O melanoma acral (MA) é subtipo de melanoma com características próprias que ocorre nas regiões plantares, palmares e subungueais.1–3 Apresenta padrão de crescimento lentiginoso e é mais frequente em populações de fototipos mais altos, incluindo africanos, orientais e latino‐americanos. Apesar do comportamento indolente, o MA apresenta prognóstico ruim, em grande parte devido ao diagnóstico tardio, o que torna importante a constante educação do dermatologista sobre esse tumor.1–5 O tratamento do MA se baseia na retirada cirúrgica do tumor. Sua excisão é frequentemente um desafio ao cirurgião, uma vez que resulta em grandes defeitos cirúrgicos com difícil reconstrução. Uma técnica cirúrgica ótima nessas regiões deve obter bons resultados funcionais, cosméticos, pequeno tempo de cicatrização e baixa taxa de complicações.
Apresentamos dois casos que ilustram o que temos vivenciado em um centro de referência em São Paulo. Paciente do sexo feminino, 49 anos de idade, portadora de melanoma acral operado e reconstruído com realização de enxerto. Evoluiu com perda de parte do enxerto e intensa hipercromia local em toda área de pega do enxerto (fig. 1). O segundo caso é de paciente do sexo masculino, 60 anos de idade, diagnosticado com melanoma acral. Após exérese, foi optado por cicatrização por segunda intenção (CSI). Evoluiu sem intercorrências, com total recuperação cosmética e funcional após 12 semanas (figs. 2 e 3).
Clinicamente, o MA se apresenta como máculas ou nódulos na pele acral, podendo apresentar variações na coloração de marrom a preta e bordas irregulares. Por outro lado, lesões amelanóticas aparecem como máculas ou nódulos rosa‐avermelhadas, muitas vezes de difícil diagnóstico. Assim como os demais subtipos de melanoma, seu prognóstico é determinado principalmente pela espessura do Breslow no momento do diagnóstico, devendo ser realizada excisão cirúrgica em bloco com adequada margem de segurança, incluindo o tecido celular subcutâneo. Após a cirurgia, o defeito resultante pode ser reparado por meio de diversas técnicas, como fechamento primário, CSI, retalhos locais e livres,1,4 além de enxertos cutâneos – a localização exata da lesão, comorbidades, idade e estilo de vida do paciente devem ser considerados no reparo de lesões do pé.1,2
Defeitos situados nas regiões plantares são de difícil reparo, dado a baixíssima mobilidade do tecido nessa área. Ao mesmo tempo, devido ao característico crescimento lentiginoso desse tumor associado às margens de segurança empregadas no tratamento do melanoma, os defeitos cirúrgicos na cirurgia do MA raramente podem ser reconstruídos com fechamento primário – é necessário o uso de técnicas mais complexas.1,4
Muito embora os enxertos sejam frequentemente utilizados nas correções de lesões acrais, o intenso enegrecimento do enxerto na evolução do quadro é comum e desfavorável ao uso dessa técnica, não só por motivos estéticos, mas principalmente por comprometer o adequado seguimento clínico quanto a possíveis recorrências locais do tumor. Além disso, a localização plantar compromete a nutrição dos enxertos, os quais evoluem muitas vezes com necrose parcial ou até total.
Dentre os vários métodos de reparo, a CSI tem sido relatada como efetiva quando comparada aos enxertos, ainda que necessite de maior tempo de cicatrização.2,4 Sua indicação é adequada para áreas sujeitas a maior pressão, uma vez que o trauma inerente a esses locais tende a comprometer a viabilidade de enxertos e retalhos.4 Também podemos citar ótimos resultados cosméticos, uma vez que não evoluem com enegrecimento, facilitando muito o seguimento desses pacientes. Ainda, por não requerer coleta de área doadora, a CSI não deixa cicatrizes adicionais, ao passo que enxertos e retalhos o fazem.1,2 Como desvantagem, a CSI requer maior tempo de recuperação com mais visitas médicas.
Jung et al.2 evidenciaram que a CSI mostrou melhores resultados nas variantes analisadas, como infecções, seroma e necrose, se comparados aos pacientes submetidos a reparos com enxertos.2 Em nossa experiência, a CSI tem sido método prático, de baixo custo e improvável de apresentar complicações infecciosas.
Nesta carta, apresentamos dois exemplos de abordagens cirúrgicas possíveis no manejo do MA, evidenciando que, apesar de apresentar recuperação mais longa, a CSI confere mínima morbidade, baixa taxa de complicações, evoluindo com excelentes resultados2 tanto cosméticos quanto funcionais.1 A observação de boas evoluções motivou esse relato e a iniciativa de realizar um estudo prospectivo com mais casos demonstrando nossos achados. Assim, ressalta‐se que a abordagem por CSI deve ser considerada como ferramenta pelos cirurgiões no tratamento cirúrgico do MA.
Suporte financeiroNenhum.
Contribuição dos autoresLívia Mesquita Zyman: Aprovação da versão final do manuscrito; elaboração e redação do manuscrito; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.
José Antônio Jabur da Cunha: Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica do manuscrito.
Andrea Ortega Gimenez: Elaboração e redação do manuscrito.
Marcus Maia: Obtenção, análise e interpretação dos dados; revisão crítica do manuscrito.
Conflito de interessesNenhum.