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Vol. 96. Núm. 2.
Páginas 224-227 (1 março 2021)
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Vol. 96. Núm. 2.
Páginas 224-227 (1 março 2021)
Dermatologia Tropical/Infectoparasitária
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Efeitos adversos da poliquimioterapia para hanseníase em 13 anos de acompanhamento em Hospital Universitário
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Violeta Duarte Tortellya,
Autor para correspondência
violetatortelly@yahoo.com.br

Autor para correspondência.
, Egon Luiz Daxbacherb, Arles Martins Brotasa, Sueli Carneiroa,b
a Departamento de Dermatologia, Hospital Universitário Pedro Ernesto, Rio de Janeiro, RJ, Brasil
b Departamento de Dermatologia, Instituto Endocrinologia Diabetes, Rio de Janeiro, RJ, Brasil
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Estatísticas
Tabelas (3)
Tabela 1. Características dos 196 pacientes em tratamento de hanseníase acompanhados no hospital
Tabela 2. Características dos 56 pacientes que apresentaram efeitos adversos
Tabela 3. Efeitos adversos, respectivas substâncias causadoras e ocorrência de suspensão
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Resumo

A hanseníase está entre as doenças negligenciadas no mundo, e o Brasil é o segundo país com mais casos. Foi realizado estudo retrospectivo a partir dos prontuários de 196 pacientes com hanseníase diagnosticados em 13 anos em um hospital universitário. O objetivo foi descrever os efeitos adversos mais frequentes da poliquimioterapia e as populações mais vulneráveis a eles. No estudo, a dapsona foi a substância mais implicada, principalmente em mulheres, e o risco aumentou com a idade. Concluímos que nesse perfil de pacientes deve‐se ter maior vigilância quanto aos possíveis efeitos adversos, sobretudo a anemia.

Palavras‐chave:
Clofazimina
Dapsona
Hanseníase
Rifampicina
Texto Completo
Introdução

A poliquimioterapia (PQT), recomendada pela Organização Mundial de Saúde, mudou drasticamente a história natural da hanseníase, reduzindo a prevalência e o desenvolvimento de resistência antimicrobiana.1 Uma coorte de 371 pacientes com hanseníase, acompanhados por 13 anos, identificou o perfil sociodemográfico e os efeitos adversos (EA) mais frequentes da PQT.

Métodos

Estudo retrospectivo, compreendendo o período de 2002 a 2014, com 371 pacientes com hanseníase, avaliou o perfil sociodemográfico e os EA da PQT padrão. Foram excluídos os pacientes paucibacilares (PB) e multibacilares (MB) que realizaram menos de quatro e nove doses supervisionadas, respectivamente, permanecendo no estudo 196 pacientes.

Resultados

Dos 196 pacientes, 97 eram homens, e 99 mulheres; 41,32% foram tratados com PQT‐PB, 53,05% com PQT‐MB e 5,61% com esquema alternativo (tabela 1). Foram relatados 61 EA em 56 pacientes, dos quais 64,28% (36) eram mulheres. Três pacientes tinham menos de 15 anos de idade; 12, mais de 70 anos; e 73,21% (41), entre 16 e 69 anos. Anemia hemolítica foi o EA mais frequente (73,20%), forma aguda (30,35%) e crônica (42,85%), dos quais 83,3% ocorreram em mulheres, principalmente com 45 anos ou mais (63,3%). A chance de um paciente com anemia ser do sexo feminino foi 2,14 vezes maior (OR = 2,14; 95% IC 1,14‐4,12). Síndrome sulfônica ocorreu em dois pacientes; metemoglobinemia, em um (tabela 2). Alterações gastrintestinais como anorexia, náuseas, vômitos, diarreia ou epigastralgia foram observadas em praticamente 20% dos pacientes, na maioria das vezes (72,2%) em decorrência de dapsona (DDS, diaminodifenil sulfona). Fotossensibilidade ocorreu em dois pacientes. A chance de um indivíduo ter EA aumentou com cada ano de idade (OR = 1,02; 95% IC 1,00‐1,04). Apesar disso, não houve associação entre o tipo de EA e a idade.

Tabela 1.

Características dos 196 pacientes em tratamento de hanseníase acompanhados no hospital

Características  Número  Porcentagem (%) 
Gênero
Masculino  97  49,0 
Feminino  99  51,0 
Raça
Branco  84  42,9 
Negro  42  21,4 
Amarelo  0,5 
Pardo  64  32,7 
Indígena 
Ignorada  2,5 
Idade (anos)
11‐20  24  18,05 
21‐30  33  24,81 
31‐40  34  25,57 
41‐50  13  9,77 
51‐ 60  11  8,27 
61‐70  3,76 
> 70  13  9,77 
Forma clínica
Indeterminada  17  8,67 
Tuberculose  61  31,12 
Bordeline  55  28,06 
Virchowiana  60  30,61 
Não classificada  1,51 
Educação
Analfabeto  4,6 
Ensino Fundamental  90  45,9 
Ensino Médio incompleto  30  15,3 
Ensino Médio completo  28  14,3 
Ensino Superior incompleto  2,6 
Ensino Superior completo  12  6,1 
Ignorado  19  9,7 
Não aplicável  1,5 
Baciloscopia
Positiva  80  40,8 
Negativa  94  48,0 
Não realizada  19  9,7 
Ignorada  1,5 
Tratamento inicial
PQT‐PB  81  41,32 
PQT‐MB  104  53,06 
Alternativo  11  0,51 
TOTAL  196  100% 

PQT‐MB, poliquimioterapia multibacilar; PQT‐PB, poliquimioterapia paucibacilar.

Tabela 2.

Características dos 56 pacientes que apresentaram efeitos adversos

Características  Número  (%) 
Gênero
Masculino  20  35,71 
Feminino  36  64,29 
Raça
Branco  27  48,21 
Negro  14,29 
Amarelo  1,79 
Pardo  18  32,14 
Indígena 
Ignorado  3,57 
Idade
00‐15  5,36 
16‐45  22  39,28 
46‐69  19  33,93 
≥ 70  12  21,43 
Forma clínica
Indeterminado  10,71 
Tuberculose  15  26,79 
Borderline  21  37,50 
Virchowiano  13  23,21 
Não classificado  1,79 
Escolaridade
Analfabeto  1,79 
Até 4ª série  12  21,43 
4ª série completa  5,36 
5ª a 8ª incompleta  8,93 
8ª completa (1° grau)  1,79 
1° a 3° ano incompleto  10  17,85 
1° a 3° ano completo (2° grau)  10  17,85 
Ensino Superior incompleto  1,79 
Ensino Superior completo  10,71 
Ignorado  8,93 
Não se aplica  3,57 
Baciloscopia
Positiva  20  35,71 
Negativa  30  53,58 
Não realizada  10,71 
Dose do efeito adverso
Primeira  19  33,93 
Segunda  16,07 
Terceira  16,07 
Quarta  10,71 
Quinta ou mais  13  23,21 
Tratamento Inicial
PQT‐PB  21  37,50 
PQT‐MB  35  62,50 
TOTAL  56  100 

PQT‐MB, poliquimoterapia multibacilar; PQT‐PB, poliquimioterapia paucibacilar.

A maioria dos EA ocorreu nas primeiras doses supervisionadas – 33,92% na primeira e 76,78% até a quarta dose (tabela 2). A DDS foi a substância mais implicada, correspondendo a 96,7% dos EA (59/61), e foi substituída em quase metade dos casos (49,15%). A rifampicina (RFP) isoladamente representou 3,27% dos EA e foi suspensa em apenas um paciente, por cefaleia refratária. Trombocitopenia leve ocorreu em três pacientes que faziam uso de RFP+DDS. Alguns pacientes tiveram mais de um EA (tabela 3).

Tabela 3.

Efeitos adversos, respectivas substâncias causadoras e ocorrência de suspensão

Efeito adverso por dapsona  Suspensão da dapsona 
Anemia hemolítica crônica  24  11 
Anemia hemolítica aguda  17  12 
Fotossensibilidade/fotodermatite 
Meta‐hemoglobinemia 
Manifestação gastrintestinal 
Síndrome de hipersensibilidade a dapsona 
Efeito adverso por rifampicina  Suspensão da rifampicina 
Manifestação gastrintestinal 
Cefaleia 
Efeito adverso por clofazimina e dapsona  Suspensão da dapsona ou clofazimina 
Manifestação gastrintestinal 
Efeito adverso por rifampicina e dapsona  Suspensão da dapsona ou rifampicina 
Plaquetopenia 
Total de efeitos adversos  61  30 
Discussão

Dos 196 pacientes acompanhados, verificou‐se uma chance de 64% de os pacientes em tratamento com MB serem do sexo masculino. Nobre et al. reportaram duas vezes mais MB em homens (OR = 2,36; 95% IC 2,33‐2,38).2 Metade dos pacientes tinha entre 20 e 40 anos. Dados da literatura mostram que os EA podem ocorrer em até metade dos pacientes (45%) em tratamento com PQT; neste estudo, ocorreu em menos de 30%.3–5

Embora mais de 25% (n = 56) dos pacientes tenham sofrido algum EA, o medicamento foi substituído em 30 dos 185 casos que iniciaram o regime padrão. Mais de dois terços dos EA ocorreram nos primeiros quatro meses do tratamento, e a DDS foi a medicação mais envolvida, conforme relatos da literatura.5 EA hematológicos ocorreram em quase três quartos dos pacientes e têm sido relacionados à capacidade individual de acetilação e hidroxilação das sulfaminas (DDS). Indivíduos com hemoglobinopatias, deficiência G6PD e aqueles que recebem medicamentos oxidativos podem apresentar maior risco de anemia hemolítica.6 Fotoalergia pela DDS levou à descontinuação da substância em dois casos.

A ocorrência de EA em mulheres foi duas vezes maior, corroborando os achados de Dupnik sobre a associação do sexo feminino ao risco aumentado de reação a substâncias.7 Genes da G6PD estão no cromossomo X, e algumas mutações levam mulheres com deficiência parcial a desenvolver sintomas.8 Neste estudo, foi demonstrado que mulheres com mais de 45 anos de idade têm maior risco de EA, diferente de Dupnik, que o encontrou em mulheres mais novas.7

A chance de um indivíduo ter EA para ambos os sexos aumenta a cada ano de idade (OR = 1,02; 95% IC 1,00‐1,04). A metabolização mais lenta nos pacientes mais velhos justificaria esse achado.9 Goulart et al. também encontraram um risco aumentado de efeitos hematológicos em pacientes mais velhos.3 Síndrome sulfônica, embora grave, é infrequente e ocorreu em 1,53% dos casos, o que está de acordo com a literatura.3,5,10 As queixas gastrintestinais melhoraram com orientações sobre a ingestão concomitante a alimentos e/ou uso de antieméticos, não necessitando suspensão da medicação.

Conclusão

A DDS foi responsável pelo maior número de casos de EA, principalmente no primeiro trimestre de tratamento. Anemia foi o EA mais frequente, principalmente em mulheres. O risco de EA aumenta a cada ano de idade. Esses achados reforçam a necessidade de maior vigilância no início do tratamento nas mulheres e em pacientes com idade mais elevada.

Suporte financeiro

Nenhum.

Contribuição dos autores

Violeta Duarte Tortelly: Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Egon Luiz Daxbacher: Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; participação efetiva na orientação da pesquisa; revisão crítica da literatura.

Arles Martins Brotas: Aprovação da versão final do manuscrito; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Sueli Carneiro: Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; revisão crítica do manuscrito.

Conflito de interesses

Nenhum.

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Como citar este artigo: Tortelly VD, Daxbacher EL, Brotas AM, Carneiro S. Adverse effects of polychemotherapy for leprosy in 13 years of follow‐up at a university hospital. An Bras Dermatol. 2021;96:224–7.

Trabalho realizado no Hospital Universitário Pedro Ernesto, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.

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