A psoríase pustulosa generalizada (PPG) é doença autoinflamatória grave e rara, caracterizada por eritema generalizado recorrente e pústulas estéreis que podem coalescer e formar lagos de pus.1 Sua prevalência no Brasil é estimada entre 0,7 e 0,9 casos por 100.000 habitantes.2 O tratamento da PPG é desafiador, pois os medicamentos antipsoriáticos tradicionais, incluindo os biológicos, têm evidências limitadas de eficácia na PPG. Recentemente, o biológico anti‐IL36R, espesolimabe, mostrou‐se promissor.1 Este estudo relata os dois primeiros casos brasileiros de PPG tratados com espesolimabe.
Caso 1Paciente do sexo feminino, de 27 anos de idade, relatou histórico de crises recorrentes de lesões eritematosas associadas a pústulas desde os 11 anos. Foi diagnosticada com PPG aos 21 anos, durante o 2° trimestre de gestação, quando desenvolveu quadro generalizado com sintomas sistêmicos que necessitaram de internação hospitalar; a PPG foi confirmada na histopatologia de pele. Nessa ocasião, foi iniciada ciclosporina, resultando em controle completo das lesões. Durante o seguimento ambulatorial, a ciclosporina foi suspensa em busca de alternativas para tratamento de manutenção. O uso de metotrexato demonstrou melhora do quadro; entretanto, persistiram lesões pustulosas localizadas. A indução do medicamento risanquizumabe resultou em nova crise, que foi contida pelo uso de ciclosporina. Aos 27 anos, a paciente apresentou nova crise, com eritema difuso, descamação, numerosas pústulas, dor, edema, mal‐estar e comprometimento significante da qualidade de vida. Nessa ocasião, foi administrada infusão de 900mg de espesolimabe, resultando em resposta extremamente rápida nos sintomas cutâneos e sistêmicos. Em 24 horas, todas as pústulas secaram, houve sensação de redução do edema, remissão da dor, persistindo apenas as crostas das pústulas e eritema mais leve em comparação ao dia anterior. Na visita de retorno, uma semana depois, não havia pústulas, apenas eritema nas áreas onde as lesões eram mais intensas (figs. 1 e 2). A paciente manteve remissão completa das lesões, sem aparecimento de novas lesões durante 16 semanas de seguimento.
Caso 2Paciente do sexo feminino, de 66 anos de idade, apresentou queixa de lesões eritematosas com pústulas, evoluindo para febre e disseminação das lesões na última semana. Ela relatou episódios anteriores com características semelhantes, que foram tratados com corticoides sistêmicos e antibióticos. Com base nos critérios diagnósticos do ERASPEN (European Rare And Severe Psoriasis Expert Network) e histopatologia de pele, a paciente foi diagnosticada com PPG.3 Acitretina, ciclosporina e corticosteroides foram usados em sequência, sem atingir o controle clínico. Na tentativa de controlar a condição, 900mg de espesolimabe foram administrados por via intravenosa. Uma semana após a infusão, houve resposta parcial (GPPASI=10,2 e GPPGA=2), e uma segunda dose de 900mg de espesolimabe foi administrada. A paciente apresentou resposta rápida à medicação na semana seguinte (GPPASI=3 e GPPGA=1) e manteve remissão completa das lesões, sem crises durante 12 semanas de seguimento (figs. 3 e 4).
DiscussãoA PPG é caracterizada por erupção súbita de pústulas estéreis em base eritematosa com sintomas sistêmicos.4 As crises da doença podem ser idiopáticas ou desencadeadas por fatores externos, como infecções, descontinuação de corticosteroides sistêmicos, gravidez e uso de certos medicamentos imunobiológicos.5,6 A patogênese envolve a ativação exagerada do receptor IL‐36 (IL‐36R). As citocinas IL‐36α, IL‐36β e IL‐36γ ativam IL‐36R, enquanto o antagonista do receptor IL‐36 (IL‐36Ra) modula a ação das citocinas IL‐36. Essas citocinas estimulam a resposta inflamatória, ativação de neutrófilos, macrófagos, células dendríticas e células T.4 O gene IL‐36RN codifica a proteína IL‐36Ra, que contribui para suprimir a ação das citocinas IL‐36. A mutação desse gene desencadeia sinalização exagerada de citocinas IL‐36. Mutações nesse gene foram identificadas em casos isolados7 e casos familiares8 de PPG. O espesolimabe, um novo medicamento anti‐IL36R, demonstrou eficácia no tratamento de crises de PPG e foi aprovado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária no Brasil em março de 2023. O estudo Effisayil‐1 mostrou que o espesolimabe eliminou todas as lesões em uma semana em 54% dos pacientes vs. 6% no grupo placebo.9 Uma revisão mostrou que há evidências limitadas sobre o uso de outros medicamentos biológicos para tratar PPG em comparação ao espesolimabe.10 Esse medicamento representa alternativa segura e eficiente em comparação aos tratamentos tradicionais, como imunossupressores e retinoides.
ConclusãoA PPG é dermatose grave que pode ser confundida com outras doenças, tornando o diagnóstico e o tratamento desafiadores. As terapias tradicionais podem causar efeitos colaterais significantes. O espesolimabe, um medicamento anti‐IL36R, surge como alternativa promissora e segura no tratamento da PPG, proporcionando rápida melhora dos sintomas cutâneos e sistêmicos. É sugerido que pesquisas adicionais e a inclusão do espesolimabe em protocolos de tratamento estabelecidos para psoríase pustulosa generalizada sejam consideradas.
DisclaimerA Boehringer Ingelheim teve a oportunidade de revisar o manuscrito quanto à precisão médica e científica no que se refere às substâncias da Boehringer Ingelheim, bem como às considerações de propriedade intelectual
Suporte financeiroNenhum.
Contribuição dos autoresRaquel Steglich: Aprovação da versão final do manuscrito; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; elaboração e redação do manuscrito; revisão crítica do manuscrito.
Felipe Saboia: Revisão crítica da literatura; obtenção, análise e interpretação dos dados; elaboração e redação do manuscrito.
Lincoln Helder Zambaldi Fabricio: Aprovação da versão final do manuscrito; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados.
Eoda Steglich: aprovação da versão final do manuscrito; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados.
Anber Tanaka: Aprovação da versão final do manuscrito; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica do manuscrito.
Conflito de interessesRaquel Steglich: Abbvie – palestrante; Boehringer‐Ingelheim – palestrante; Janssen – conselho consultivo, palestrante.
Felipe Saboia: Nenhum.
Lincoln Fabricio: Abbvie – palestrante, investigador; Bayer – palestrante; Bioderma – palestrante; Biolab – palestrante; Galderma – palestrante; Hypera Pharma – palestrante; Isdin – palestrante; Janssen – palestrante, investigador; La Roche‐Posay – palestrante; LEOPharma – palestrante; Pfizer – palestrante; GSK – palestrante; Novartis – palestrante, investigador; Sanofi – palestrante, investigador; Ache – palestrante.
Eoda Steglich: Nenhum.
Anber Tanaka: Abbvie – conselho consultivo, consultor, palestrante, investigador; Boehringer‐Ingelheim – conselho consultivo, consultor, palestrante, investigador; Eli‐Lilly – conselho consultivo, consultor, palestrante, investigador; Janssen – conselho consultivo, consultor, palestrante; Leo Pharma – conselho consultivo, consultor, palestrante; Novartis – conselho consultivo, consultor, palestrante; investigador; UCB Biopharma – conselho consultivo, consultor, palestrante; Pfizer – palestrante, conselho consultivo; Sanofi – palestrante.
Como citar este artigo: Steglich R, Saboia F, Fabricio LHZ, Steglich E, Tanaka A. Generalized pustular psoriasis (von Zumbusch) flares successfully treated with Spesolimab. Report of two cases and review of the literature. An Bras Dermatol. 2025;100. https://doi.org/10.1016/j.abd.2024.10.010
Trabalho realizado no Hospital Universitário Evangélico Mackenzie, Curitiba, PR, Brasil.