O vitiligo é doença da pele na qual há perda do pigmento melânico em áreas de pele normal. Pode estar associada à dermatite atópica (DA) em decorrência da presença de resposta inflamatória anormal.1
Os autores relatam dois casos de associação entre DA e vitiligo antes dos 12 anos de idade.
Caso 1 ‐ Uma menina de 11 anos, saudável, acometida por DA desde os dois anos de idade foi tratada com corticosteroides tópicos e emolientes com bons resultados, apresentando posteriormente áreas irregularmente hipopigmentadas nos locais previamente acometidos pela DA (fig. 1).
Lesões semelhantes apareceram em outros locais flexurais e na face, especialmente na área perioral, que também foi afetada. A menina tinha histórico familiar de tireoidite de Hashimoto. Ao exame clínico, as áreas eram caracterizadas por pequenas máculas com bordas limpas, distribuicão irregular e diferentes graus de hipo ou despigmentacão. Todas as lesões apareceram após a resolução das lesões de DA, nos mesmos locais. Além disso, nenhuma mácula hipopigmentada ocorreu fora das áreas previamente afetadas pela DA.
O exame com lâmpada de Wood mostrou emissão nitidamente demarcada de fluorescência azul‐esbranquiçada brilhante (fig. 2), sugerindo diagnóstico de vitiligo.
As lesões eczematosas iniciaram aos 4 anos de idade e afetam as áreas corporais típicas de DA, incluindo face e dobras da pele. As áreas de vitiligo são diferentes e bem definidas. A menina tinha antecedentes familiares positivos para atopia, em particular rinoconjuntivite e asma, e apresentava também alguns nevos halo desde os 3 anos de idade. O diagnóstico de vitiligo foi realizado por um dermatologista aos 4 anos de idade, embora nenhum histórico pessoal de DA tivesse sido relatado pelos cuidadores da menina antes dos 6 anos de idade.
Caso 2 ‐ Uma menina de 6 anos acometida por vitiligo generalizado, precedido pelo aparecimento de nevos halo, veio à consulta em decorrência do aparecimento de lesões eczematosas em áreas corporais típicas de DA (fig. 3). Foi realizado o diagnóstico clínico de DA.
Os casos apresentam algumas diferenças: o Caso 1 foi desafiador, pois as lesões de vitiligo eram sutis e pouco visíveis, afetando os locais típicos de DA. À primeira vista, elas podem se assemelhar a áreas de hipopigmentação pós‐inflamatória. O exame com lâmpada de Wood foi essencial para o diagnóstico de vitiligo. No Caso 2, DA e vitiligo acometeram diferentes áreas do corpo, ambos facilmente reconhecíveis. A presença de nevos halo ajudou no diagnóstico.
A associação entre DA e vitiligo é conhecida. Uma metanálise de 2015, que incluiu 16 estudos realizados em adultos, observou que o vitiligo de início precoce era fator de risco para o desenvolvimento de DA, em comparação com o vitiligo de início tardio.2,3
Poucos estudos se concentraram no risco de vitiligo em pacientes com DA. OR entre 1,52 e 1,71 foi relatada em adultos jovens e adolescentes. Em metanálise de 2019, OR mais alta foi encontrada em adultos (4,46) em comparação com crianças (2,83).2,4
Não está claro se a DA mais provavelmente precede ou sucede o início do vitiligo, nem se uma dessas duas doenças desencadeia a outra. Nenhum estudo controlado foi realizado em crianças menores de 12 anos ou crianças pré‐púberes, nas quais a DA é frequente, enquanto doenças autoimunes como o vitiligo apresentam pico de incidência por volta da segunda e terceira décadas de vida.1 Os fatores de risco do vitiligo são: histórico familiar de doenças autoimunes e fatores desencadeantes como traumas, queimaduras na pele, gravidez, doenças sistêmicas. O fenômeno isomórfico de Koebner (FK) foi relatado em 20% a 60% dos pacientes com vitiligo, especialmente antes dos 12 anos de idade.5
No Caso 1, o FK pode não ter causado diretamente o vitiligo, mas o promoveu, em decorrência da sinergia entre o efeito pró‐inflamatório da DA e o ato de coçar.
A associação entre DA e doenças autoimunes tem sido relacionada a genes/loci de suscetibilidade que influenciam a resposta imune inata e a função das células T.1 A DA e o vitiligo compartilham algumas interleucinas; além disso, ambos respondem aos inibidores da via JAK‐STAT.1 Além disso, o mecanismo autoimune também foi implicado na DA: especialmente durante a infância. O ato de coçar e a disfunção da barreira podem favorecer a entrada de antígenos externos, que compartilham sequências homólogas com proteínas humanas e podem induzir IgE sérica autorreativa.2
Os autores acreditam que, por meio do FK, a DA pediátrica possa antecipar o aparecimento do vitiligo em crianças com fatores de risco.
Suporte financeiroNenhum.
Contribuição dos autoresGiulia Maria Ravaioli: Aprovação da versão final do manuscrito; revisão crítica da literatura; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica; manejo dos casos estudados; elaboração e redação do manuscrito; análise estatística; concepção e planejamento do estudo.
Annalisa Patrizi: Aprovação da versão final do manuscrito; revisão crítica da literatura; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica; manejo dos casos estudados; revisão crítica do manuscrito; elaboração e redação do manuscrito; análise estatística; concepção e planejamento do estudo.
Iria Neri: Aprovação da versão final do manuscrito; revisão crítica da literatura; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica; manejo dos casos estudados; revisão crítica do manuscrito; análise estatística.
Conflito de interessesNenhum.