A escabiose é ectoparasitose causada pelo ácaro Sarcoptes scabiei var. hominis, caracterizada clinicamente por lesões pruriginosas em localizações típicas, cuja forma crostosa é manifestação rara. O diagnóstico geralmente é estabelecido frente ao quadro clínico, porém a dermatoscopia pode ser um importante método complementar ao possibilitar a observação de estrutura triangular acastanhada em asa delta. Relata‐se caso de escabiose crostosa no qual a amplificação das imagens obtidas por dermatoscopia digital tornaram possível a demonstração de estrutura normalmente observada apenas com videodermatoscopia.
A escabiose é ectoparasitose causada pelo ácaro Sarcoptes scabiei var. hominis, cuja transmissão ocorre por contato interpessoal e, ocasionalmente, fômites.1,2 Caracteriza‐se clinicamente por pápulas eritematosas ou vesículas e túneis localizados nos espaços interdigitais, superfícies flexoras dos punhos, região umbilical e áreas flexurais.1
A forma crostosa é considerada apresentação rara; imunodepressão, déficits mentais e/ou motores são os principais fatores de risco.3 Manifesta‐se com lesões hiperceratóticas, fissuradas, crostosas ou eritrodermia, prurido variável e milhões de ácaros e é altamente contagiosa.1,4
O diagnóstico é geralmente estabelecido frente ao quadro clínico, porém pode ser complementado por dermatoscopia, videodermatoscopia ou microscopia confocal e confirmado por exame direto ou biópsia.1,2 Relata‐se caso de escabiose crostosa com ênfase nos achados dermatoscópicos.
Paciente do sexo feminino de 29 anos, indígena, apresentava havia oito meses pápulas eritematosas e placas liquenificadas, algumas hiperceratóticas, nas regiões acrais, flexurais e abdome, associadas a leve prurido (fig. 1). Foram feitas dermatoscopia com imersão, sob luz polarizada (10×, DermLite DL4, Califórnia, EUA) de lesão não escoriada no braço e captura da imagem por câmera fotográfica (12 Mp, iPhone 7, Apple Inc., Califórnia, EUA) com zoom óptico 2×, o que permitiu a observação das estruturas diplopoda‐símile e asa delta (fig. 2). Posteriormente, a amplificação da imagem demonstrou uma estrutura arredondada translúcida (fig. 3). O exame direto confirmou o diagnóstico de escabiose crostosa (fig. 4) e após o tratamento a paciente evoluiu com resolução das lesões.5
Demonstração das estruturas: (i) asa delta: porção anterior do corpo e patas dianteiras do ácaro; (ii) diplopoda‐símile: túnel escabiótico; (iii) arredondada translúcida: corpo do ácaro. (Dermatoscopia digital, 10× com imersão, sob luz polarizada, zoom óptico, 2× e amplificação da imagem).
A dermatoscopia tem sido bastante relatada nos últimos anos como auxiliar no diagnóstico da escabiose. Ela possibilita a observação de estrutura triangular acastanhada em asa delta correspondente à porção anterior do corpo e às patas dianteiras do ácaro e um túnel, que pode assumir uma conformação “diplopoda‐símile”.6 Na escabiose crostosa, há relatos de um padrão túnel sobre túnel, descrito como noodle pattern, que corresponde a túneis escavados por vários parasitas.7
A observação do corpo do ácaro é relatada ao se usar videodermatoscopia.2,8 Em 2016, Cinotti et al. compararam a amplificação de 20× e 70× e apenas observaram o corpo do ácaro no maior aumento.9
Entretanto, em 2019, Scanni demonstrou tal estrutura com a dermatoscopia digital, definida como aquisição e armazenamento de imagens obtidas pela dermatoscopia.10 Ele associou dermatoscopia (10×), zoom óptico da câmera fotográfica (3‐5×) e amplificação da imagem e demonstrou algumas estruturas que a compõem, o que definiu como The Mite‐Gallery Unit.10 Essa unidade é composta por cabeça, que corresponde ao ácaro com a estrutura em asa delta, corpo, que contém o túnel com ovos e fezes, e cauda, no fim do túnel composto por colaretes de queratina, observada apenas com a dermatoscopia sem imersão. Com a amplificação da imagem pode‐se ver também o corpo translúcido do ácaro com vários pontos escuros dispersos chamados ladybird sign.10 No presente relato, ao empregar essa técnica podem‐se demonstrar a imagem em asa delta, o corpo ovoide e o túnel.
Sabe‐se que na videodermatoscopia a observação do corpo do ácaro, ovos e fezes é obtida da melhor forma possível.2,8 Porém, quando indisponível, o uso da técnica descrita por Scanni e aplicada no presente relato pode possibilitar um diagnóstico de maior precisão da escabiose.
Suporte financeiroNenhum.
Contribuição dos autoresElaine Dias Melo: Concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura.
Carla Barros da Rocha Ribas: Aprovação da versão final do manuscrito; elaboração e redação do manuscrito; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica do manuscrito.
Isabel Cristina Lima Encarnação: Aprovação da versão final do manuscrito; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica do manuscrito.
Conflitos de interesseNenhum.
À Dr.ª Patrícia Motta de Morais, dermatopatologista que auxiliou no registro fotográfico do exame direto.