O lentigo maligno (LM) é um melanoma in situ de crescimento radial e lento, em que as células neoplásicas estão confinadas a epiderme e ao epitélio anexial, não ultrapassando a camada basal dessas estruturas.1 O LM representa 79 a 83% dos casos de melanoma in situ, acometendo principalmente áreas de intenso dano solar, preferencialmente cabeça e pescoço e com pico de incidência entre 65 e 80 anos, podendo tornar‐se invasivo em 5 a 15% dos casos.2,3
A análise histopatológica é o padrão ouro na confirmação diagnóstica do LM, com presença de elevado número de melanócitos atípicos na camada basal da epiderme e extensão perianexial associada à elastose solar e atrofia epidérmica, que mostram o intenso dano solar das áreas onde se originam essas lesões.3,4
Uma das dificuldades no tratamento do LM é delimitar a verdadeira extensão clínica e histopatológica da lesão, pois elas apresentam áreas de “salto”, ou seja, pode estender‐se além da margem clinicamente visível, tornando sua abordagem cirúrgica por vezes com margens equivocadas e/ou inestéticas. Além disso, a taxa de recidiva descrita na literatura, de acordo com o método utilizado para exérese da lesão e o tempo de seguimento pós‐tratamento, pode chegar a 50%.2,4,5
O imiquimode (IQ) é uma imidazoquinolina que age sobre os melanócitos atípicos presentes na epiderme induzindo uma resposta imune por meio de secreção de citocinas e resposta celular contra essas células tumorais, e vem sendo estudado como opção terapêutica menos invasiva no tratamento do LM.6,7
O uso tópico do IQ 5% aplicado seis vezes por semana por 10 a 12 semanas com tempo de 8 horas de ação do medicamento no local das lesões resulta na resolução clínica em 78% dos casos e histopatológica em 76%, com taxa de recorrência em média de 24,5%.3,6–8Com o objetivo de se aumentar a precisão diagnóstica e controle terapêutico do LM, principalmente após terapias alternativas menos invasivas, destaca‐se a utilização da microscopia confocal reflectante a laser (MRC), que é um exame não invasivo e que permite a visualização in vivo de estruturas e células cutâneas com resolução similar ao da histologia.3,9
A MRC apresenta sensibilidade de 85% e especificidade de 76% para o diagnóstico de LM.4 O aumento do número de melanócitos atípicos na junção dermoepidérmica, presença de células pagetoides e/ou células atípicas na epiderme, células dendríticas perifoliculares e células nucleadas na papila dérmica são critérios diagnósticos microscópicos do LM por meio da MRC.3,10
Esses dados estimularam o desenvolvimento de um estudo observacional descritivo com o objetivo de diagnosticar, conferir o resultado terapêutico e detectar precocemente possíveis recidivas, por meio da MRC, os casos de LM tratados com IQ 5% tópico no período de março de 2019 a julho de 2020.
Pacientes com diagnóstico de LM confirmado por exame histopatológico foram submetidos a 12 semanas de tratamento com IQ 5% em creme com aplicação diária, seis vezes por semana, e tempo de 8 horas de ação da medicação.
Foram obtidas imagens clínicas e dermatoscópicas das lesões utilizando‐se Iphone 10 acoplado ao Dermlite®; e imagens de MRC com o auxílio do Vivascope 1500®, antes, durante e 60 dias após o término da terapêutica. Imagens transversais 5 × 5mm da camada córnea, granulosa, espinhosa e derme superficial foram analisadas por dois dermatologistas com experiência na realização desta técnica. Adicionalmente a MRC será repetida a cada três meses no primeiro ano de seguimento para diagnóstico precoce de possíveis recidivas.
Foram selecionados seis pacientes para estudo com diagnóstico anatomopatológico de LM. Os pacientes pertenciam ao fototipo II a III pela classificação de Fitzpactrick's, com antecedente de exposição solar intensa prévia, média de idade de 75 anos. As regiões acometidas pelas lesões foram face em três casos (50%), dorso, um caso (16,7%) e couro cabeludo, dois casos (33,3%).
Ao exame dermatológico, evidenciou‐se presença de lesões acastanhadas irregulares em áreas fotoexpostas, com intenso dano solar e dermatoscopia com pseudorede atípica (fig. 1). A MRC mostrou presença de células pagetoides atípicas na epiderme e células dendríticas atípicas perifoliculares, com perda da estrutura da epiderme (fig. 2).
Dos seis pacientes selecionados, cinco completaram 12 semanas de tratamento com IQ5% e um perdeu seguimento com oito semanas de tratamento. Após 60 dias do término do tratamento com IQ 5%, quatro pacientes foram submetidos à realização de MRC e um paciente está em programação de realização da MRC pós‐tratamento. Ao exame dermatológico pós‐tratamento, é possível notar evidência de cura clínica e dermatoscópica das lesões (fig. 3); ao exame de MRC, ausência de células pagetoides e/ou atípicas na epiderme, ausência de células dendríticas perifoliculares com epiderme preservada (fig. 4).
Antes de participar do estudo, um dos pacientes havia sido submetido a três sessões de crioterapia para tratamento de LM no couro cabeludo, apresentando resolução clínica e dermatoscópica da lesão. Após quatro meses da última sessão de crioterapia ocorreu recidiva da lesão, diagnosticada por meio de MRC, com aparecimento de células dendríticas atípicas perifoliculares em áreas clínica e dermatoscopicamente curadas. O paciente então foi submetido a tratamento com IQ por 12 semanas; realizada MRC pós‐tratamento, com resolução do quadro.
Neste estudo foi possível notar precocemente, pela MRC, a presença de áreas recidivadas de LM que estavam clinicamente e dermatoscopicamente curadas.
Este estudo é um trabalho em progresso; os dados sugerem a utilização da MRC como ferramenta no controle terapêutico e seguimento do LM tratado pelo IQ. LM afetam em sua maioria idosos; apresentam‐se como lesões extensas de difícil delimitação clínica, em áreas como face e pescoço, o que pode resultar em dificuldades na abordagem cirúrgica, com prejuízo estético ao paciente. Por tratar‐se de uma lesão in situ, permite a realização de tratamentos menos invasivos e MRC está mostrando ser uma ferramenta prática de extrema utilidade no controle terapêutico e diagnóstico precoce de possíveis recidivas. Melhores conclusões serão possíveis com seguimento mais longo e inclusão de mais casos. Essa comunicação prévia também é um convite a outros autores para que façam observações semelhantes.
Suporte financeiroNenhum.
Contribuição dos autoresPriscila Ishioka: Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.
Lilian Lemos Costa: Aprovação da versão final do manuscrito; elaboração e redação do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.
Marcus Maia: Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.
Conflito de interessesNenhum.
Como citar este artigo: Ishioka P, Costa LL, Maia M. Practical application of laser reflectance confocal microscopy in the follow‐up of patients with lentigo maligna undergoing treatment with Imiquimod. An Bras Dermatol. 2022;97:520–2.
Trabalho realizado no Ambulatório de Oncologia da Dermatologia do Departamento de Clínica Médica da Irmandade da Santa Casa de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil.