Compartilhar
Informação da revista
Vol. 96. Núm. 4.
Páginas 482-484 (1 julho 2021)
Compartilhar
Compartilhar
Baixar PDF
Mais opções do artigo
Visitas
14209
Vol. 96. Núm. 4.
Páginas 482-484 (1 julho 2021)
Dermatologia Tropical/Infectoparasitária
Open Access
Criptococose cutânea primária: o diagnóstico deve ser precoce
Visitas
14209
Cacilda da Silva Souza
Autor para correspondência
cssouza@fmrp.usp.br

Autor para correspondência.
, Maria Hideko Takada, Marcela Vendruscolo Ambiel, Viviane Tiemi Nakai
Divisão de Dermatologia, Departamento de Clínica Médica, Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto, São Paulo, Brasil
Este item recebeu

Under a Creative Commons license
Informação do artigo
Resume
Texto Completo
Bibliografia
Baixar PDF
Estatísticas
Figuras (2)
Resumo

As espécies do complexo Criptococcus neoformans apresentam distintos padrões epidemiológicos na infecção de indivíduos em condições de imunossupressão ou imunocompetência, e comum peculiaridade do tropismo para o sistema nervoso central. A criptococose cutânea primária é uma entidade clínica rara, com manifestações inicialmente restritas à pele por inoculação do fungo, e ausência de doença sistêmica. Relatamos aqui o caso de um homem de 61 anos de idade, imunocompetente, com tumoração mucoide de rápida evolução sobre escoriações em contato com dejetos de pássaros no antebraço. A precocidade do reconhecimento das manifestações cutâneas polimórficas e do tratamento são determinantes para o prognóstico favorável da infecção, que pode ser ameaçadora à vida.

Palavras‐chave:
Criptococose
Dermatopatias
Doenças fúngicas
Pele
Texto Completo

Na criptococose, infecção por leveduras encapsuladas, as espécies Cryptococcus neoformans var. grubii e C. neoformans var. neoformans são associadas ao hospedeiro imunocomprometido ou imunocompetente e hábitat de excretas de aves; e a espécie Cryptococcus gattii, ao hospedeiro imunocompetente e restos vegetais (Eucalyptus camaldulensis) de áreas tropicais e subtropicais.1–3

Seguido à inalação das leveduras, o acometimento pulmonar associado à meningoencefalite pode ocorrer em expressiva frequência dos casos; as manifestações cutâneas ocorrem em 10% a 15%, por disseminação hematogênica da infecção. Já a criptococose cutânea primária (CCP) é uma entidade rara, restrita inicialmente à pele, por inoculação direta do fungo, sem sinais da doença sistêmica.1–4 O quadro cutâneo, primário ou secundário, é polimórfico (pápulas, púrpuras, vesículas/bolhas, pústulas, nódulos, tumorações, ulcerações, paniculite/celulite necrotizante, abscessos similares à acne ou molusco contagioso) e pode postergar o diagnóstico e levar a desfechos desfavoráveis.1–7

A mortalidade, estimada em 10% nos países desenvolvidos, pode se elevar em quatro vezes em países como a Tailândia. Embora rara e de evolução favorável, a CCP pode ser ameaçadora à vida, particularmente em pacientes com doenças subjacentes ou imunocomprometimento, visto a possibilidade de disseminação e acometimento do sistema nervoso central (SNC).1–3,6

Relato do caso

Homem, 61 anos de idade, referia pápula pruriginosa e eritematosa no antebraço esquerdo havia 30 dias, que rapidamente progrediu para tumoração dolorosa, friável e de aspecto mucoide (fig. 1A). Notou‐se ausência de febre, queixas sistêmicas e linfonodomegalia, além da presença de escoriações nos antebraços por cuidados com pássaros. A hipótese de CCP e o início do antifúngico foram fundamentados na visualização de estruturas leveduriformes no micológico direto, que foram coradas por Grocott‐Gomori (fig. 2A) e mucicarmim de Mayer no anatomopatológico (fig. 2B); e no crescimento do Criptococcus neoformans na cultura. Sorologia para fungos, incluída criptococose, não foi reagente; ELISA para HIV, negativo; radiografia do tórax e análise liquórica, normais. O tratamento com fluconazol (400mg diários), intravenoso por 30 dias promoveu destacamento da placa mucoide e necrótica (fig. 1B) e foi seguido do uso oral por 11 meses com total re‐epitelização (fig. 1C).

Figura 1.

(A), Tumoração friável de aspecto mucoide. (B), Pós‐destacamento da placa mucoide e necrótica; (C), Cicatrização aos 120 dias.

(0.12MB).
Figura 2.

(A), Estruturas arredondadas coradas por metenamina prata de Grocott‐Gomori; (B), e mucicarmim de Mayer.

(0.29MB).

Os critérios para diagnóstico de CCP compreendem: restrição à manifestação cutânea sem evidências de doença sistêmica e cultura positiva para Cryptococcus spp.; além disso, lesão única ou confinada a uma área corporal descoberta (membros ou face), traumas prévios, escoriações, ulcerações ou lesões cutâneas preexistentes no sítio da infecção e exposição à fonte contaminada.2,4

Na revisão de 11 casos de CCP publicados do Brasil em hospedeiros imunocompetentes, notou‐se faixa etária elevada (média 70,91 anos), maioria de homens (81,82%), com trauma prévio e/ou exposição às fontes contaminadas (63,63%) do sítio das lesões, e tempo médio de 62,14 dias (15 a 210 dias) até o diagnóstico. Em comum, acometimento do antebraço, ulceração sobre placas ou nódulos, nodosidades e/ou tumorações de aspecto brilhante, mucoide ou secretivo (gelatinoso); prurido ao início (três casos), dor e necrose (dois casos), cura para a maioria, mas um óbito em paciente com cirrose e abuso de álcool.4–10

Sítio anatômico e estado imune do hospedeiro são definidores do tratamento. Para o manejo das manifestações menos usuais na população HIV negativa com sítio único de infecção, sem evidências de acometimento do SNC, fungemia ou imunossupressão, o fluconazol oral (6mg/kg/dia) por 6 a 12 meses tem sido recomendado.3

Visto que a manifestação cutânea possa preceder infecção disseminada, seu reconhecimento e as intervenções terapêuticas precoces são cruciais para redução de desfechos desfavoráveis.

Suporte financeiro

Nenhum.

Contribuição dos autores

Cacilda da Silva Souza: Concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica do caso estudado; revisão crítica da literatura.

Maria Hideko Takada: Aprovação da versão final do manuscrito; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica do caso estudado; revisão crítica do manuscrito.

Marcela Vendruscolo Ambiel: Aprovação da versão final do manuscrito; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica do caso estudado; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Viviane Tiemi Nakai: Aprovação da versão final do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Conflito de interesses

Nenhum.

Referências
[1]
E.K. Maziarz, J.R. Perfect.
Cryptococcosis.
Infect Dis Clin North Am, 30 (2016), pp. 179-206
[2]
J.C. Christianson, W. Engber, D. Andes.
Primary cutaneous cryptococcosis in immunocompetent and immunocompromised hosts.
Med Mycol., 41 (2003), pp. 177-188
[3]
J.R. Perfect, W.E. Dismukes, F. Dromer, D.L. Goldman, J.R. Graybill, R.J. Hamill, et al.
Clinical practice guidelines for the management of cryptococcal disease: 2010 update by the Infectious Diseases Society of America.
Clin Infect Dis., 50 (2010), pp. 291-322
[4]
S.A. Marques, I. Bastazini Jr., A.L.G.P. Martins, J.A. Barreto, M.P.B. D’Elia, J.C.L. Lastória, et al.
Primary cutaneous cryptococcosis in Brazil: report of 11 cases in immunocompetent and immunosuppressed patients.
Int J Dermatol., 51 (2012), pp. 780-784
[5]
C.S. Lacaz, E.M. Heins-Vaccari, G.L. Hernández-Arriagada, E.L. Martins, C.A.L. Prearo, S.M. Corim, et al.
Primary cutaneous cryptococcosis due to Cryptococcus neoformans var. gattii serotype B, in an immunocompetent patient.
Rev Inst Med Trop Sao Paulo., 44 (2002), pp. 225-228
[6]
A.V.C. França, M. Carneiro, K. dal Sasso, C. Souza Silva, A. Martinelli.
Cryptococcosis in cirrhotic patients.
[7]
C.A. Leão, K. Ferreira-Paim, L. Andrade-Silva, D.J. Mora, P.R. Silva, A.S. Machado, et al.
Primary cutaneous cryptococcosis caused by Cryptococcus gattii in an immunocompetent host.
Med Mycol., 49 (2011), pp. 352-355
[8]
N. Nasser, N. Nasser Filho, A.G. Vieira.
Primay cutaneous cryptococcosis in an immunocompetent patient.
An Bras Dermatol., 86 (2011), pp. 1178-1180
[9]
C.R. Pasa, M.R. Chang, G. Hans-Filho.
Post‐trauma primary cutaneous cryptococcosis in an immunocompetent host by Cryptococcus gattii VGII.
[10]
E. Nascimento, M.E.N.B. Silva, R. Martinez, K.M.R. von Zeska.
Primary cutaneous cryptococcosis in an immunocompetent patient due to Cryptococcus gattii molecular type VGI in Brazil: a case report and review of literature.
Mycoses., 57 (2014), pp. 442-447

Como citar este artigo: Silva Souza C, Takada MH, Ambiel MV, Nakai VT. Primary cutaneous cryptococcosis: the importance of early diagnosis. An Bras Dermatol. 2021;96:482–4.

Trabalho realizado na Divisão de Dermatologia, Departamento de Clínica Médica, Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto, SP, Brasil.

Copyright © 2021. Sociedade Brasileira de Dermatologia
Baixar PDF
Idiomas
Anais Brasileiros de Dermatologia (Portuguese)
Opções de artigo
Ferramentas
en pt
Cookies policy Política de cookies
To improve our services and products, we use "cookies" (own or third parties authorized) to show advertising related to client preferences through the analyses of navigation customer behavior. Continuing navigation will be considered as acceptance of this use. You can change the settings or obtain more information by clicking here. Utilizamos cookies próprios e de terceiros para melhorar nossos serviços e mostrar publicidade relacionada às suas preferências, analisando seus hábitos de navegação. Se continuar a navegar, consideramos que aceita o seu uso. Você pode alterar a configuração ou obter mais informações aqui.