Os autores apresentam caso clínico grave de complicações oftalmológicas relacionadas ao uso do ultrassom microfocado (UM) na região periocular e face. É de extrema importância o conhecimento sobre essa possível complicação na utilização do UM.
Trata‐se de paciente do sexo feminino de 50 anos de idade que procurou atendimento dermatológico para rejuvenescimento facial. Após avaliação, foi realizado UM na face e região periocular e carboxiterapia nas pálpebras. Não houve intercorrências durante o procedimento, e foi finalizado com aplicação de Cicaplast® na região palpebral. A paciente queixou‐se de turvação visual imediatamente após o procedimento, inicialmente atribuída ao uso do Cicaplast®. Nos dois dias após o procedimento, a paciente evoluiu com edema e eritema delimitados à região orbicular, manteve a turvação visual e começou a apresentar escotomas, lacrimejamento e, por fim, dor ocular. No terceiro dia houve piora do quadro oftalmológico; a paciente ficou impossibilitada de realizar atividades cotidianas em decorrência da turvação visual e da dor.
O oftalmologista constatou aumento importante da pressão ocular, retração da íris, áreas de fibrose (fig. 1) e atrofia no cristalino em formato de espículas. Estabeleceu‐se diagnóstico de com glaucoma agudo de ângulo fechado e catarata em formato de “espículas”.
Foi instituído tratamento com doses máximas dos colírios timolol, brimonidina, bimatoprosta e acetazolamida; entretanto, houve dificuldade na redução da pressão ocular e pouca melhoria dos sintomas. Ponderou‐se intervenção cirúrgica a fim de preservar o nervo óptico. Após seis meses de tratamento, a paciente apresentou remissão parcial dos sintomas, ainda em uso de colírios em dias alternados.
O UM é utilizado para tratamento de flacidez corporal, contorno e ancoragem muscular.1 Ele age emitindo ondas vibratórias que geram atrito molecular e calor, criando uma área de coagulação. Isso leva a um processo de cicatrização e retração tecidual (lifting).1,2 De acordo com a frequência vibratória, sua energia se concentra em determinada camada do sistema musculo‐aponeurótico superficial e promove o processo mencionado.1,3 Por isso, é importante ter atenção ao uso correto da técnica, que consiste em utilizar a ponteira adequada, respeitar o número de disparos preestabelecidos para cada área e, sobretudo, nunca apontar o transdutor em direção aos olhos, seja utilizado na região periocular ou facial.2,3
Casos semelhantes já foram observados, em que foram utilizados aparelhos de última geração e cursaram com alterações equivalentes, isto é, sintoma imediato ao procedimento, catarata em formato de “espículas” e glaucoma de difícil controle. Vale ressaltar que a paciente já havia realizado o mesmo procedimento antes, com aparelho mais antigo, sem complicações.
Em virtude desses significantes efeitos adversos, a Sociedade Brasileira de Glaucoma enviou carta em novembro de 2019 à Sociedade Brasileira de Dermatologia fazendo o devido alerta e destacando o achado peculiar que é o de catarata em “espícula”. É importante enfatizar que queixas oftalmológicas após procedimentos dermatológicos devem ser avaliadas por oftalmologista.4,5
Consideramos oportuna essa comunicação, para que sirva de alerta aos colegas a fim de que fiquemos mais atentos ao uso de novas tecnologias – neste caso, especificamente, para possíveis complicações oftalmológicas graves relacionadas ao uso do UM.5
Suporte financeiroNenhum.
Contribuição dos autoresMariana Marques Rechuan: Redação do manuscrito.
Jordana Cezar Vaz: Redação do manuscrito.
Fernanda de Azevedo Pereira Marques: Redação do manuscrito.
David Rubem Azulay: Redação do manuscrito; revisão crítica do manuscrito.
Conflito de interessesNenhum.
Como citar este artigo: Rechuan MM, Vaz JC, Marques FAP, Azulay RD. Ophthalmological complications related to the use of microfocused ultrasound in the periocular region and face. An Bras Dermatol. 2023;98:863–4.
Trabalho realizado no Instituto de Dermatologia Professor Rubem David Azulay, Santa Casa da Misericórdia do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.