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Vol. 97. Issue 4.
Pages 513-515 (1 July 2022)
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Carta ‐ Caso clínico
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Hanseníase no estado do Amazonas: há realmente queda na incidência e prevalência?
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Dejanane Silva e Silvaa,b, Jamile Izan Lopes Palheta Júniora, Valderiza Lourenço Pedrosaa,b, Carolina Talharia,b,c,
Corresponding author
carolinatalhari@gmail.com

Autor para correspondência.
a Fundação Alfredo da Matta de Dermatologia e Venereologia, Departamento Dermatologia Tropical, Manaus, AM, Brasil
b Curso de Pós‐Graduação em Ciências Aplicadas à Dermatologia, Universidade do Estado do Amazonas, Manaus, AM, Brasil
c Departamento de Dermatologia, Universidade do Estado do Amazonas, Manaus, AM, Brasil
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Prezado Editor,

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a hanseníase constitui importante problema mundial de saúde pública. Em 2019 foram registrados 202.185 casos novos, com prevalência global de 0,22/10.000 habitantes. Entre os países com maior prevalência estão Índia, Brasil e Indonésia.1

No Brasil, em 2019, foram diagnosticados 23.612 casos novos. Naquele ano, verificou‐se taxa de detecção de 13,23/100.000. Em 1991, a OMS propôs a eliminação da hanseníase (menos de um doente para 10.000 habitantes) até 2005. O Brasil não atingiu essa meta e manteve o parâmetro de alta endemicidade. Em 2019, dentre os casos novos diagnosticados no país, 9,9% apresentavam incapacidade física grau 2 (G2). Outro aspecto também importante foi a taxa de detecção de casos novos em pacientes com menos de 15 anos de idade: 3,44/100.000 habitantes. Esses dados indicam baixa qualidade do programa de controle da hanseníase.1,2 As ações para o controle da hanseníase no Brasil incluem, principalmente, o diagnóstico de casos novos durante o atendimento de rotina nos centros de saúde, busca ativa e exame de contatos.3

Em 2018, o estado do Amazonas apresentou taxa de prevalência de hanseníase de 0,93/10.000 habitantes. No mesmo ano, foram diagnosticados 425 casos novos. Apesar da redução da taxa de detecção de 21,54 casos, em 2009, para 10,31/100.000, em 2018, o estado permanece com parâmetro de alta endemicidade. Em 2018, 9,2% dos novos pacientes apresentaram G2 no momento do diagnóstico, e a taxa de detecção de novos casos em menores de 15 anos foi de 4,19/100.000.3

O estado do Amazonas apresenta área territorial de 1.571.000 km2, e é dividido em 62 municípios. Em 2010, o estado tinha 3.483.985 habitantes e a capital, Manaus, concentrava 51,7% da população (1.802.014 habitantes). Na região metropolitana de Manaus (RMM), composta pelos municípios de Autazes, Careiro, Careiro da Várzea, Iranduba, Itacoatiara, Itapiranga, Manacapuru, Manaus, Manaquiri, Novo Airão, Presidente Figueiredo, Rio Preto da Eva e Silves, habitavam 2.210.665 (63,4%) pessoas. O estado conta cm 25 rodovias estaduais, distribuídas, principalmente, no entorno da RMM.4,5

A Fundação Alfredo da Matta (FUAM), em Manaus, é centro de referência para diagnóstico e tratamento da hanseníase no Amazonas. A FUAM promove ações regulares de supervisão da hanseníase e treinamento de profissionais da saúde na capital e demais municípios do estado. Essas atividades são realizadas por equipes compostas por dermatologista, enfermeiros, técnicos de enfermagem e/ou laboratório, dependendo da demanda do município e da necessidade de treinamentos específicos.6

No presente estudo foram avaliados os resultados das supervisões realizadas no período de março de 2012 a dezembro de 2017, com ênfase na detecção de casos novos diagnosticados pelas equipes da FUAM, comparando‐os com os pacientes notificados pelas unidades municipais de saúde.

Trata‐se de estudo retrospectivo e descritivo de casos novos de hanseníase diagnosticados no período da realização do estudo. Foram utilizados dados epidemiológicos do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN) e da Coordenação Estadual de Hanseníase. O estudo foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da FUAM.

Todos os municípios do estado foram visitados pelas equipes da FUAM, alguns anualmente e outros com intervalo superior a um ano. Em 2017, foram realizadas supervisões nos 62 municípios.

No período do estudo foram registrados 3.299 casos novos: 1.637 (49,6%) residiam na RMM e 1.662 (50,4%), nos outros municípios. Desse total, 1.910 (57,9%) pacientes eram multibacilares, 303 (9,2%) apresentaram G2 no momento do diagnóstico e 362 (11%) eram menores de 15 anos.

Durante as supervisões, 642 novos casos foram diagnosticados pelas equipes da FUAM. Esse número equivale a 19,5% do total de doentes registrados no período de realização do estudo; 293 (45,6%) residiam na RMM e 349 (54,4%) nos demais municípios.

Outro aspecto relevante da investigação: 1.143 (34,6%) dos novos casos moravam no município de Manaus e, dentre esses, 808 (70,7%) foram diagnosticados na sede da FUAM.

Os municípios que apresentaram as maiores taxas de detecção no período do estudo foram: Itamarati (81,25/100.000), Tapauá (76,65/100.000), Humaitá (61,05/100.000), Boca do Acre (45,25/100.000) e Guajará (40,70/100.000; fig. 1).

Figura 1.

Taxas de detecção de novos casos de hanseníase por regiões do Amazonas, 2012 e 2017.

(0.83MB).

Em 2017, ano em que todos os municípios foram supervisionados, foram diagnosticados 449 casos novos de hanseníase: 126 (28,1%) residiam no município de Manaus e 323 (71,9%), nos demais municípios. Naquele ano, as equipes da FUAM diagnosticaram 152 (33,8%) pacientes: 53 (42%) em Manaus e 99 (33,1%) nos demais municípios. Dentre os 126 casos novos residentes em Manaus, 101 (80,2%) foram diagnosticados na sede da FUAM.

Considerando a extensão territorial do estado e que na maior parte dos municípios do interior não há transporte rodoviário, seria possível inferir que os municípios da RMM teriam fácil acesso a pareceres do centro de referência e notificariam a maioria dos casos novos. No período do estudo, 1.637 (49,6%) casos de hanseníase residiam na RMM (tabela 1). No entanto, desse total, 293 (17,9%) pacientes foram diagnosticados durante as supervisões.

Tabela 1.

Casos novos de hanseníase detectados pelas equipes de saúde da FUAM e serviços de saúde municipais, no período de março de 2012 a dezembro de 2017, nos municípios da região metropolitana de Manaus

Municípios  Casos novos diagnosticados pela equipe FUAMCasos novos diagnosticados pelo MunicípioTotal 
  Número de casos  Porcentagem  Número de casos  Porcentagem   
Manaus  162  14,20%  981  85,80%  1.143 
Presidente Figueiredo  17%  39  83%  47 
Rio Preto da Eva  26,70%  11  73,30%  15 
Itacoatiara  10  7,30%  127  92,70%  137 
Manacapuru  12  16%  63  84%  75 
Itapiranga  14  100%  0,0%  14 
Manaquiri  19%  17  81%  21 
Iranduba  14  26,40%  39  73,60%  53 
Autazes  17  35,40%  31  67%  48 
Careiro da Várzea  15  65,20%  34,80%  23 
Careiro Castanho  11  35,50%  20  64,50%  31 
Novo Airão  54,50%  45,50%  11 
Silves  16  84,2%  15,8%  19 
Total geral  293    1.344    1.637 

Os dados de Manaus também são importantes: dentre os 1.143 (34,6%) novos casos diagnosticados no município, no período do estudo, 808 (70,7%) foram identificados na FUAM. Isso indica que os pacientes não procuram os centros de saúde da capital, não são diagnosticados nesses locais ou são sistematicamente encaminhados para a FUAM.

Quando se analisam de maneira isolada os dados mais recentes, de 2017, verifica‐se que não houve mudanças importantes no período de estudo, quando foram registrados 449 casos novos em todo o estado: 126 (28,1%) residiam em Manaus e 323 (71,9%), nos demais municípios. Desse total, 152 (33,8%) casos foram diagnosticados durante as supervisões. Verificou‐se, ainda, que mais de 80% dos casos novos que residiam em Manaus foram diagnosticados na FUAM.

Esses dados explicam, em parte, a baixa resolutividade do programa de controle da hanseníase, com diagnósticos tardios e importante número de casos novos em crianças. Diagnóstico tardio implica também em casos multibacilares sem diagnóstico, responsáveis pela manutenção da endemia.

Face aos dados apresentados, evidenciando que 642 (19,5%) casos novos de hanseníase não teriam sido diagnosticados sem a presença do dermatologista, sugere‐se avaliação das atividades do Programa de Controle da Hanseníase, com ênfase na capacitação dos profissionais de saúde da capital e municípios, bem como supervisões e atualizações regulares desses profissionais.

Suporte financeiro

Nenhum.

Contribuição dos autores

Dejanane Silva e Silva: Concepção e o desenho do estudo; levantamento dos dados, ou análise e interpretação dos dados; redação do artigo; revisão crítica do conteúdo intelectual; aprovação final da versão a ser enviada.

Jamile Izan Lopes Palheita Júnior: Concepção e o desenho do estudo; análise e interpretação dos dados; revisão crítica do conteúdo intelectual; aprovação final da versão a ser enviada.

Valderiza Lourenço Pedrosa: Análise e interpretação dos dados; revisão crítica do conteúdo intelectual; aprovação final da versão a ser enviada.

Carolina Talhari: Concepção e o desenho do estudo; análise e interpretação dos dados; redação do artigo; revisão crítica do conteúdo intelectual; aprovação final da versão a ser enviada.

Conflito de interesses

Nenhum.

Referências
[1]
who.int [Internet]. World Health Organization; 2022. Global leprosy (Hansen disease) update, 2019: time to step‐up prevention initiatives. Wkly Epidemiol Rec. 2020;36:417‐40. Available from: https://www.who.int/publications/i/item/who‐wer9536.
[2]
Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância das Doenças Transmissíveis. Diretrizes para vigilância, atenção e eliminação da hanseníase como problema de saúde pública. Ministério da Saúde [Internet]. 2016. [cited 2020 Jul 01]. Available from: https://www.saude.gov.br/images/pdf/2016/fevereiro/04/diretrizes‐eliminacao‐hanseniase‐4fev16‐web.pdf;.
[3]
Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância das Doenças Transmissíveis. Boletim Epidemiológico. Hanseníase. Ministério da Saúde [Internet]. 2020. [cited 2020 Jul 01]. Available from: http://www.aids.gov.br/pt‐br/pub/2020/boletim‐epidemiologico‐de‐hanseniase‐2020.
[4]
cidades.ibge [Internet]. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística ‐ IBGE | Cidades. [cited 2020 Jul 01]. Available from: https://cidades.ibge.gov.br/brasil/am/itamarati/panorama.
[5]
sedecti.am [Internet]. Departamento de Estudos Pesquisa e Informação da SEAP. Amazonas em Mapas. 2018. [cited 2020 Jul 01]. Available from: http://www.sedecti.am.gov.br/wp‐content/uploads/2019/07/2a_Amazonas_em_Mapas_2016_em_novembro_de_2018.pdf.
[6]
fuam.am [Internet]. Fundação Alfredo da Matta de Dermatologia e Venereologia. Situação epidemiológica da hanseníase na Fundação Alfredo da Matta de Dermatologia – 2018. [cited 2020 Jul 01]. Available from: http://www.fuam.am.gov.br/wp‐content/uploads/2014/05/Boletim_Epidemiologico_FUAM_2018.pdf.

Como citar este artigo: Silva DS, Palheta Júnior JIL, Pedrosa VL, Talhari C. Leprosy in the state of Amazonas: is there actually a decrease in its incidence and prevalence? An Bras Dermatol. 2022;97:513–5.

Trabalho realizado no Fundação Alfredo da Matta de Dermatologia e Venereologia, Manaus, AM, Brasil.

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