A neurofibromatose tipo 1 (NF1) é doença genética rara com ampla gama de manifestações clínicas, principalmente características neurocutâneas, que podem levar a consequências emocionais e físicas.
ObjetivosEste estudo avaliou a influência de fatores sociodemográficos e características clínicas da doença na qualidade de vida de indivíduos brasileiros com NF1.
MétodosTrata‐se de estudo transversal e descritivo. Os dados foram coletados de 101 indivíduos com NF1 por meio da versão brasileira do questionário Impacto da Neurofibromatose tipo 1 na Qualidade de Vida (INF1‐QoL), formulário com informações sobre características sociodemográficas e escala de autoavaliação da visibilidade da NF1. As relações entre as variáveis foram avaliadas por meio de testes estatísticos, e o nível de significância foi definido como 0,05.
ResultadosO estudo incluiu 101 adultos com NF1 com idades entre 18 e 59 anos, com média de idade de 35,54 anos (± 9,63) e predomínio do sexo feminino (n=84; 83,17%). A média do escore total do INF1‐QoL foi de 10,62 (± 5,63), com mediana de 10, valor mínimo de 0 e máximo de 31 pontos. Duas características dos participantes foram significantemente associadas à qualidade de vida: escolaridade (p=0,003) e história familiar de NF1 (p=0,019). Houve correlação estatisticamente significante entre o escore do INF1‐QoL e o grau de visibilidade da doença (rho=0,218; p=0,028).
Limitações do estudoEstudo transversal, realizado com amostra de conveniência e utilizando medidas autorreferidas.
ConclusõesOs resultados apoiam o impacto significante da NF1 na qualidade de vida. Os autores recomendam acompanhamento multidisciplinar dos pacientes, com adesão aos cuidados clínicos antecipados, controle adequado da dor, assistência psicológica e aconselhamento genético.
A neurofibromatose tipo 1 (NF1) é doença genética rara que afeta múltiplos sistemas orgânicos, caracterizada por ampla gama de manifestações clínicas, principalmente características neurocutâneas.1 A doença afeta igualmente ambos os sexos e sua prevalência foi estimada em 1 em 2.000 a 4.000 indivíduos.2
Os achados comuns da NF1 incluem máculas de coloração café‐com‐leite, hamartomas melanocíticos na íris conhecidos como nódulos de Lisch, neurofibromas cutâneos, sardas nas dobras cutâneas, neurofibromas plexiformes, glioma da via óptica, anomalias ósseas, endocrinológicas e neurológicas, dificuldades de aprendizagem e problemas comportamentais. Clinicamente, a expressão fenotípica é altamente variável.3 Quase todos os indivíduos apresentam pequenos tumores cutâneos benignos que aumentam em número e se tornam mais visíveis com a idade. Aproximadamente 30% dos adultos apresentam neurofibromas plexiformes visíveis, enquanto 20% apresentam neurofibromas plexiformes internos detectáveis apenas por exames de imagem.4
O NF1 é um gene supressor de tumor que codifica uma proteína chamada neurofibromina, que regula a via RAS. A neurofibromina é abundantemente expressa em neurônios, oligodendrócitos e células de Schwann.1 Indivíduos com NF1 apresentam risco cumulativo para neoplasias malignas de 20% a 39% aos 50 anos, com risco de câncer ao longo da vida de aproximadamente 60%.1 O risco aumentado de desenvolver câncer ao longo da vida levou à pesquisa de terapias que inibem o crescimento do tumor.3
A visibilidade das doenças cutâneas pode levar a graves sofrimentos psicológicos e carga social. Em indivíduos com NF1, a visibilidade da doença está intimamente relacionada a morbidades psiquiátricas, como ansiedade e depressão, e prejudica a qualidade de vida.4–8 A gravidade da doença e a dor interferem na funcionalidade pessoal e também estão associadas à qualidade de vida prejudicada.7–11 Em 2017, um grupo de pesquisadores do Reino Unido criou o Impact of NF1 on Quality of Life Questionnaire (INF1‐QoL), adequado como ferramenta de avaliação no ambiente clínico, além de ser medida de desfechos relatados pelo paciente em ensaios clínicos e intervenções terapêuticas. É um questionário de 14 perguntas com respostas cuja pontuação varia de 0 a 3. O questionário tem escore potencial máximo de 42; escores mais altos indicam maior impacto na qualidade de vida. A versão original em inglês do INF1‐QoL é um questionário validado, confiável e específico da doença que se correlaciona moderadamente com sua gravidade.10 O questionário INF1‐QoL foi adaptado e validado no contexto brasileiro e está disponível para profissionais que cuidam desses pacientes.11
Este estudo teve como objetivo avaliar a influência de fatores sociodemográficos e da visibilidade da doença na qualidade de vida de indivíduos brasileiros com NF1 por meio do questionário INF1‐QoL.
Materiais e métodosDesenho do estudo e considerações éticasTrata‐se de estudo transversal descritivo, desenvolvido após aprovação do Comitê de Conformidade Ética em Pesquisas Envolvendo Seres Humanos da Universidade Federal de São Carlos. Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido antes de fornecer os dados. Este estudo segue as recomendações do Strengthening the Reporting of Observational Studies in Epidemiology (STROBE).12
Amostragem e coleta de dadosO estudo foi realizado com amostra de conveniência13 de 101 indivíduos com NF1 recrutados por meio de redes sociais na internet. Os convites para participar do estudo foram compartilhados com grupos brasileiros do Facebook de pessoas com NF1. Os critérios de inclusão dos indivíduos foram: 1) idade >18 anos; 2) diagnóstico médico de NF1; 3) ser brasileiro; e 4) estar acessível e interessado na participação em pesquisas.
A coleta de dados foi realizada por meio de formulário online de autorrelato, no período de outubro de 2021 a janeiro de 2022. Os instrumentos de coleta de dados foram a versão brasileira do INF1‐QoL,11 que está disponível em https://doi.org/10.6084/m9.figshare.19617162.v1, um questionário com informações sobre características sociodemográficas preparado para este estudo (Apêndice S1, Informações de Apoio) e uma escala de autoavaliação da visibilidade da NF1 adaptada da escala de Ablon.14 A escala de Ablon é baseada na aparência de uma pessoa completamente vestida e na facilidade com que sinais físicos, como manchas café‐com‐leite, tumores no pescoço ou no rosto, ou mancar perceptivelmente, podem ser percebidos em interações impessoais.14 Os autores desenvolveram e validaram uma escala para autoavaliação da visibilidade da NF1 composta por oito questões sim/não, permitindo classificar a visibilidade da NF1 em grau 1 (leve), grau 2 (moderada) ou grau 3 (grave), de acordo com o resultado das respostas.15
Análise de dadosForam realizadas análises descritivas das características pessoais e clínicas dos participantes e dos escores do INF1‐QoL.
A confiabilidade do INF1‐QoL foi avaliada em termos de consistência interna por meio do índice alfa de Cronbach, e valores ≥ 0,70 foram considerados adequados.16
A normalidade da variável qualidade de vida, mensurada pelo escore total do INF1‐QoL, foi verificada pelo teste de Kolmogorov‐Smirnov com correção de Lilliefors. Como foi rejeitada a normalidade da variável qualidade de vida (D=0,1169; p=0,0017), foram utilizados métodos estatísticos não paramétricos.
A diferença dos escores de qualidade de vida em relação aos fatores sociodemográficos e clínicos foi analisada pelos testes de Mann‐Whitney ou Kruskal‐Wallis com pós‐teste de Dunn, de acordo com o número de grupos em cada variável.
A correlação de Spearman foi utilizada para verificar o grau de correlação binária entre a qualidade de vida e o grau de visibilidade da NF1. A intensidade do coeficiente de correlação (rho) foi estabelecida como correlação fraca entre 0 e 0,3, correlação moderada entre >0,3 e 0,6, e correlação forte >0,6.
As análises estatísticas foram realizadas utilizando o software JASP 0.16.3.0 (https://jasp‐stats.org),17 e um valor de p<0,05 foi considerado estatisticamente significante.
ResultadosOs participantes eram provenientes de 15 estados diferentes do país, com predomínio dos estados de São Paulo (n=40; 39,60%), Minas Gerais (n=12; 11,89%) e Paraná (n=8; 7,92%). A idade variou de 18 a 59 anos, com média de 35,54 anos (± 9,63), e eram em sua maioria do gênero feminino (n=84; 83,17%). A tabela 1 apresenta as informações sociodemográficas dos participantes.
Características sociodemográficas e de visibilidade da doença em indivíduos com NF1 (n=101)
Características | n (%) |
---|---|
Gênero | |
Feminino | 84 (83,17) |
Masculino | 17 (16,83) |
Idade (anos) | |
18–25 | 17 (16,83) |
> 25–30 | 14 (13,86) |
>30–35 | 18 (17,82) |
>35–59 | 52 (51,49) |
Estado civil | |
Solteiro(a) | 60 (59,41) |
Casado(a) ou união estável | 39 (36,61) |
Divorciado(a) | 2 (1,98) |
Nível de escolaridade | |
Ensino Fundamental incompleto | 2 (1,98) |
Ensino Fundamental completo | 1 (1) |
Ensino Médio incompleto | 7 (6,93) |
Ensino Médio completo | 27 (26,73) |
Curso Técnico Profissionalizante | 7 (6,93) |
Ensino Superior incompleto ou completo | 40 (39,60) |
Pós‐graduação | 17 (16,83) |
Número de filhos | |
Nenhum | 61 (60,40) |
1 | 20 (19,80) |
2 | 12 (11,88) |
≥ 3 | 8 (7,92) |
História familiar de NF1 | |
Não | 54 (53,47) |
Sim, pais com NF1 | 19 (18,81) |
Sim, filhos com NF1 | 19 (18,81) |
Sim, outros parentes com NF1 | 9 (8,91) |
Visibilidade da NF1 | |
Grau 1 | 28 (27,72) |
Grau 2 | 20 (19,80) |
Grau 3 | 53 (52,48) |
A média do escore total do INF1‐QoL foi de 10,62 (±5,63; IC 95% 9,51–11,73), com mediana de 10 (IC 95% 9,0–11,0), valor mínimo de 0 e máximo de 31 pontos. A figura 1 mostra os resultados do escore total do INF1‐QoL entre os participantes, enquanto a figura 2 apresenta o diagrama de frequência das respostas aos 14 itens do INF1‐QoL.
O índice alfa de Cronbach para o INF1‐QoL total foi de 0,8009, com valores variando de 0,7535 a 0,7963 para cada pergunta do questionário (tabela S1, Informações de Apoio).
A tabela 2 mostra outras relações entre variáveis sociodemográficas e clínicas e o escore do INF1‐QoL. Houve diferença significante na média do escore total do INF1‐QoL de acordo com o nível de escolaridade (p=0,003). Quanto a isso, o grupo “ensino fundamental incompleto/completo ou ensino médio incompleto” diferiu do grupo “ensino médio completo” (18,40±6,57 vs. 10,07±5,25, p<0,001), “curso técnico profissionalizante” (18,40±6,57 vs. 10,86±3,44, p=0,030), grupos “ensino superior incompleto/completo” (18,40±6,57 vs. 9,48±4,62, p<0,001) e “pós‐graduação” (18,40±6,57 vs. 9,53±5,43, p<0,001).
Distribuição dos escores da INF1‐QoL de acordo com as variáveis sociodemográficas e clínicas (n=101)
Variáveis | n | Escore da INF1‐QoL | p‐valora | ||
---|---|---|---|---|---|
Média | DP | Mediana | |||
Gênero | |||||
Feminino | 84 | 10,23 | 5,25 | 10 | 0,177 |
Masculino | 17 | 12,59 | 7,08 | 12 | |
Idade (anos) | |||||
18–25 | 17 | 9,06 | 5,36 | 10 | 0,471 |
>25–30 | 14 | 9,43 | 4,65 | 7,5 | |
>30–35 | 18 | 11,72 | 5,49 | 11 | |
>35–59 | 51 | 11,08 | 5,97 | 10 | |
Estado civil | |||||
Casado(a) ou união estável | 39 | 10 | 6,11 | 9 | 0,301 |
Solteiro(a)/Divorciado(a) | 62 | 11,02 | 5,32 | 10,5 | |
Nível de escolaridade | |||||
Ensino Fundamental incompleto/completo ou Ensino Médio incompleto | 10 | 18,40 | 6,57 | 17 | 0,003c |
Ensino Médio Completo | 27 | 10,07 | 5,25 | 10 | |
Curso Técnico Profissionalizante | 7 | 10,86 | 3,44 | 12 | |
Ensino Superior Incompleto/completo | 40 | 9,48 | 4,62 | 9 | |
Pós‐graduação | 17 | 9,53 | 5,43 | 8 | |
Número de filhos | |||||
Nenhum | 61 | 9,92 | 4,94 | 10 | 0,212 |
1 | 20 | 10,70 | 5,12 | 10 | |
2 | 12 | 14,42 | 7,43 | 12,5 | |
≥ 3 | 8 | 10,13 | 7,47 | 10 | |
História familiar de NF1 | |||||
Não | 54 | 11,67 | 5,61 | 11 | 0,019b |
Sim | 47 | 9,43 | 5,46 | 9 | |
Visibilidade da NF1 | |||||
Grau 1 | 28 | 9,11 | 5,48 | 9 | 0,088 |
Grau 2 | 20 | 9,85 | 5,20 | 9 | |
Grau 3 | 53 | 11,72 | 5,72 | 11 |
Além disso, indivíduos com história familiar positiva de NF1 apresentaram menores escores de INF1‐QoL e, portanto, menor impacto na qualidade de vida (11,67±5,61 vs. 9,43±5,46, p=0,019).
Embora não tenha havido diferença significante no escore médio do INF1‐QoL de acordo com o grau de visibilidade da doença (p=0,088), o escore do INF1‐QoL apresentou fraca correlação com o grau de visibilidade da doença (rho=0,218; p=0,028), indicando que quanto mais visível a doença, pior a qualidade de vida.
DiscussãoEm relação à qualidade de vida dos indivíduos com NF1, a pergunta do INF1‐QoL que obteve maior escore foi a de número 13, que questiona sobre o efeito da NF1 no papel e na perspectiva de vida (p. ex., carreira, confiança, relacionamentos, cuidar da família, ter filhos, medo de transmitir NF1 aos filhos). Esses resultados são consistentes com os do questionário original em inglês, em que o escore mais alto também foi obtido para a mesma pergunta.10 Os autores acreditam que o prejuízo no papel e na perspectiva de vida está intimamente relacionado a sentimentos de incerteza em relação à doença, como relatado em pesquisas qualitativas anteriores.5,6,18 Há duas principais dimensões nas quais a incerteza tipicamente associada à NF1 impacta aqueles que vivem com a doença. A primeira dimensão diz respeito à progressão da doença. Isso já foi mencionado entre adultos de todas as idades e graus de gravidade da doença, e muitas vezes a ansiedade sobre o que pode acontecer no futuro é maior do que os sintomas atuais. O aspecto mais preocupante é a possibilidade de crescimento dos neurofibromas em tamanho ou número, bem como a possibilidade de desenvolver câncer. Uma segunda dimensão está relacionada com o planejamento familiar. A ansiedade e a incerteza sobre doenças hereditárias, como a NF1, podem levar a um comportamento interpretado como “responsabilidade genética”,18 no qual os indivíduos às vezes decidem não ter filhos para evitar a perpetração da condição genética nas gerações futuras.5,6,18 Essas questões podem estar relacionadas ao fato de que mais da metade da amostra do presente estudo era composta por indivíduos solteiros.
A segunda pergunta com maior escore do INF1‐QV foi a 14, que aborda depressão e ansiedade, seguida das questões 3 e 4, que abordam dor física. Esses achados são consistentes com estudos que mostraram que dor física, ansiedade e depressão foram os principais fatores afetados na vida daqueles com a doença,8,19,20 e sugeriram avaliação da dor e depressão na rotina de avaliações de pacientes com NF1.8
A etiologia da dor na NF1 não é totalmente conhecida. Estudos de modelos de NF1 em ratos destacaram a CRMP2 (collapsin response mediator protein 2), uma fosfoproteína intracelular predominantemente expressa no sistema nervoso durante o desenvolvimento e envolvida na orientação e crescimento do axônio, como fator‐chave no desenvolvimento da dor na NF1.21 Os tratamentos atuais direcionados especificamente à dor na NF1 são escassos e, na maioria das vezes, os pacientes são tratados com medicamentos de venda livre e cirurgia para remoção de neurofibromas dolorosos, nenhum dos quais resulta na atenuação completa da dor na NF1. Além disso, a dor é sintoma subjetivo, e uma abordagem biopsicossocial pode proporcionar maior benefício no alívio da queixa.22 Vale ressaltar que são necessários estudos sobre as diferenças de gênero envolvidas na dor na NF1, uma vez que Crawford et al. demonstraram efeito maior da dor na NF1 no humor em mulheres com NF1.5 Indivíduos com dor na NF1 têm barreiras para obter tratamento abrangente e específico para a dor, incluindo a dificuldade de acesso a serviços médicos e a disponibilidade limitada de profissionais treinados com conhecimento específico da doença.23 O controle adequado da dor é fundamental, pois a dor não aliviada gera sofrimento psicológico e emocional, além de prejudicar o sono, as atividades sociais e as funções cognitivas.8,22 A compreensão da dor no contexto da NF1 irá melhorar o atendimento clínico e aumentará a qualidade de vida dos pacientes com NF1.
A relação anteriormente prevista entre visibilidade e qualidade de vida4–8 foi confirmada no presente estudo. A maioria dos participantes identificou‐se como grau 3 na escala de autoavaliação de visibilidade, muito provavelmente porque aqueles com apresentações clínicas mais graves estavam mais interessados em participar de pesquisas e compreender sua doença. Embora a distribuição do escore médio de qualidade de vida não tenha diferido substancialmente entre pacientes com graus de visibilidade da doença 1, 2 ou 3, foi encontrada tendência de associação entre aumento da visibilidade da NF1 e pior qualidade de vida. No estudo britânico, os escores do INFI‐QoL correlacionaram‐se moderadamente com a gravidade clínica da doença.10
A associação positiva revelada nos resultados do presente estudo entre escolaridade e qualidade de vida já era esperada. As consequências do nível educacional na qualidade de vida são complexas e abrangem inúmeras áreas e dimensões da vida. De acordo com Edgerton et al., existem três principais formas implícitas pelas quais a educação pode melhorar a qualidade de vida de uma pessoa: a) adquirir conhecimentos e competências analíticas que possam ser usados para direcionar o comportamento dos indivíduos; b) mudar as preferências dos indivíduos de modo a permitir‐lhes reorientar seus valores ou prioridades em geral; e c) reduzir restrições e criar oportunidades.24 Vale ressaltar que não é possível estimar a contribuição dos problemas de aprendizagem, que são frequentes na NF1, para a dificuldade de preenchimento do formulário da pesquisa, o que pode estar relacionado à pequena participação de indivíduos com ensino fundamental neste estudo.
A história familiar foi inesperadamente associada aos escores do INF1‐QoL. Quando uma doença é hereditária, as experiências da família são transmitidas de geração a geração.25,26 Os autores acreditam que pode ser mais fácil compreender e aceitar os sintomas da NF1 quando outros membros da família são afetados pela mesma condição. Além disso, pode ocorrer maior conscientização em relação aos cuidados de saúde e aos direitos legais relacionados com a doença, o que pode reduzir alguns desafios práticos da vida das pessoas afetadas.
Este estudo tem algumas limitações. Primeiro, é um estudo transversal e, portanto, não aborda relação de causa e efeito. Um estudo longitudinal com seguimento ajudaria a esclarecer a natureza das associações encontradas no presente estudo. Em segundo lugar, a coleta de dados foi realizada por medidas autorreferidas. Os participantes do estudo foram recrutados entre indivíduos que receberam diagnóstico médico de NF1 e que, como resultado, participavam de comunidades virtuais sobre a doença. Os autores confiaram nas informações dos participantes sobre sua doença. Além disso, todos os participantes preencheram a escala de autoavaliação da visibilidade da NF1, o que permitiu classificá‐los quanto ao grau de visibilidade da doença e confirmou que todos apresentavam manchas café‐com‐leite. Assim, a pesquisa foi realizada com amostra de conveniência, sem dúvida com viés, representando pessoas com acesso à internet e redes sociais, o que dificulta a generalização dos resultados do presente estudo. Houve predomínio de participantes femininas, talvez por terem maior probabilidade de preencher o formulário.
ConclusãoOs resultados deste estudo corroboram o impacto significante da NF1 na qualidade de vida. Para cuidado integral à saúde dos indivíduos afetados, os autores sugerem seguimento por equipe multidisciplinar com adesão aos cuidados clínicos antecipados para identificar precocemente as principais complicações da doença e oferecer tratamento oportuno. O controle adequado da dor é fundamental, pois a dor não aliviada gera ansiedade e estresse físico e emocional, além de prejudicar o sono, as atividades sociais e as funções cognitivas.
Além disso, o aconselhamento genético pode ajudar no ajuste de papéis e perspectivas de vida, além de apoiar decisões sobre o futuro reprodutivo. Os prestadores de cuidados de saúde devem estar conscientes do possível impacto da doença no sofrimento psicológico e na carga social, e assistência psicológica deve ser prestada aos pacientes sempre que indicado.
Suporte financeiroEste estudo foi financiado em parte pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior ‐ Brasil (CAPES) ‐ Código de Financiamento 001.
Contribuição dos autoresNatália P. Bicudo: Concepção e planejamento do estudo; obtenção, análise e interpretação dos dados; análise estatística; elaboração e redação do manuscrito; revisão crítica do manuscrito; aprovação da versão final do manuscrito.
Carla M. R. Germano: Análise e interpretação dos dados; revisão crítica do manuscrito; aprovação da versão final do manuscrito.
Roberta T. de Moraes: Análise e interpretação dos dados; revisão crítica do manuscrito; aprovação da versão final do manuscrito.
Lucimar R. S. de Avó: Análise e interpretação dos dados; revisão crítica do manuscrito; aprovação da versão final do manuscrito.
Rosalie E. Ferner: Análise e interpretação dos dados; revisão crítica do manuscrito; aprovação da versão final do manuscrito.
Débora G. Melo: Concepção, planejamento e supervisão do estudo; análise e interpretação dos dados; análise estatística; edição do manuscrito; revisão crítica do manuscrito; aprovação da versão final do manuscrito.
Conflito de interessesNenhum.
Os autores gostariam de agradecer ao Dermatology Information System (DermIS) pela permissão para utilizar as imagens durante o desenvolvimento da pesquisa.
Como citar este artigo: Bicudo NP, Germano CMR, de Moraes RT, de Avó LRS, Ferner RE, Melo DG. Association of sociodemographic and clinical factors with the quality of life of Brazilian individuals with neurofibromatosis type 1: a cross‐sectional study. An Bras Dermatol. 2024;99:520–6.
Trabalho realizado no Departamento de Medicina, Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, SP, Brasil.