Compartilhar
Informação da revista
Vol. 99. Núm. 6.
Páginas 967-969 (1 novembro 2024)
Compartilhar
Compartilhar
Baixar PDF
Mais opções do artigo
Visitas
1679
Vol. 99. Núm. 6.
Páginas 967-969 (1 novembro 2024)
Cartas ‐ Caso clínico
Acesso de texto completo
Mimetizando urticária: caso de síndrome de Schnitzler
Visitas
1679
Kelielson Cardoso de Macêdo Cruza,
Autor para correspondência
kelielsoncma@gmail.com

Autor para correspondência.
, Daniela de Abreu e Silva Martineza, Danielle Carvalho Quintellab, Tullia Cuzzib, Sergio Duarte Dortas Juniora, Solange Oliveira Rodrigues Vallea
a Departamento de Imunologia, Hospital Universitário Clementino Fraga Filho, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, RJ, Brasil
b Departamento de Patologia, Hospital Universitário Clementino Fraga Filho, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, RJ, Brasil
Este item recebeu
Informação do artigo
Texto Completo
Bibliografia
Baixar PDF
Estatísticas
Figuras (3)
Mostrar maisMostrar menos
Tabelas (2)
Tabela 1. Critérios diagnósticos de Strasbourg para síndrome de Schnitzler
Tabela 2. Diagnósticos diferenciais da síndrome de Schnitzler
Mostrar maisMostrar menos
Texto Completo
Prezado Editor,

A síndrome de Schnitzler (SS) é doença rara, com aproximadamente 350 casos relatados na literatura, caracterizada por dermatose urticariforme neutrofílica e gamopatia monoclonal (IgM em mais de 90% dos casos), associada a sinais clínicos e biológicos de inflamação.1‐3 Em 2013, Lipsker, Schnitzler e outros especialistas se reuniram e propuseram os critérios diagnósticos de Strasbourg, que são amplamente utilizados atualmente para diagnosticar SS (tabela 1).1,4 Este relato de caso descreve um paciente com quadro clínico e diagnóstico laboratorial da SS no Brasil.

Tabela 1.

Critérios diagnósticos de Strasbourg para síndrome de Schnitzler

Critérios obrigatórios 
Erupção urticariforme crônica e 
IgM ou IgG monoclonal 
Critérios menores 
Febre recorrentea 
Achados objetivos de remodelação óssea anormal com ou sem dor ósseab 
Infiltrado dérmico neutrofílico na histopatologia da pelec 
Leucocitose e/ou PCR elevadad 
Diagnóstico definitivo se 
Dois critérios obrigatórios e pelo menos dois critérios menores se for IgM e três critérios menores se for IgG 
Diagnóstico provável se 
Dois critérios obrigatórios e pelo menos um critério menor se for IgM e dois critérios menores se for IgG 
a

Deve ser> 38°C e não explicada de outra maneira. Ocorre geralmente – mas não é obrigatório – junto com a erupção cutânea.

b

Conforme avaliado por cintilografia óssea, ressonância magnética ou elevação da fosfatase alcalina óssea.

c

Corresponde geralmente à entidade descrita como “dermatose urticariforme neutrofílica”; ausência de necrose fibrinoide e edema dérmico significante.

d

Neutrófilos> 10.000mm3 e/ou PCR> 3mg/dL.

Paciente masculino, de 67 anos, apresentou‐se ao Departamento de Dermatologia com lesões pruriginosas recorrentes, não dolorosas, semelhantes à urticária nas extremidades e no tronco (fig. 1). As lesões desapareceram em 24 horas sem deixar hiperpigmentação acinzentada. O paciente apresentava febre intermitente de até 39°C, artralgia generalizada e cansaço. Os episódios inflamatórios duravam de dois a cinco dias, com comprometimento geral acentuado. O paciente sofreu episódios de intensidade variável quase mensalmente nos últimos 15 anos. A histopatologia da pele lesionada mostrou infiltrado de células polimorfonucleares perivascular e intersticial, descrito como consistente com o diagnóstico de lesão urticariforme e compatível com SS (fig. 2).

Figura 1.

Lesões urticariformes no tronco e braço esquerdo.

(0.09MB).
Figura 2.

Células inflamatórias ao redor dos vasos dérmicos superficiais que incluíam neutrófilos (A, Hematoxilina & eosina, 100×) também observadas no espaço intersticial entre as fibras de colágeno (B, Hematoxilina & eosina, 400×).

(0.79MB).

As investigações laboratoriais revelaram leucocitose (até 21.000mm3, ref. 4.000–11.600mm3), velocidade de hemossedimentação (VHS) elevada (120mm/h; 0∼20mm/h) e níveis aumentados de imunoglobulina (Ig)M (2.550mg/dL; 46∼260mg/dL) em eletroforese de proteínas séricas (fig. 3). Na cintilografia óssea havia leve assimetria de captação nas tíbias, um pouco maior à esquerda. Foi realizada biopsia de medula óssea com estudo citogenético negativo para doenças linfoproliferativas. Com base nesses achados clínicos e laboratoriais, o paciente foi diagnosticado com SS.

Figura 3.

Aumento dos níveis de imunoglobulina M no teste de eletroforese de proteínas séricas.

(0.05MB).

O tratamento foi iniciado com corticosteroides em altas doses, anti‐inflamatórios não esteroides (AINEs) e anti‐histamínicos, com remissão parcial dos sintomas.

Existem alguns casos relatados na América Latina e, em geral, são subdiagnosticados, apesar dos critérios diagnósticos bem estabelecidos. Sua patogênese é desconhecida.5

A principal complicação é uma neoplasia maligna hematológica, que pode ocorrer em cerca de 10% a 20% dos pacientes.5,6 Além da urticária crônica espontânea, outros diagnósticos diferenciais devem ser considerados (tabela 2).7

Tabela 2.

Diagnósticos diferenciais da síndrome de Schnitzler

Doenças autoimunes 
Doença de Still do adulto (AOSD) 
Lúpus eritematoso sistêmico 
Deficiência adquirida do inibidor da esterase C1 
Doenças hematológicas 
Gamopatia monoclonal de significado indeterminado (MGUS) 
Síndrome POEMS (polineuropatia, organomegalia, endocrinopatia, gamopatia monoclonal e alterações cutâneas) 
Macroglobulinemia de Waldenström 
Linfomas 
Mieloma múltiplo 
Síndromes autoinflamatórias hereditárias 
Síndromes associadas à criopirina (CAPS): 
Urticária familiar ao frio 
Síndrome de Muckle‐Wells 
Síndrome neurológica, cutânea e articular crônica infantil (CINCA) 
Doenças infecciosas 
Hepatite B e C 
Meningococcemia crônica 
Outros 
Urticária espontânea crônica 
Vasculite urticariforme hipocomplementêmica 
Urticária de pressão tardia 
Crioglobulinemia 
Síndrome de Behçet 
Mastocitose 

CAPS, síndromes associadas à criopirina; CINCA, síndrome neurológica, cutânea e articular crônica infantil IgM, imunoglobulina M; IgG, imunoglobulina G; IL‐1, interleucina‐1; IL‐1‐RA, antagonista do receptor de interleucina‐1; MGUS, gamopatia monoclonal de significado indeterminado; POEMS, polineuropatia, organomegalia, endocrinopatia, gamopatia monoclonal e alterações cutâneas; TNF, fator de necrose tumoral.

Atualmente, para pacientes com proteína C‐reativa (PCR) <3mg/dL, as opções de tratamento incluem monitoramento, colchicina, AINEs e hidroxicloroquina.1,2 Os corticosteroides tiveram efeito moderado e a terapia anti‐histamínica não teve efeito.8 De acordo com Simon et al., a eficácia da colchicina é de apenas 25%, mas com base na relação risco/benefício, a colchicina é recomendada como tratamento de primeira escolha.9 Os especialistas recomendam o uso de anakinra (bloqueador de IL‐1) em pacientes mais sintomáticos, como aqueles com VHS e níveis de PCR acima do limite superior do normal (PCR >3mg/dL).1

O tratamento com corticosteroides, AINEs e anti‐histamínicos é sintomático e insatisfatório.9 Anakinra (neutralizante de IL‐1) é o medicamento de escolha. O efeito de inibição da IL‐1 gerou novas expectativas, mas atualmente não há anakinra disponível no Brasil. Um medicamento alternativo poderia ser o canaquinumabe, anticorpo monoclonal humano anti‐IL‐1β que visa a neutralização da sinalização de 1β.10

Essa síndrome rara e debilitante deve ser considerada em pacientes que apresentam urticária crônica associada a sinais de inflamação sistêmica. O tratamento precoce pode melhorar a qualidade de vida do paciente e o prognóstico da doença.

Suporte financeiro

Nenhum.

Contribuição dos autores

Kelielson Cardoso de Macêdo Cruz: Elaboração e redação do manuscrito; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; aprovação da versão final do manuscrito; revisão crítica da literatura.

Daniela de Abreu e Silva Martinez: Elaboração e redação do manuscrito; aprovação da versão final do manuscrito.

Danielle Carvalho Quintella: Elaboração e redação do manuscrito; aprovação da versão final do manuscrito.

Tullia Cuzzi: Elaboração e redação do manuscrito; aprovação da versão final do manuscrito.

Sergio Duarte Dortas Junior: Elaboração e redação do manuscrito; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; aprovação da versão final do manuscrito.

Solange Oliveira Rodrigues Valle: Elaboração e redação do manuscrito; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; aprovação da versão final do manuscrito.

Conflito de interesses

Nenhum.

Referências
[1]
T. Matsuda, R. Takimoto-Ito, D. Lipsker, N. Kambe.
Similarities and differences in autoinflammatory diseases with urticarial rash, cryopyrin‐associated periodic syndrome and Schnitzler syndrome.
Allergol Int., 72 (2023), pp. 385-393
[2]
H. Bonnekoh, K. Krause, P. Kolkhir.
Chronic recurrent wheals ‐ if not chronic spontaneous urticaria, what else?.
Allergol Select., 7 (2023), pp. 8-16
[3]
D.C. Sá, C.Neto. Festa.
Inflammasomes and dermatology.
An Bras Dermatol., 91 (2016), pp. 566-578
[4]
L. Gusdorf, D. Lipsker.
Schnitzler syndrome: a review.
Curr Rheumatol Rep., 19 (2017), pp. 46
[5]
A.M. Aceituno Caño, E.A. Vogt Sánchez, L. León Ruiz.
Schnitzler's syndrome: a case report.
Med Clin (Barc)., 157 (2021), pp. 301-302
[6]
G. Tinoco, R. Kanji, D. Moola.
Schnitzler's syndrome: a case report.
Case Rep Med., 2013 (2013), pp. 956464
[7]
E. Eiling, J.O. Schröder, W.L. Gross, I. Kreiselmaier, U. Mrowietz, T. Schwarz.
The Schnitzler syndrome: chronic urticaria and monoclonal gammopathy – an autoinflammatory syndrome?.
J Dtsch Dermatol Ges., (2008), pp. 626-631
[8]
C.Q. Chu.
Schnitzler syndrome and Schnitzler‐like syndromes.
Chin Med J (Engl)., 135 (2022), pp. 1190-1202
[9]
A. Simon, B. Asli, M. Braun-Falco, H. De Koning, J.P. Fermand, C. Grattan, et al.
Schnitzler's syndrome: diagnosis, treatment, and follow‐up.
Allergy., 68 (2013), pp. 562-568
[10]
Y. Fujita, T. Asano, A. Sakai, N. Norikawa, T. Yamamoto, H. Matsumoto, et al.
A case of Schnitzler's syndrome without monoclonal gammopathy successfully treated with canakinumab.
BMC Musculoskelet Disord., 22 (2021), pp. 257

Como citar este artigo: Cruz KCM, Martinez DAS, Quintella DC, Cuzzi T, Dortas Dortas Junior SD, Valle SOR. Mimicking urticaria: a Schnitzler syndrome case. An Bras Dermatol. 2024;99:967–9.

Trabalho realizado no Hospital Universitário Clementino Fraga Filho, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.

Baixar PDF
Idiomas
Anais Brasileiros de Dermatologia (Portuguese)
Opções de artigo
Ferramentas
en pt
Cookies policy Política de cookies
To improve our services and products, we use "cookies" (own or third parties authorized) to show advertising related to client preferences through the analyses of navigation customer behavior. Continuing navigation will be considered as acceptance of this use. You can change the settings or obtain more information by clicking here. Utilizamos cookies próprios e de terceiros para melhorar nossos serviços e mostrar publicidade relacionada às suas preferências, analisando seus hábitos de navegação. Se continuar a navegar, consideramos que aceita o seu uso. Você pode alterar a configuração ou obter mais informações aqui.