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Vol. 96. Núm. 1.
Páginas 64-67 (1 janeiro 2020)
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Páginas 64-67 (1 janeiro 2020)
Caso Clínico
Open Access
Melanoma na orelha – série de quatro casos
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Lara Martins Fiorio
Autor para correspondência
laramfiorio@gmail.com

Autor para correspondência.
, Lucia Martins Diniz, Karla Spelta, Bruna Anjos Badaró
Hospital Universitário Cassiano Antônio de Moraes, Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória, ES, Brasil
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Resumo

O melanoma da orelha externa é raro, e seu diagnóstico e tratamento precoces são definidores na sobrevida do paciente. Relata‐se quatro casos clínicos, enfatizando a importância do exame clínico rotineiro das orelhas na consulta dermatológica. Pacientes homens e mulheres, de 60 a 81 anos, apresentando lesões melanocíticas na orelha externa, avaliados com exame físico minucioso e dermatoscópico, levando à identificação de lesões sugestivas de melanoma. Os casos foram tratados cirurgicamente com excisão da lesão, e os diagnósticos foram confirmados por estudo histopatológico. A abordagem terapêutica foi instituída precocemente, e a maioria dos casos foi diagnosticada em estágio inicial, o que impacta diretamente na sobrevida global.

Palavras‐chave:
Melanoma
Orelha
Prognóstico
Texto Completo
Introdução

O melanoma da orelha externa (MOE) é raro – corresponde a 1%‐4% dos melanomas cutâneos com incidência de 76.380 casos em 2016 nos Estados Unidos. Preferencialmente, acomete indivíduos na sexta década de vida, com predomínio em homens brancos, na hélice auricular, pelo subtipo extensivo superficial.1,2 O diagnóstico em estágios iniciais impacta diretamente na sobrevida dos pacientes. Não há consenso sobre o tratamento em razão da falta de protocolos específicos; no entanto, existe tendência à abordagem cirúrgica com margens de ressecção reduzidas.1

Relato do casoCaso 1

Paciente do sexo feminino, 60 anos de idade, branca, lavradora, portadora de xeroderma pigmentoso. Referia surgimento de neoplasias cutâneas desde a segunda década de vida, para as quais realizara múltiplos tratamentos cirúrgicos e não cirúrgicos. A paciente fazia acompanhamento clínico em consultas regulares, porém perdeu o seguimento e retomou após dois anos ausente. Ao exame dermatológico, apresentava mácula acastanhada com coloração irregular e dermatoscopia suspeita de melanoma no lóbulo auricular direito (fig. 1). A lesão foi completamente excisada com margem de segurança mínima; o exame histopatológico confirmou o diagnóstico de lentigo maligno melanoma, com espessura de Breslow de 1mm Ulceração, mitoses e invasão vascular não foram observados. Procedeu‐se à cirurgia de ampliação de margens tridimensionais de acordo com a espessura segundo Breslow. O tumor foi classificado como estádio IA. A paciente segue em acompanhamento.

Figura 1.

(A), Mancha pigmentada assimétrica, multicolorida e de contornos irregulares no lóbulo auricular direito. (B), Dermatoscopia sugestiva de melanoma lentigo maligno: área cinza‐azulada homogênea com estruturas romboidais (círculo branco); pigmentação das aberturas foliculares (setas vermelhas); círculo dentro de um círculo (setas amarelas).

(0.18MB).
Caso 2

Paciente do sexo masculino, 66 anos de idade, branco, gerente administrativo. Referia hipertensão, dislipidemia, diabetes e doença triarterial coronariana grave; procurou atendimento médico em decorrência do surgimento de tumoração friável na hélice da orelha esquerda havia três meses. O exame clínico e dermatoscópico da lesão foram sugestivos de melanoma nodular (fig. 2). O paciente foi prontamente submetido à auriculectomia parcial, com exérese total da lesão e preservação do pericôndrio e da cartilagem não acometidos pelo tumor. O estudo histopatológico confirmou melanoma invasor nodular, espessura de Breslow de 11mm, presença de ulceração e índice mitótico de 4mm2. Exame tomográfico revelou lesão infiltrativa localizada no subcutâneo próximo ao pavilhão auricular esquerdo, provavelmente correspondente à remanescente lesional, além de envolvimento linfonodal regional. Não havia evidência de doença metastática à distância. O tratamento cirúrgico do tumor primário com ampliação de margens e pesquisa de linfonodo sentinela foi inviabilizado em decorrência do alto risco cardiovascular do paciente. Indicou‐se radioterapia adjuvante para controle local. O tumor foi classificado como estádio IIIC; o paciente segue em acompanhamento há 10 meses, sem sinais de progressão da doença.

Figura 2.

(A), Tumoração exofítica eritemato‐violácea acometendo hélice da orelha esquerda, com presença de pápulas satélites confluentes. (B), Dermatoscopia sugestiva de melanoma nodular: véu branco‐azulado (círculo branco); padrão vascular atípico, com vasos lineares irregulares (setas vermelhas) e glóbulos vermelhos leitosos (seta branca); pontos e glóbulos irregulares de distribuição assimétrica (círculo amarelo).

(0.15MB).
Caso 3

Paciente do sexo masculino, 81 anos de idade, branco, motorista; notou surgimento de lesão pigmentada de limites irregulares, assimétrica, na hélice da orelha esquerda, de evolução havia um ano e seis meses, assintomática. Ao exame clínico e dermatoscópico, apresentava achados sugestivos de melanoma (fig. 3). Foi realizada biópsia excisional da lesão com margens de segurança mínima e preservação do pericôndrio não acometido pelo tumor. O histopatológico confirmou tratar‐se de melanoma subtipo extensivo superficial, com espessura de Breslow de 0,8mm Não foram observados ulceração, mitoses e invasão vascular. Em seguida, foi realizada cirurgia de ampliação de margens, de acordo com a espessura de Breslow. O paciente foi diagnosticado em estádio inicial (IA) e mantém acompanhamento clínico.

Figura 3.

(A), Lesão pigmentada, multicolorida, assimétrica, com áreas discretamente elevadas na hélice da orelha esquerda. (B), Dermatoscopia sugestiva de melanoma de disseminação superficial: véu branco‐azulado (seta vermelha); pontos e glóbulos irregulares (círculo branco); área com estruturas romboidais e pigmentação assimétrica dos óstios foliculares (círculo amarelo); área branca de despigmentação (seta branca).

(0.16MB).
Caso 4

Paciente do sexo masculino, 69 anos de idade, branco, agricultor; fazia seguimento dermatológico anual regular após ter excisado carcinoma espinocelular invasor em antebraço esquerdo havia seis anos. Em uma das consultas de avaliação, foi detectada mudança clínica e dermatoscópica de mancha pigmentada assimétrica presente no lóbulo da orelha direita, cujos achados encontrados eram suspeitos de melanoma (fig. 4). Foi realizada biópsia excisional com margem de segurança, e o histopatológico confirmou melanoma extensivo superficial, com espessura de Breslow de 0,2mm e presença de 1 mitose/mm2. Ulceração e invasão vascular não foram observadas. Em seguida, procedeu‐se a cirurgia de ampliação de margens de segurança em 1cm O tumor foi classificado em estádio inicial (IA), e o paciente mantém acompanhamento.

Figura 4.

(A), Mácula enegrecida, assimétrica, no lóbulo auricular direito. (B), Dermatoscopia sugestiva de melanoma de disseminação superficial: véu branco‐azulado (círculo branco), área homogênea com folículos pilosos obliterados e estrias irregulares (círculo amarelo); estruturas romboidais (seta vermelha); círculo dentro de círculo (círculo vermelho).

(0.15MB).
Discussão

O MOE representa 1% de todos os melanomas cutâneos primários. A idade média de diagnóstico do MOE é em torno da sexta década de vida, e há uma predominância significativa em indivíduos do sexo masculino (86,5%) e de pele clara.2 Especula‐se que cabelos compridos cobrindo o ouvido externo poderiam conferir efeito protetor, o que justifica a incidência reduzida de MOE em mulheres. Além disso, os homens tendem a exercer atividades profissionais mais expostas à radiação solar, conferindo assim maior risco ao sexo masculino.2 Nossa série de casos encontrou achados semelhantes ao da literatura – a mulher acometida é portadora de xeroderma pigmentoso e lavradora.

O MOE acomete predominantemente as regiões da hélice e lóbulos auriculares. Os subtipos mais comuns são o extensivo superficial (40,1%), seguido pelo lentigo maligno melanoma (33,7%) e pelo subtipo nodular (16,4%).2,3 O melanoma extensivo superficial atinge indivíduos entre 30‐40 anos e apresenta‐se clinicamente como uma mancha levemente elevada e multicolorida. O lentigo maligno melanoma tem pico de incidência entre a sexta e sétima décadas de vida, apresentando‐se como uma mancha de coloração irregular e acometendo áreas com intenso dano actínico. O melanoma nodular ocorre, em geral, na quinta década de vida, como lesão nodular ou placa elevada, e encerra prognóstico desfavorável.4

A dermatoscopia auxilia o diagnóstico, e alguns achados podem predizer a gravidade da lesão – como observado no caso 2, em que o achado padrão vascular atípico correlaciona‐se à invasão mais profunda do tumor no exame histopatológico.5 O diagnóstico da maioria dos MOE tende a ser precoce, com espessura de Breslow menor que 2mm em 75% dos pacientes.1 Idade avançada, maior espessura tumoral, presença de ulceração, acometimento linfonodal e metástase a distância são os principais preditores prognósticos, atuando cada um de maneira independente sobre a mortalidade, ao passo que a localização anatômica não tem impacto nos desfechos de recorrência tumoral e sobrevida.1,2

O tratamento do MOE não difere em relação aos demais melanomas cutâneos; no entanto, em razão da particularidade anatômica da região e da falta de protocolos cirúrgicos específicos, há uma tendência à excisão reduzida das margens de segurança e preservação de cartilagens e pericôndrio não acometidos pelo tumor.3

Diagnóstico e tratamento precoces dos MOE são definidores na sobrevida do paciente. É importante reforçar o papel preponderante do exame clínico rotineiro das orelhas nas consultas dermatológicas.

Suporte financeiro

Nenhum.

Contribuição dos autores

Lara Martins Fiorio: Concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; revisão crítica da literatura.

Lucia Martins Diniz: Concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; participação efetiva na orientação da pesquisa; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Karla Spelta: Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Bruna Anjos Badaró: Concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados.

Conflito de interesses

Nenhum.

Referências
[1]
N.L. Deep, A.E. Glasgow, E.B. Habermann, J.L. Kasperbauer, M.L. Carlson.
Melanoma of the external ear: A population‐based study.
Am J Otol., 38 (2017), pp. 309-315
[2]
T.D. Patel, O.Y. Chin, S. Baredes, J.A. Eloy, Y.M. Ying.
A population based analysis of melanoma of the external ear.
Otol Neurotol., 39 (2018), pp. e137-e142
[3]
F. Toia, G. Garbo, M. Tripoli, G. Rinaldi, F. Mochella, A. Cordova.
A systematic review on external ear melanoma.
J Plast Reconstr Aesthet Surg., 68 (2015), pp. 883-894
[4]
N.C. Fernandes, R. Calmon, J.P. Maceira, T. Cuzzi, C.S.C. Silva.
Cutaneous melanoma: prospective study of 65 cases.
An Bras Dermatol., 80 (2005), pp. 25-34
[5]
O. Yélamos, R.P. Braun, K. Liopyris, Z.J. Wolner, K. Kerl, P. Gerami, et al.
Usefulness of dermoscopy to improve the clinical and histopathologic diagnosis of skin cancers.
J Am Acad Dermatol., 80 (2019), pp. 365-377

Como citar este artigo: Fiorio LM, Diniz LM, Spelta K, Badaró BA. Ear melanoma: a four‐case series. An Bras Dermatol. 2021;96:64–7.

Trabalho realizado no Hospital Universitário Cassiano Antônio Moraes, Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória, ES, Brasil.

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