A histiocitose intravascular é condição rara, caracterizada por agregados de histiócitos no lúmen de vasos dilatados na derme. Trata‐se de afecção pouco conhecida e de diagnóstico essencialmente histopatológico e imuno‐histoquímico. Relatamos caso de mulher de 55 anos, com surgimento de manchas eritematovioláceas nas mamas, dorso e região proximal dos membros havia um ano e meio. Antecedente de carcinoma ductal na mama direita, submetida à mastectomia em 2006 e colocação de prótese de silicone em 2009. A hipótese clínica foi metástase telangiectásica de carcinoma de mama. A histopatologia evidenciou ectasia, trombose e recanalização de vasos na derme superior com histiócitos no interior. À imuno‐histoquímica as células intravasculares foram CD68+ e negativas para receptores de estrógeno e progesterona, CK7, EMA e AE1/AE3 e as endoteliais foram CD34+, levou ao diagnóstico de histiocitose intravascular.
A histiocitose intravascular é uma afecção rara, caracterizada pela presença de histiócitos no interior de vasos linfáticos dilatados na derme. Pode ser primária ou secundária a doenças sistêmicas como artrite reumatoide e a próteses metálicas. Sua patogênese ainda é desconhecida.
Relato do casoPaciente do sexo feminino, 55 anos, referia surgimento de manchas eritematovioláceas, assintomáticas, nas mamas com progressão para dorso e região proximal dos membros havia um ano e meio (fig. 1). Apresentava antecedente de carcinoma ductal infiltrante na mama direita submetida à mastectomia em 2006, com uso de expansor e colocação de prótese de silicone em 2009. Foram feitas três biópsias cutâneas na mama esquerda e uma na coxa direita com hipótese clínica de metástase telangiectásica de carcinoma de mama e a histopatologia evidenciou ectasia, trombose e recanalização de vasos na derme superior com presença de células histiocitoides no lúmen (fig. 2). À imuno‐histoquímica, as células intravasculares foram negativas para CK7, EMA e AE1/AE3, exclui‐se a hipótese de metástase de câncer de mama e as células endoteliais foram CD34+ (fig. 3). Somente na última biópsia foi usado o anticorpo para CD68 (fig. 4) que veio positivo nas células intraluminais, levou ao diagnóstico de histiocitose intravascular.
A histiocitose intravascular é uma entidade rara que foi descrita pela primeira vez em 1994. É caracterizada pela presença de histiócitos no interior de vasos linfáticos dilatados na derme papilar e reticular.1,2 Desde 2003, foi incluída no espectro da angiomatoses cutâneas reativas, juntamente com a angioendoteliomatose reativa. A histiocitose intravascular pode ser primária ou secundária principalmente à artrite reumatoide, porém também a outras doenças inflamatórias como a de Crohn, dermatomiosite gamopatia monoclonal, próteses metálicas, infecções crônicas e neoplasias, especialmente câncer de mama. Todavia, também há casos associados a câncer de cólon, melanoma, necrose vulvar e osteoartose.1,3
Afeta principalmente mulheres de 17 a 87 anos com média de 65. As lesões geralmente são limitadas e apresentam‐se como mácula, pápula ou placa eritematoviolácea isolada ou como lesão livedo reticular símile nos membros ou tronco, porém há relatos de lesões disseminadas. Quando associadas à artrite reumatoide, prótese metálica e osteoartrose, as lesões surgiram adjacentes à articulação implicada e quando associadas à neoplasia de mama surgiram na cicatriz da mastectomia.1,2
A patogênese da doença permanece desconhecida,4 porém esses achados sugerem que a migração de histiócitos pela reação inflamatória adjacente pode ser a chave para patogênese da doença. Requena et al. postularam que a histiocitose intravascular resultaria de linfangiectasia ou obstrução linfática por dano congênito ou adquirido por trauma, cirurgia, radiação ou infecções.2,5,6 Outra hipótese seria que a resposta inflamatória crônica levaria à estase e diminuição do clareamento de antígenos com disfunção imune e estimularia maior proliferação e agregação de histiócitos nos vasos linfáticos. O papel do TNF alfa também tem sido levantado na patogênese da doença, pela associação com artrite reumatoide e a outras desordens associadas a histiócitos, como reticulo‐histiocitose multicêntrica e dermatite granulomatosa intersticial.1,3 Os achados histopatológicos consistem em agregados de histiócitos CD68+ no interior de vasos linfáticos dilatados, identificados por podoplanina+, na derme papilar e reticular. O diagnóstico diferencial histopatológico com angioendoteliomatose reativa é controverso e alguns autores consideram as duas entidades como espectros diferentes do mesmo fenômeno, em que a presença de histiócitos intraluminais levaria a organização de microtrombos e proliferação endotelial.2,7 O carcinoma metastático telangiectático de mama é uma forma rara de metástase cutânea de neoplasia de mama, que se caracteriza pelo surgimento de manchas eritematosas com telangiectasias ou pela presença de linfangiomas circunscritos. À histopatologia apresenta proliferação intravascular de células tumorais que, apresentam à imuno‐histoquímica marcadores de estrógenos e progestágenos positivos, levaram a ectasia dos capilares dérmicos.8,9
O curso da histiocitose intravascular é crônico e de difícil tratamento. Nos casos secundários, é necessário o tratamento da doença de base. Em casos associados a próteses metálicas, alguns pacientes evoluíram para cura clínica após troca da prótese.1,2,10 Existem relatos de tratamento com infliximab, metotrexato, terapia compressiva, pentoxifilina, radioterapia, corticosteroides e tacrolimus tópicos com respostas variáveis e recidivas frequentes.1,2 O caso relatado apresentou quadro disseminado exuberante e possível associação com prótese mamária de silicone pelo início nas mamas, relação essa nunca citada na literatura.
Suporte financeiroNenhum.
Contribuição dos autoresYasmin Gama Abuawad: Concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; revisão crítica da literatura.
Ticiana de Andrade Castelo Branco Diniz: Concepção e planejamento do estudo; obtenção, análise e interpretação dos dados; revisão crítica da literatura.
Priscila Kakizaki: Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.
Neusa Yuriko Sakai Valente: Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.
Conflitos de interesseNenhum.
Como citar este artigo: Abuawad YG, Diniz TACB, Kakizaki P, Valente NYS. Intravascular histiocytosis: case report of a rare disease probably associated with silicone breast implant. An Bras Dermatol. 2020;95:347–50.
Trabalho realizado no Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil.