3A; um depósito granular é visto à direita [setas]) (8.500×); (D) detalhe dos depósitos lembrando pedras (7.500×).
A CRN é achado frequente de exame físico e marcador de fotoexposição crônica, correlacionando com prevalência de lesões malignas e pré‐malignas.3,4
Nossos achados de microscopia óptica mostram depósito basofílico na derme alta, denominado elastose solar e degeneração basofílica do colágeno.5 Nessas áreas, com coloração para fibra elástica, pôde‐se ver diminuição das mesmas.
A MET, na qual se examinam cortes de tecido, possibilitou observar que as fibras colágenas estão com aspecto normal, diferentemente das fibras elásticas, que se apresentaram com contorno irregular e fragmentadas, o que demonstra que pelo menos em uma fase da doença o colágeno se mantém normal, em acordo com publicações prévias.5,6 O depósito de material amorfo encontrado poderia ser de glicosaminoglicans, descritos em estudos bioquímicos.7
Os achados tridimensionais com MEV também mostram tecido fragmentado na derme, juntamente com feixes colágenos. Esses achados de depósitos lembrando pequenas pedras ou seixos já foram descritos em outras afecções dérmicas, demonstrando a superioridade da MET na análise de fibra elástica, a qual demonstra melhor as alterações internas das fibras com os cortes teciduais.8,9
Esses achados estão em acordo com publicação prévia, que demonstrou que lesões iniciais apresentam depósitos e áreas mais afetadas, grandes massas amorfas, e que o material elastótico é formado por fibras elásticas.10 A deposição de material amorfo associado com degeneração das fibras elásticas já foi relatada, bem como fibras colágenas mantidas e com desorganização dos feixes.11
Com esses resultados, o termo histológico “degeneração basofílica do colágeno” deveria ser substituído por “degeneração dérmica basofílica”. O outro termo utilizado, “elastose solar”, deveria ser usado como termo clínico, e não histológico.
Suporte financeiroNenhum.
Contribuição dos autoresÂngela Faistauer Torre: Aprovação da versão final do manuscrito; elaboração e redação do manuscrito; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.
Hiram de Almeida Jr: Aprovação da versão final do manuscrito; elaboração e redação do manuscrito; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.
Valeria Magalhães Jorge: Aprovação da versão final do manuscrito; elaboração e redação do manuscrito; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.
Antônia Larangeira de Almeida: Aprovação da versão final do manuscrito; elaboração e redação do manuscrito; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.
Conflito de interessesNenhum.
Como citar este artigo: Torre AF, Almeida Jr HL, Jorge VM, Almeida AL. Transmission and scanning electron microscopy of cutis rhomboidalis. An Bras Dermatol. 2021;96:328–31.
Trabalho realizado no Programa de Pós‐Graduação em Saúde e Comportamento, Universidade Católica de Pelotas e Liga de Dermatologia, Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, RS, Brasil.