O granuloma anular elastolítico de células gigantes é doença cutânea granulomatosa incomum que geralmente afeta a pele exposta ao sol. A alopecia não cicatricial é apresentação possível. Embora a histopatologia seja obrigatória para o diagnóstico, a dermatoscopia pode ajudar a restringir o diagnóstico clínico diferencial. Os autores relatam um caso de granuloma anular elastolítico de células gigantes no couro cabeludo de uma paciente adulta, mostrando múltiplos pontos foliculares amarelados/alaranjados sobre fundo eritemato‐esbranquiçado difuso à dermatoscopia.
Paciente do sexo feminino, 46 anos, com história de dois meses de aumento de placa alopécica frontal. Ela negou qualquer dor ou prurido. Ao exame físico, havia duas placas alopécicas rosadas confluentes, sem descamação, com borda eritematosa, na linha de implantação frontal dos cabelos, medindo 35×70mm e 40×60mm (fig. 1). A pele central sobrejacente apresentava‐se levemente atrófica. O couro cabeludo restante não mostrava diminuição na densidade capilar.
A dermatoscopia revelou óstios foliculares vazios, com fundo eritemato‐esbranquiçado difuso, vasos ramificados lineares finos não focalizados. Evidenciaram‐se também múltiplos pontos foliculares amarelados a alaranjados no centro da mancha alopécica, com alguns pelos finos pigmentados (fig. 2). Ao aplicar mais pressão com o dermoscópio, o fundo eritematoso ficou mais esbranquiçado, e os pontos alaranjados ficaram mais evidentes. Não foram observadas escamas ou alterações das hastes capilares. Embora a dermatoscopia da pele não afetada na linha de implantação fronto‐temporal dos cabelos também revelasse alguns pelos finos pigmentados e vasos lineares ramificados, não foram evidenciados pontos amarelos ou anisotricose (fig. 3). Foi realizada biópsia incisional. O exame histopatológico revelou adelgaçamentoa epitelial. A derme média e superior apresentava infiltrado granulomatoso com células gigantes multinucleadas, algumas delas com corpos asteroides intracitoplasmáticos, além de infiltrado linfoplasmocítico esparso (fig. 4). Não foi evidenciada necrose. A coloração de Verhoeff‐van Gieson mostrou fibras elásticas no citoplasma de células gigantes multinucleadas (fig. 5).
Os achados clínicos e histopatológicos foram compatíveis com granuloma anular elastolítico de células gigantes. A paciente foi inicialmente tratada com corticosteroide tópico de média potência, em combinação com pomada de tacrolimus 0,1%, com leve benefício. No seguimento de seis meses, foi realizado tratamento com corticoide intralesional na borda das lesões, com alguma melhora do eritema. Após seis meses de seguimento, o tamanho das lesões manteve‐se estável.
DiscussãoO granuloma anular elastolítico de células gigantes (GAECG) é uma doença cutânea granulomatosa incomum que geralmente afeta a pele exposta ao sol, mas também pode ocorrer em áreas protegidas.1 Está associada a alteração das fibras elásticas e elastofagocitose, resultando em apresentações clínicas variáveis.2 Ambos os sexos são afetados, mas há ligeira preponderância do sexo feminino. Manifesta‐se tipicamente como placas anulares com bordas eritematosas elevadas e um centro levemente atrófico e hipopigmentado. Alopecia não cicatricial foi relatada como sendo uma possível apresentação de GAECG.1
O diagnóstico pode ser difícil em razão das características clínicas semelhantes a outras dermatoses granulomatosas, como sarcoidose, granuloma anular clássico e necrobiose lipoídica.1 A histopatologia é a referência para o diagnóstico.1 O diagnóstico é feito com base na presença de inflamação granulomatosa, ausência de necrobiose e presença de células gigantes multinucleadas com mais de uma área de elastofagocitose na histopatologia.2 Além da forma anular, o granuloma elastolítico de células gigantes também pode ser classificado nas formas papular, reticular ou mista, de acordo com a apresentação clínica.2
A dermatoscopia das lesões pode ajudar a restringir o diagnóstico diferencial clínico. A característica dermatoscópica das dermatoses granulomatosas consiste em áreas laranja‐amareladas sem estrutura, distribuídas em um padrão focal ou difuso, em decorrência da presença do infiltrado granulomatoso na derme.3 Entretanto, os achados dermatoscópicos dessa doença em particular são escassos na literatura. Em nossa paciente, observamos fundo eritematoso com múltiplos óstios foliculares vazios, com pontos foliculares amarelados a alaranjados, na porção central da mancha. Não foi observada nenhuma descamação. Pontos amarelados/alaranjados foram relatados anteriormente na tricoscopia da sarcoidose do couro cabeludo, e os autores os associaram à presença de granulomas na derme superficial.4 A alopecia androgenética (AA) feminina pode se apresentar com pontos amarelos, mas a falta desses achados no couro cabeludo não afetado da presente paciente, juntamente com a ausência de anisotricose, tornam o diagnóstico de AA feminina improvável.
Esse laudo dermatoscópico de GAECG envolvendo a linha de implantação capilar amplia o diagnóstico diferencial de dermatoses do couro cabeludo com pontos amarelo‐alaranjados. Acredita‐se que possa representar uma pista para o diagnóstico dessa doença. Mais relatos são necessários para confirmar essas observações.
Suporte financeiroNenhum.
Contribuição dos autoresTiago Fernandes Gomes: Obtenção, análise e interpretação dos dados; revisão crítica da literatura; elaboração e redação do manuscrito
José Carlos Cardoso: Aprovação da versão final do manuscrito; obtenção, análise e interpretação de dados; revisão crítica do manuscrito.
Victoria Guiote: Aprovação da versão final do manuscrito; obtenção, análise e interpretação de dados; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica do manuscrito.
Conflito de interessesNenhum.