Psoríase é uma doença inflamatória crônica, com repercussão sistêmica e associada a comorbidades, como síndrome metabólica, doença cardiovascular e obesidade. Há maior prevalência de obesos em comparação com a população geral. A dieta é um fator ambiental relevante, visto que má nutrição, peso corporal inadequado e doenças metabólicas, além do risco direto à saúde, prejudicam o tratamento da psoríase.
ObjetivosAvaliar os padrões de consumo alimentar, aspectos antropométricos e aspectos relacionados à síndrome metabólica em pacientes com psoríase.
MétodosEstudo transversal por meio da avaliação antropométrica e questionário de frequência alimentar. Os itens do questionário de frequência alimentar foram avaliados por análise fatorial exploratória; os padrões alimentares identificados foram analisados por métodos multivariados.
ResultadosForam avaliados 94 pacientes, 57% do sexo feminino, média de 54,9 anos. A prevalência de obesidade foi de 48% e de síndrome metabólica, de 50%. A análise fatorial do questionário de frequência alimentar identificou dois padrões alimentares: Padrão 1 – predomínio de alimentos processados; Padrão 2 – predomínio de alimentos in natura. A análise multivariada revelou que os Padrões 1 e 2 apresentaram comportamentos inversos e a maior adesão à dieta 2 associou‐se ao sexo feminino, indivíduos eutróficos, ausência de alterações lipídicas e da pressão arterial, além de relação cintura‐quadril e atividade de doença cutânea menores.
Limitações do estudoEstudo monocêntrico feito em instituição pública, dependente da memória alimentar.
ConclusãoIdentificaram‐se dois padrões dietéticos em uma amostra brasileira de pacientes com psoríase. A prevalência de obesidade e síndrome metabólica foi maior do que na população adulta brasileira. A dieta in natura associou‐se a menores indicadores de síndrome metabólica.
A psoríase é uma doença inflamatória crônica, de base genética e imunologicamente mediada. Apresenta repercussão sistêmica e associação com comorbidades, como síndrome metabólica (SM), hipertensão arterial (HA), dislipidemias, diabetes mellitus (DM), doença cardiovascular, neoplasias malignas e transtornos afetivos.1,2 Afeta 1,31% da população brasileira e, apesar de não contagiosa e de curso benigno, inflige importante impacto econômico e na qualidade de vida de seus portadores.3
A psoríase desencadeia uma liberação anormal de citocinas envolvidas no processo inflamatório. Entre elas, destacam‐se o IFN‐γ, a IL‐1, IL‐6, IL‐17, IL‐8 e o TNF‐α, que promovem um estado inflamatório crônico sistêmico, favorecem o desenvolvimento de comorbidades.4
Há maior prevalência de obesidade (34%) entre paciente com psoríase em comparação com a população geral (18%). Além disso, quanto maior o índice de massa corporal (IMC), maior o risco de desenvolver psoríase.5 Do mesmo modo, existe associação entre o aumento dos valores de circunferência abdominal (CA), circunferência do quadril (CQ) e o surgimento de psoríase, o que corrobora sua associação com SM. A SM compreende um conjunto de fatores de risco para doenças cardiovasculares e também está relacionada à inflamação sistêmica.6,7
Além do tratamento medicamentoso, a alteração do comportamento alimentar e a prática de atividade física emergem como potenciais estratégias para o tratamento adjuvante da psoríase com vistas a reduzir as comorbidades.8,9 A dieta é um fator ambiental de alto interesse para os pacientes, visto que má nutrição, peso corporal inadequado e doenças metabólicas, além do risco direto à saúde, prejudicam o tratamento da psoríase.10,11
Devido à falta de consenso e diretrizes que estabeleçam uma dieta específica para esses pacientes e como existem poucos estudos que avaliaram o consumo alimentar de pacientes com psoríase, torna‐se necessário, inicialmente, caracterizar seu perfil nutricional e padrões alimentares para traçar estratégias dietéticas, com vistas à melhoria da qualidade da dieta em paralelo com o tratamento da doença.
Este estudo tem como objetivo primário avaliar os padrões de consumo alimentar; secundariamente, correlacionar o consumo alimentar com os aspectos antropométricos, clínicos e fatores relacionados com a SM em pacientes com psoríase atendidos em ambulatório público de dermatologia.
MétodosEstudo transversal que envolveu portadores de psoríase atendidos no Ambulatório de Dermatologia da Faculdade de Medicina de Botucatu, Universidade Estadual Paulista, Botucatu (SP), de fevereiro a agosto de 2019.
Os diagnósticos de psoríase foram estabelecidos por dermatologista titulado (LDBM). Foram incluídos adultos (> 18 anos) de ambos os sexos, de todos os tipos clínicos e todos os estágios de gravidade.
A amostragem foi feita por conveniência, com pacientes consecutivos, concordantes, durante suas consultas médicas, na instituição. Não foram avaliados pacientes com dietas específicas como celíacos, portadores de síndromes disabsortivas ou com limitações que impossibilitem a caracterização dietética ou antropométrica.
Todos os convidados concordaram em participar da pesquisa e assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido. O projeto foi aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa da instituição (protocolo n° 3.317.869).
Variáveis do estudoFoi aplicado questionário de frequência alimentar (QFA) adaptado para avaliar o consumo alimentar. Os pacientes foram interrogados sobre o consumo de 76 tipos de alimentos. Essa avaliação permitiu identificar o consumo desses alimentos no período de um ano, em porções diárias, semanais, mensais e anuais.12
Foram obtidos dados demográficos, socioeconômicos e tempo de tratamento da psoríase no momento da avaliação antropométrica e dietética.
Para a avaliação antropométrica foram aferidos peso corporal e altura, com posterior cálculo do IMC (em kg/m2), seguiu‐se a seguinte estratificação para diagnóstico: desnutrição (˂ 18,5); eutrofia (18,5‐24,9); sobrepeso (25‐29,9) e obesidade (≥ 30).13
A circunferência abdominal foi aferida no ponto médio entre a última costela e a crista ilíaca com fita métrica. Também foi aferida a circunferência do quadril para estabelecer a RCQ=cintura (cm)/quadril (cm), possibilitou‐se a avaliação dos parâmetros de obesidade androide e o risco para doença cardiovascular de acordo com as classificações por sexo e idade.14
As avaliações de consumo alimentar (QFA) e antropométricas foram feitas por nutricionista (TCFP), após o atendimento médico de rotina no ambulatório de dermatologia.
Como todos os pacientes se encontravam em tratamento, escores clinimétricos mais detalhados (como PASI) sofreram efeito do tratamento; portanto, a atividade da doença foi estimada pela presença/ausência de lesões cutâneas e articulares na visita.15,16
Os exames clínicos feitos na rotina do ambulatório foram usados para verificar a presença de SM e foram considerados os critérios da NCEP ATP III (National Cholesterol Education Program Expert Panel on Detection, Evaluation, and Treatment of High Blood Cholesterol in Adults) para avaliar os componentes envolvidos na síndrome metabólica: presença de DM ou glicemia em jejum ≥ 100mg/dL; circunferência abdominal ˃ 102cm para homens e 88cm para mulheres; triglicerídeos ≥ 150mg/dL; HDL<40mg/dL para homens e<50mg/dL para mulheres e pressão arterial ≥ 130/85mmHg ou tratamento para HA.17
Análise estatísticaDados qualitativos foram descritos pelos valores absolutos e percentuais. Dados quantitativos foram representados pela média e desvio‐padrão, ou mediana e quartis (p25‐p75) se a normalidade não for observada pelo teste de Shapiro‐Wilk.18
Os dados dietéticos (QFA) foram tabulados e convertidos em consumo diário dos alimentos, depois submetidos a uma análise fatorial exploratória para a determinação dos padrões alimentares e os escores individuais padronizados de adesão a cada padrão alimentar (variaram de ‐3 a+3). Foram incluídos na análise os alimentos referidos por, no mínimo, 30% da amostra e mantidos no modelo fatorial apenas os que apresentaram carga fatorial>0,3. Para a extração dos padrões alimentares, aplicou‐se o método de componentes principais, avaliado pelo teste KMO (Kaiser‐Meyer‐Oklin), com rotação varimax.19
Para explicar as variações nos escores de adesão a cada padrão de dieta, foi ajustado um modelo linear generalizado (distribuição gama, função de ligação log). Usaram‐se como preditoras as variáveis antropométricas, demográficas e aquelas ligadas à psoríase (doença articular e atividade cutânea). A dimensão do efeito da associação foi estimada pelo coeficiente β da regressão.20
Posteriormente, as variáveis foram analisadas de maneira multivariada a partir da análise de correspondência múltipla de duas dimensões e dispostas no mapa perceptual. A dimensão do efeito foi estimada pela inércia em cada dimensão e as associações entre as variáveis foram representadas por suas proximidades geométricas.21 As variáveis contínuas foram categorizadas por seus tercis.
A amostra foi calculada a fim de representar variáveis presentes em até 10% de uma população de até 300 pacientes portadores de psoríase, com erro‐padrão de até 5%.22 Considerou‐se significativo p ≤ 0,05, bicaudal. As análises foram feitas nos programas SAS for Windows, v.9.4 e IBM SPSS 25.
ResultadosForam avaliados 94 portadores de psoríase. Os principais dados clínicos e demográficos estão apresentados na tabela 1. Destacam‐se baixa escolaridade, assim como renda familiar, grande prevalência de comorbidades (especialmente SM), obesidade e elevado risco para desenvolvimento de doença cardiovascular de acordo com a RCQ. Todos os pacientes encontravam‐se em tratamento; o PASI variou de 0 a 17,6; 84% apresentavam lesões cutâneas no dia da entrevista.
Características demográficas, socioeconômicas, antropométricas e clínicas dos pacientes com psoríase entrevistados no ambulatório de dermatologia (n = 94)
Variáveis | Resultados |
---|---|
Sexoa | |
Feminino | 54 (57) |
Masculino | 40 (43) |
Idade (anos)b | 54,9 (12,8) |
Escolaridadea | |
Analfabeto | 3 (3) |
Ensino Fundamental | 51 (54) |
Ensino Médio | 31 (33) |
Ensino Superior | 9 (10) |
Renda familiar (salário mínimo)a | |
1 | 17 (18) |
2 | 44 (47) |
≥ 3 | 33 (35) |
Perfil antropométrico | |
Peso (kg)b | 84,8 (17,1) |
Altura (cm)b | 1,7 (0,1) |
IMC (kg/m2)b | 31,1 (6,2) |
Eutrófico (18,5–24,9)a | 11 (12) |
Sobrepeso (25 – 29,9)a | 38 (40) |
Obesidade (>30)a | 45 (48) |
Circunferência abdominal (cm)b | 109,0 (13,7) |
Circunferência do quadril (cm)b | 104,2 (14,7) |
RCQ (cm)b | 1,06 (0,15) |
Dados clínicos | |
Tempo de doença (anos)b | 15,7 (12,1) |
Atividade da doença cutânea (placas)a | 75 (84) |
Psoríase articulara | 11 (12) |
PASIb | 5,3 (4,8) |
Comorbidadesa | |
Triglicérides (mg/dL) | 43 (49) |
Colesterol (mg/dL) | 39 (43) |
Hipertensão (mmHg) | 42 (47) |
Glicemia alterada ou DM (mg/dL) | 34 (38) |
Síndrome metabólica | 47 (50) |
cm, centímetros; DM, diabetes mellitus; IMC, índice de massa corporal; kg, quilogramas; m2, metros quadrados; mg/dL, miligramas por decilitros; mmHg, milímetros de mercúrio; RCQ, relação circunferência quadril.
Entre os tratamentos sistêmicos, 32% dos pacientes usavam metotrexato, 23% acitretina e 45% imunobiológicos (12% infliximabe, 11% adalimumabe, 10% secuquinumabe, 8% etanercepte, 4% ustequinumabe). Não houve usuários de ciclosporina nessa amostra.
Não houve uma dieta exclusiva dos pacientes com psoríase; todos relataram certa variabilidade de alimentos consumidos. A partir da análise fatorial do relato do consumo alimentar da amostra, foram identificados dois padrões alimentares (tabela 2). O Padrão 1 (dieta processada) foi composto por alimentos industrializados, ricos em gorduras saturadas, açúcar e sódio, ou seja, uma dieta com alta densidade calórica e baixa qualidade nutricional. O Padrão 2 (dieta in natura) se caracterizou por consumo de frutas, legumes e verduras, fontes de vitaminas, minerais, fibras e compostos bioativos, além de oferecer alto aporte nutricional em termos qualitativos.
Padrões alimentares e cargas fatoriais dos alimentos que compõem cada padrão, identificados pela análise do questionário de frequência alimentar da amostra
Padrão 1 (dieta processada) | CF | Padrão 2 (dieta in natura) | CF |
---|---|---|---|
Pizza | 0,79 | Verduras cruas | 0,73 |
Salgado frito | 0,74 | Legumes cozidos | 0,73 |
Biscoito recheado | 0,69 | Tomate | 0,70 |
Embutidos | 0,69 | Verduras cozidas | 0,68 |
Queijos | 0,67 | Brócolis | 0,62 |
Sanduóches | 0,66 | Cenoura | 0,59 |
Refrigerante | 0,64 | Alface | 0,57 |
Farinhas | 0,53 | Laranja | 0,50 |
Hambúrguer | 0,52 | Sal | 0,42 |
Maionese | 0,45 | Maçã | 0,42 |
Salgado assado | 0,38 | Azeite/óleo | 0,39 |
Pães | 0,38 | Banana | 0,38 |
Sobremesas | 0,37 | Melão | 0,38 |
Linguiça | 0,35 | Mamão | 0,38 |
Suco industrializado | 0,32 | Batata | 0,31 |
Manteiga | 0,32 |
CF, carga fatorial; teste KMO = 0,65.
Os escores de adesão a cada padrão alimentar (tabela 3) foram avaliados segundo variáveis antropométricas, demográficas e clínicas (articular e atividade cutânea). O Padrão 1 se associou com psoríase mais recente. O sexo feminino apresentou maior adesão ao Padrão 2, assim como os pacientes com maior idade e renda. Houve associação inversa da RCQ com a adesão ao Padrão 2, assim como atividade cutânea (placas).
Comparação multivariada dos escores dos padrões alimentares com variáveis antropométricas, demográficas e relacionadas à psoríase (n=94)
Variável | Padrão 1 ‐ Processada | Padrão 2 – in natura | ||
---|---|---|---|---|
Coeficiente β | p‐valora | Coeficiente β | p‐valora | |
Sexo feminino | ‐0,027 | 0,748 | 0,268 | 0,006 |
Idade | ‐0,01 | 0,123 | 0,05 | 0,045 |
Escolaridade | ||||
Superior | 0,042 | 0,760 | ‐0,183 | 0,329 |
Médio | ‐0,090 | 0,278 | ‐0,069 | 0,547 |
Analfabeto + fundamental | (‐) | |||
Renda (salários mínimos) | 0,020 | 0,327 | 0,099 | 0,003 |
IMC | ‐0,009 | 0,076 | ‐0,009 | 0,492 |
RCQ | 0,230 | 0,362 | ‐0,340 | 0,054 |
Tempo de doença | ‐0,005 | 0,034 | ‐0,005 | 0,154 |
Atividade cutânea | ‐0,110 | 0,233 | ‐0,353 | 0,001 |
Acometimento articular | ‐0,145 | 0,096 | ‐0,014 | 0,427 |
Hipertensão arterial | ‐0,074 | 0,256 | ‐0,037 | 0,852 |
Diabetes mellitus | 0,092 | 0,208 | 0,176 | 0,142 |
Hipertrigliceridemia | ‐0,084 | 0,333 | 0,117 | 0,938 |
Hipercolesterolemia | 0,187 | 0,057 | ‐0,063 | 0,526 |
IMC, índice de massa corporal; RCQ, relação cintura/quadril.
A análise de correspondência multivariada (fig. 1) revelou proximidade entre a menor adesão à dieta processada e maior adesão à dieta in natura, assim como com o sexo feminino, ausência de alterações lipídicas e da pressão arterial, além de menor RCQ e eutrofia. A presença de psoríase articular se aproximou dos pacientes com obesidade.
Mapa perceptual das principais variáveis demográficas, clínicas, antropométricas e de adesão aos padrões alimentares em 94 pacientes com psoríase. As variáveis quantitativas foram categorizadas de acordo com o tercil das distribuições.
DM, diabetes mellitus; HA, hipertensão arterial; IMC, índice de massa corporal; RCQ, relação circunferência quadril.
Escores padronizados de P1 e P2: variaram de ‐3 a+3 de acordo com a adesão a cada padrão alimentar.
Foram identificados dois padrões de consumo alimentar em pacientes com psoríase, que se associaram a elementos clínicos, antropométricos e componentes da SM.
Nutrição é um fenômeno complexo. Já que alimentos ou nutrientes isolados geralmente não são considerados prejudiciais à saúde, a avaliação do efeito cumulativo da dieta na saúde com o uso de padrões alimentares pode contribuir para determinar quais são os mais favoráveis para uma população e fornecem uma representação mais próxima dos hábitos alimentares.23
O padrão alimentar está em transição no mundo e sofre influência de diversos fatores, como renda, custo dos alimentos, preferências alimentares individuais, crenças, tradições culturais, aspectos geográficos, comportamentais e socioeconômicos.24
Segundo a POF (Pesquisa de Orçamento Familiar: 2018/2019), no Brasil, nas últimas décadas, observou‐se aumento no consumo de alimentos com menor densidade nutricional, maior concentração de energia, lipídios totais, açúcar e sódio.25,26 As mudanças mais importantes nesse aspecto foram a redução do consumo de feijão (31%), raízes e tubérculos (32%) e ovos (84%) e o aumento do consumo de biscoitos (400%), refrigerantes (400%), carnes (50%) e leite (36%) – ou seja, um aumento de dietas ricas em alimentos processados e ultraprocessados, caracteriza a chamada dieta ocidental, que é associada ao aumento da obesidade, SM, neoplasias e doenças inflamatórias.27,28
O padrão “dieta ocidental” tem composto a dieta moderna, em que há busca por praticidade, alimentos de fácil acesso, industrializados e com baixo teor nutricional.8 No presente estudo, a adesão ao padrão ocidental (Padrão 1) se associou a sobrepeso e elementos da SM. Todos os componentes da SM são fatores de risco modificáveis – mudanças no estilo de vida, dieta e exercício podem impactar favoravelmente a ocorrência de doenças.25,29
Em contraste, o Padrão 2 se caracterizou pelo consumo de alimentos in natura (frutas, legumes e verduras), que são fontes de vitaminas, minerais, fibras e compostos bioativos, além de oferecer alto aporte nutricional. São alimentos que possibilitam agregar equilíbrio dos micronutrientes. Nutrientes como fibras, vitaminas, minerais, ácidos graxos mono e poli‐insaturados, presentes principalmente em alimentos in natura, apresentam efeitos antioxidantes, podem reduzir o tônus inflamatório sistêmico, com potencial de interferir no quadro clínico da psoríase e doenças metabólicas.9,11,27
Estudos transversais demonstraram que um padrão chamado “saudável” está associado a menor prevalência de SM, enquanto o ocidental/não saudável está associado a risco aumentado de SM.30 Nesta amostra, o padrão in natura foi associado à ausência de alterações lipídicas e da pressão arterial, além de menor RCQ, enfatizou que dietas com alto teor de frutas e vegetais podem atenuar o efeito causado pela inflamação e SM.31
Uma pesquisa feita na Croácia com 82 pacientes internados verificou melhoria das placas de psoríase e redução do colesterol total, triglicérides e LDL após quatro semanas de adesão a uma dieta de baixa densidade energética.32
Um estudo italiano acompanhou 61 pacientes por 24 semanas e resultou em redução de peso, CA, além de diminuir o PASI e níveis séricos de proteína C‐reativa, após associação de uma dieta com redução calórica e tratamento com baixa dosagem de ciclosporina.33
Outro estudo clínico randomizado feito na Dinamarca com 60 pacientes com psoríase e sobrepeso submetidos a uma dieta hipocalórica por oito semanas demonstrou melhoria do PASI e do índice de qualidade de vida, quando comparado com o grupo controle.34
Na Suécia, um estudo com 51 pacientes encontrou influência da dieta mediterrânea (rica em peixes, azeite de oliva e vegetais). Após três meses de intervenção, os indivíduos apresentaram melhoria na atividade da doença e na qualidade de vida.35 Esses achados corroboram os resultados de um estudo feito no Havaí com cinco pacientes que apresentaram melhoria de 47,8% no PASI quando submetidos por 10 dias a uma dieta rica em peixes, alimentos integrais, frutas, vegetais, oleaginosas e chás de ervas.36
No presente estudo identificou‐se prevalência de 48% de indivíduos obesos. A obesidade apresenta um crescente desafio à saúde pública e é mais prevalente entre indivíduos com psoríase (34%) do que na população em geral. No Brasil, mais da metade da população (55,7%) tem excesso de peso e 19,8% apresentam obesidade (23% em mulheres e 20% em homens).37–39
Estudos longitudinais de base populacional sugerem um papel causal da obesidade na psoríase, refratariedade ao tratamento e que a obesidade gera maior gravidade da doença. O aumento das taxas de obesidade e adesão à dieta ocidental, além de longevidade e mais acesso ao diagnóstico, pode subsidiar uma das razões para o aumento na incidência de psoríase.40–42
O controle de peso pode ainda melhorar o prognóstico da psoríase e a qualidade de vida. Além disso, o controle calórico oferece melhorias significativas nas lesões cutâneas e no status inflamatório sistêmico. Portanto, dietas com baixa densidade calórica podem ser consideradas importante fator de auxílio na prevenção e no tratamento da psoríase, além de manutenção no peso, redução de marcadores inflamatórios e melhoria do perfil lipídico, glicídico e diminuição do risco de doenças associadas.43,44
Uma dieta vegetariana, desde que bem planejada e estruturada, pode ser adequada em termos nutricionais, e com potenciais benefícios para a saúde, inclusive para indivíduos com psoríase.32,43 Uma nova linha de pesquisa intitulada Plant Based prioriza o consumo de alimentos de origem vegetal os mais naturais e mais perto de sua forma original possível; alimentos em sua forma mais íntegra, livres de qualquer refinamento, processamentos e aditivos artificiais. Parece possível que uma dieta Plant Based seja capaz de influenciar na resposta imunológica e metabólica a partir de mudanças principalmente no estado microbiano intestinal.45 Entretanto, essas intervenções carecem de estudos com desenhos apropriados para esclarecer a relação com a psoríase.46,47
Estratégias nutricionais devem ser estimuladas aos pacientes com psoríase, com o intuito de orientar dieta hipocalórica, com ajuste de macro e micronutrientes e incentivo à ingestão de alimentos in natura, com controle de alimentos processados e álcool. Intervenções dietéticas favorecem o controle das comorbidades e a resposta ao tratamento clínico e podem agir na prevenção de agravos.47
As análises multivariadas reforçaram a correlação inversa entre os marcadores de SM e a adesão ao Padrão 1 nesta amostra. Além disso, a associação entre dieta, gênero, renda e duração da doença deve ser explorada em estudos posteriores com desenhos adequados.
Como limitações do estudo, destacamos o fato de ser monocêntrico, não randomizado, de pacientes de instituição pública, e a avaliação por meio do QFA, dependente da memória alimentar recente.
O cuidado multiprofissional dos pacientes com psoríase possibilita uma assistência mais ampla e voltada à redução das comorbidades em paralelo com o tratamento clínico. Nossos resultados subsidiam as necessidades e os cuidados nutricionais específicos para psoríase, com vistas à possível melhoria na atividade da doença e a redução dos riscos gerados pelo estado inflamatório crônico e comorbidades.
ConclusãoForam identificados dois padrões dietéticos em uma amostra de pacientes com psoríase de uma instituição pública. A prevalência de obesidade e SM foi significativamente maior que na população adulta brasileira. A adesão à dieta in natura foi associada a menores indicadores de síndrome metabólica.
Suporte financeiroNenhum.
Contribuição dos autoresTatiana Cristina Figueira Polo: Análise estatística; aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.
José Eduardo Corrente: Análise estatística; obtenção, análise e interpretação dos dados; revisão crítica do manuscrito.
Luciane Donida Bartoli Miot: Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica do manuscrito.
Silvia Justina Papini: Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; revisão crítica do manuscrito.
Hélio Amante Miot: Análise estatística; aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.
Conflitos de interesseNenhum.
Como citar este artigo: Polo TCF, Corrente JE, Miot LDB, Papini SJ, Miot HA. Dietary patterns of patients with psoriasis at a public healthcare institution in Brazil. An Bras Dermatol. 2020;95:452–8.
Trabalho realizado no Departamento de Dermatologia, Faculdade de Medicina, Universidade Estadual Paulista, Botucatu, SP, Brasil.