Gêmeos monozigóticos de 15 anos, nascidos de pais não consanguíneos, apresentaram história de cinco meses de lesões ulcerativas acneiformes graves e dolorosas na face, região dorsal e tórax. O paciente 1 relatou dor esternal e lombar acentuada, enquanto o paciente 2, apenas dor lombar de pequena intensidade. Além disso, a mãe estava preocupada com a rápida perda ponderal de ambos. Os registros médicos revelaram um histórico de um ano de acne moderada e nódulos recorrentes nas axilas e virilhas. O histórico familiar de acne e doença articular era negativo. Ambos tinham nódulos inflamatórios, comedões, pústulas, bem como úlceras hemorrágicas dolorosas com crostas aderentes na região dorsal, tórax e região occipital (fig. 1). Foram observados múltiplos nódulos e fístulas nas áreas inguinal e axilar. Com base nos achados clínicos dos gêmeos, foi feito diagnóstico preliminar de acne fulminante (AF) em combinação com hidradenite supurativa (HS), e foi iniciada terapia com corticosteroides orais (prednisona 0,7mg/kg/dia) em combinação com clindamicina tópica para as lesões inguinais e axilares, a ser aplicada uma vez ao dia. Após duas semanas de tratamento, as lesões ulcerativas melhoraram; por isso a prednisona foi reduzida em 5mg a cada sete dias para cada gêmeo. As investigações laboratoriais mostraram aumento da velocidade de hemossedimentação e da proteína C‐reativa no dois pacientes. No entanto, a contagem completa e diferencial de células sanguíneas, fosfatase alcalina, cálcio, fosfato e anticorpos antinucleares, fator reumatoide, anticorpo antipeptídeo citrulinado cíclico estavam dentro dos níveis de normalidade. Em virtude da dor no peito e na região dorsal e do aumento do marcador inflamatório, os pacientes foram encaminhados para os departamentos de Reumatologia e Radiologia. A ressonância magnética (RM) do paciente 1 mostrou intensidade de sinal alterada na articulação sacro‐ilíaca esquerda e no arco posterior da quarta costela à direita, enquanto para paciente 2, a RM destacou intensidade de sinal alterada na articulação sacro‐ilíaca esquerda (fig. 2). A evidência de sacroileíte em ambos levou ao diagnóstico de síndrome de sinovite‐acne‐pustulose‐hiperostose‐osteíte (SAPHO). Tratamento com adalimumabe, medicamento que tem como alvo o fator de necrose tumoral (TNF)‐alfa, na dose de 40mg a cada 14 dias, juntamente com zolendronato e prednisona oral, foi iniciado. Após seis meses, houve melhora acentuada nas lesões de acne e HS (fig. 3) e desconforto ósseo não foi mais relatado. Além disso, o nível dos marcadores de inflamação sistêmica normalizou e ambos apresentaram ganho ponderal.
Paciente 1: Imagens de ressonância magnética de inversão‐recuperação com tau curto (STIR do inglês Short Tau Inversion Recovery; esquerda) do tórax revelando sinais de hiperintensidade nodular na região cutâneo‐subcutânea afetando a parede torácica anterior, bem como a região dorsal (A); sinal de hiperintensidade do arco posterior da quarta costela à direita devido a edema da medula, mas sem edema dos tecidos moles circundantes (B). Imagens de corpo inteiro ponderadas em difusão coronal com supressão do sinal de fundo (DWIBS, do inglês Diffusion‐Weighted Whole‐Body Imaging with Background Body Signal Suppression; direita) demonstrando aumento do sinal em múltiplas alterações subcutâneas na região dorsal do paciente (C); sinal de hiperintensidade focal na articulação sacro‐ilíaca esquerda (D).
Apesar da remissão da síndrome SAPHO no dois irmãos, a natureza crônica da HS exigiu abordagem de tratamento direcionada. Como o adalimumabe é um dos poucos tratamentos aprovados para HS, decidiu‐se continuar a administração a longo prazo. Consultas de seguimento dermatológico‐reumatológico são agendadas a cada seis meses.
A síndrome SAPHO é doença rara, afetando 1 em cada 10.000 caucasianos.1 Embora sua patogênese seja desconhecida, recentemente foi sugerido que seja autoinflamatória. Entretanto, uma combinação de fatores hereditários, infecciosos e imunológicos pode contribuir para o início e o desenvolvimento da doença.2 O diagnóstico da síndrome SAPHO é baseado na história, clínica e achados obtidos por investigações de imagem. Atualmente, não há consenso universal entre os pesquisadores sobre os critérios diagnósticos.3 Os principais diagnósticos diferenciais para a síndrome SAPHO incluem osteíte infecciosa, osteomielite, neoplasias malignas e outros distúrbios ósseos e articulares. As articulações esternocostais e esternoclaviculares e o ligamento costoclavicular são os mais envolvidos. As imagens radiográficas podem mostrar alterações ósseas hiperostóticas, lesões escleróticas, osteólise, reação periosteal e lesões osteoproliferativas envolvendo ênteses.4 Dermatoses acneiformes e neutrofílicas são os principais achados para o diagnóstico da síndrome SAPHO. Notavelmente, até 60% das manifestações dermatológicas são pustulose palmoplantar e 25% dos pacientes, principalmente homens, apresentam acne nodulocística moderada a grave. Outras condições relacionadas, como HS, doença de Sneddon‐Wilkinson, síndrome de Sweet e pioderma gangrenoso, são menos comuns. Aproximadamente 10% dos portadores da síndrome SAPHO apresentam sintomas como febre e fadiga.5 Marcadores de inflamação elevados, leucocitose e anemia leve podem estar presentes nos resultados laboratoriais. O tratamento da síndrome SAPHO é necessário para o alívio dos sintomas e prevenção de complicações futuras, como comprometimento da função óssea e articular. As estratégias de tratamento geralmente são baseadas em evidências de relatos de casos e podem variar dependendo das manifestações da doença no paciente; isso ocorre principalmente porque ensaios clínicos não foram conduzidos devido à sua raridade. Um medicamento anti‐inflamatório não esteroidal e glicocorticoides de curto prazo fornecem alívio osteoarticular inicial. O metotrexato pode tratar artrite periférica na ausência de doença axial, enquanto os inibidores de TNF são preferidos para entesite grave e doença axial. Para pacientes que apresentam manifestações osteoarticulares e cutâneas na síndrome SAPHO, os profissionais de saúde podem considerar diversas abordagens, como retinoides orais para pustulose palmoplantar e acne. Opções viáveis para casos desafiadores incluem terapia com bifosfonatos, inibição da interleucina (IL)‐17, inibição da IL‐1, inibição da IL‐12/23 e inibição da Janus quinase.6 A resposta dos pacientes gêmeos do presente relato ao adalimumabe corresponde à literatura existente que documenta sua eficácia para a síndrome SAPHO. Este relato é único em virtude da ocorrência simultânea e rara de AF e HS em gêmeos monozigóticos como parte da síndrome SAPHO.
Suporte financeiroNenhum.
Contribuição dos autoresIlaria Scandagli: Concepção, planejamento, definição de conteúdo intelectual, elaboração e redação do manuscrito.
Elia Rosi: Definição de conteúdo intelectual, elaboração e redação do manuscrito, edição do manuscritos, revisão do manuscrito.
Gianmarco Silvi: Busca bibliográfica, revisão do manuscrito.
Matteo Ruggieri: Definição de conteúdo intelectual, busca bibliográfica, elaboração e redação do manuscrito.
Tommaso Amadori: Elaboração e redação do manuscritos, edição do manuscrito, revisão do manuscrito.
Francesca Prignan: Concepção, definição de conteúdo intelectual, edição do manuscrito, revisão do manuscrito, supervisão.
Como citar este artigo: Scandagli I, Rosi E, Silvi G, Ruggieri M, Amadori T, Prignano F. Monozygotic twins affected by SAPHO syndrome. An Bras Dermatol. 2025;100. https://doi.org/10.1016/j.abd.2024.03.008
Trabalho realizado no Departamento de Ciências da Saúde, Seção de Dermatologia, University of Florence, Florença, Itália.