Lemos com interesse o artigo da Drª. Otsuka et al., em que utilizaram técnica de amostragem periférica de incisão paralela das margens cirúrgicas laterais e profundas de carcinomas cutâneos (basocelular e espinocelular). Além disso, validaram a concordância da identificação do comprometimento de margens com posterior análise das peças em parafina.1 Gostaríamos de parabenizar os autores e tecer comentários referentes ao método, sua validação e conclusões sobre a taxa de recorrência.
Incentivamos o estudo de técnicas operatórias em cirurgia micrográfica, assim como no processamento das peças, que possam levar a procedimentos eficazes, mais rápidos, de menor custo e morbidade. Inicialmente, para fins de desambiguação, cabe observar que a técnica utilizada pelos autores é idêntica ao método de Tübingen, uma das modalidades mais empregadas na Europa.2
Quando analisados, metanaliticamente, os resultados de 10.424 carcinomas basocelulares operados por cirurgia micrográfica, as diferentes técnicas de cirurgia micrográfica não mostram diferenças globais nas taxas de recorrência entre si (1% a 3%), apesar de não haver estudos comparativos paralelos que possam explorar suas particularidades. Os tumores primários apresentam taxa de recorrência que varia de 1% a 3%, e os recidivados, 2% a 5%.3,4
Interessantemente, margens falso‐negativas podem ocorrer em tumores descontínuos (como CBCs multicêntricos), com áreas delgadas (p. ex., tumores com invasão perineural), recidivas sob retalhos/enxertos e problemas técnicos da confecção das lâminas. Por outro lado, margens falso‐positivas podem ocorrer pela confusão com secções transversais de bulbos foliculares, em decorrência do infiltrado inflamatório, ou no desgaste inicial das peças no criostato, necessário para a confecção das lâminas. Por essa razão, a validação da coincidência das margens cirúrgicas em parafina, como empregado no trabalho de Otsuka et al., pode não ser verossímil, pois pode superestimar o comprometimento das margens, visto que as secções mais externas foram realizadas e analisadas previamente no intraoperatório, em cortes mais espessos que nas secções em parafina.
Ao analisarmos, separadamente, as recorrências descritas pelos autores para os carcinomas basocelulares primários (0,3%) e os recidivados (4,3%), constatamos que houve suplementação do tratamento cirúrgico com radioterapia em 97% dos casos, o que é pouco usual, especialmente para os carcinomas basocelulares (80% da amostra), visto o emprego de uma técnica cirúrgica que verifica 100% das margens cirúrgicas cujo objetivo é a cura completa e a prevenção de recorrências. Apesar de a literatura dispor de publicações que sugiram a radioterapia exclusiva como opção de tratamento para CBCs, com bons resultados e controle local de até 96% dos casos, ainda se fazem necessários estudos de efetividade de radioterapia adjuvante na prevenção de recorrências em cirurgias micrográficas.5 Nesse ínterim, a taxa de recorrência encontrada pelos autores não pode ser imputada apenas à técnica cirúrgica, mas da combinação entre a cirurgia micrográfica e a complementação radioterápica.
Por fim, a conclusão das cirurgias micrográficas com apenas um estágio em 72% dos casos instiga a discussão de critérios de indicação, a fim de maximizar o custo‐benefício em detrimento da cirurgia oncológica convencional, visto esta ser mais acessível tanto tecnicamente quanto financeiramente para os sistemas de saúde.
Suporte financeiroNenhum.
Contribuição dos autoresLuiz Eduardo Fabrício de Melo Garbers: Concepção do estudo; escrita do texto; revisão e aprovação do texto final.
Ana Carolina Miola: Concepção do estudo; escrita do texto; revisão e aprovação do texto final.
Luis Fernando Figueiredo Kopke: Concepção do estudo; escrita do texto; revisão e aprovação do texto final.
Hélio Amante Miot: Concepção do estudo; escrita do texto; revisão e aprovação do texto final.
Conflito de interessesNenhum.
Como citar este artigo: Garbers LEFM, Miola AC, Kopke LFF, Miot HA. On the recurrence rate of cutaneous tumors treated exclusively by micrographic surgery. An Bras Dermatol. 2023;98:436–7.
Trabalho realizado no Departamento de Dermatologia, Faculdade de Medicina, Universidade Estadual Paulista, Botucatu, SP, Brasil.